O Pokémon dos ovos de ouro

Apanhar Pokémon com nomes esquisitos e incubar ovos por aí deixou de ser um jogo. É uma paixão.
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Apanhar Pokémon com nomes esquisitos e incubar ovos por aí deixou de ser um jogo. É uma paixão, algo que acende os instintos primitivos da competição e que já levou a todo o tipo de disparates – desde pais que põem nomes como Onyx e Eevee a recém-nascidos a processos de despedimento por justa causa. Ontem, o Irão tornou-se no primeiro país a banir o jogo, porque a Niantic e a Pokémon Company não “pediram autorização ao ministério da cultura e política islâmica” do país. Ou muito boa gente trocou as rezas matinais por um Electabuzz fugidio, ou o entusiasmo com criaturas mágicas assustou as autoridades iranianas.

Também continuam a aparecer notícias de pessoas assaltadas enquanto jogavam. Para não falar da autêntica revolta que as massas de milhões de jogadores em todo o mundo expressaram quando a Niantic fez updates à app e retirou algumas funcionalidades, como a que ajudava a perceber a distância à qual andaria aquele Pinsir do inferno, ou aquele Pidgeotto que escapou à primeira.

O que é fascinante, no entanto, é a quantidade de dinheiro que os jogadores estão dispostos a gastar para fazerem evoluir os seus monstrinhos. O Pokémon Go completou um mês de mercado este fim de semana e os números são elucidativos: os criadores já encaixaram 200 milhões de dólares de receitas, cerca de 180 milhões de euros. É histórico. É sete vezes mais do que gerou o Candy Crush Saga nos 30 dias iniciais.

Os dados são da Sensor Tower e mostram que o Pokémon Go também deixou a comer pó o Clash Royale, um jogo da finlandesa Supercell que até agora tinha sido o mais rápido de sempre a chegar aos 10 milhões de downloads. E isto antes do lançamento nos maiores mercados asiáticos, onde jogos para telemóvel são incrivelmente populares: Coreia do Sul, China e Índia. É uma galinha com ovos de ouro que não acabam mais.

A despeito dos críticos e dos que rebolam os olhos quando alguém lhes fala no jogo, os efeitos económicos também se estão a estender a outras áreas. A Nintendo, que não está diretamente envolvida na produção e comercialização do Pokémon Go, viu as vendas das consolas 3DS e jogos clássicos do franchise dispararem por todo o lado – só no Reino Unido foram 200%. Em Portugal, logo nos primeiros dias, as vendas de jogos duplicaram. Nos Estados Unidos, os carregadores de baterias portáteis começaram a esgotar – as vendas subiram 101%.

Já se escreveu bastante sobre os efeitos sociais do jogo, que tem ajudado crianças com autismo e encorajado pessoas com depressão a saírem de casa. Este efeito económico é mais uma boa notícia para toda a indústria dos jogos no mercado móvel, incluindo o incipiente cenário português, onde é tão difícil fazer dinheiro. As críticas fazem sentido – não joguem a conduzir, não se metam por caminhos apertados a meio da noite e não batam com a cabeça nos postes. Mas não é um fenómeno incrível, este? O de uma comunidade global que partilha a paixão por um jogo mágico, cheio de aventuras no mundo real? Sempre é melhor que passar horas no Instagram a suspirar de inveja pela vida dos outros. E agora vou ali apanhar o Diglett que me falta para gerar um Dugtrio.

Ana Rita Guerra escreve todas as terças-feiras no Dinheiro Vivo

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