Vencedores com pouco para festejar e um claro vencido em Espanha
Mesmo aqueles que saíram com uma vitória da noite eleitoral ficaram aquém do desejado resultado, numa noite em que a grande vencedora foi a participação e a democracia espanhola.
Com uma participação de 75,8%, quase mais dez pontos percentuais do que em 2016, uma das grandes vitórias da noite cabe à democracia espanhola. Mas na hora de repartir os 350 lugares do Congresso dos Deputados, nem todos têm motivos para sorrir. Ou porque são obrigados a fazer contas às coligações que conseguem fazer ou porque ficam aquém do resultado esperado. Há contudo um derrotado claro.
Vencedores
PEDRO SÁNCHEZ
Foi o grande vencedor da noite eleitoral, conquistando a vitória que já fugia aos socialistas há 11 anos. Além do mais, fê-lo após duas derrotas frente a Mariano Rajoy e depois de ter sido expulso da liderança do próprio partido - reconquistando o cargo graças ao voto dos militantes socialistas.
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A vitória nas urnas surge depois da vitória nos corredores do Congresso, quando conseguiu afastar Rajoy do Palácio da Moncloa no último dia de maio de 2018 graças a uma aliança com todas as forças políticas presentes, exceto as da direita: Partido Popular e Ciudadanos.
Nestas eleições, conquistou mais dois milhões de votos do que nas de julho de 2016 e com os 123 deputados (mais 38 do que há dois anos) que elegeu é o único capaz de formar governo. Apesar de ser um dos vencedores, não consegue a maioria suficiente para governar sozinho e resta saber quem serão os seus parceiros - nomeadamente se terá que ceder aos independentistas catalães, que o tinham apoiado na moção de censura a Rajoy.
SANTIAGO ABASCAL

Santiago Abascal, do Vox.
© EPA/Juan Carlos Hidalgo
Seria sempre um dos vencedores da noite independentemente do resultado do Vox, já que pela primeira vez a extrema-direita terá representação no Congresso espanhol desde o regresso à democracia.
Abascal, ex-deputado regional do PP que saiu do partido em desacordo com a política autonómica e com os escândalos de corrupção há apenas cinco anos, conseguiu 2,7 milhões de votos e passou dos 0.2% nas eleições de há pouco menos de dois anos para 10,3%.
Terá 24 deputados no Congresso, um número ainda assim aquém do que algumas sondagens previam -- algumas davam-lhe o dobro de deputados. Outro ponto menos positivo para Abascal, é que a direita ficou abaixo do previsto e não consegue repetir uma coligação à andaluza, tirando parte da força que o Vox poderia ter caso PP e Ciudadanos estivessem dependentes dele.
ALBERT RIVERA

Albert Rivera.
© EPA/Chema Moya
O Ciudadanos praticamente duplicou o número de deputados que tinha alcançado em 2016, passando de 32 para 57. E teve mais um milhão de votos. Mais importante: ultrapassou a aliança Unidas Podemos (esquerda), o outro partido que irrompeu nas eleições gerais de 2015 para acabar com o bipartidarismo em Espanha.
Albert Rivera ficou contudo aquém do seu objetivo que era o de ser a força política à direita mais votada, apesar de ficar a menos de dez deputados do Partido Popular (e pouco mais de 200 mil votos). E a soma de toda a direita, mesmo com a extrema-direita, é insuficiente para afastar os socialistas do poder.
O acordo a que Sánchez e Rivera chegaram após as eleições de 2016 para uma aliança de governo há muito está rasgado, com o líder do Ciudadanos a repetir sempre na campanha que não apoiaria o PSOE. Na prática, fora uma grande coligação entre PSOE e PP, os únicos dois partidos que conseguem formar governo são PSOE e Ciudadanos. Rivera teria que voltar atrás para abrir de novo a porta a essa possibilidade.
ORIOL JUNQUERAS

Gabriel Rufian, junto a um cartaz com o rosto de Oriol Junqueras, na noite eleitoral.
© EPA/Alberto Estevez
O líder da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) pode estar detido - está a ser julgado por rebelião, sedição e peculato na organização do referendo de 1 de outubro e consequente declaração unilateral de independência - mas é um dos vencedores da noite, ao ver o seu partido ganhar as eleições na Catalunha.
Pela primeira vez, um partido independentista ganha as eleições gerais na região, mesmo com o seu cabeça de lista na prisão, incapaz de fazer campanha. Conquistou mais de um milhão de votos e terá 15 deputados. A ERC venceu ainda a "luta" entre independentistas, com o Junts per Catalunya, do ex-presidente da Generalitat Carles Puigdemont (a viver no autoexílio em Bruxelas), a não ir além dos sete deputados (um número ainda assim superior ao esperado).
Mais importante, a ERC pode ter uma palavra a dizer na investidura de Pedro Sánchez, já que este precisa pelo menos da abstenção dos catalães para conseguir ser primeiro-ministro. Reiteram o que querem do líder socialista: diálogo, discutir um referendo e acabar com o processo judicial contra os independentistas em Madrid.
Vencidos
PABLO CASADO

Pablo Casado, o grande derrotado da noite.
© REUTERS/Juan Medina
Nas primeiras eleições como líder do PP, Pablo Casado perde mais de metade dos deputados que Mariano Rajoy tinha conquistado em 2016 e fica com apenas 66 (tinha tido 135 nas últimas eleições). O tom mais à direita do discurso que adotou durante a campanha custou-lhe 3,6 milhões de eleitores.
A divisão à direita custou-lhe caro, tendo o único ponto positivo sido o facto de não ter ficado atrás do Ciudadanos. Pelo menos a nível nacional, já que perdeu para o partido de Rivera em cinco comunidades autónomas, incluindo as três com mais população: Andaluzia, Catalunha e Madrid.
A dúvida é saber se Casado se vai demitir ou se aguentará a pressão.
PABLO IGLESIAS

Pablo Iglesias
© EPA/J.P. Gandul
A aliança Unidas Podemos alcançou cinco milhões de votos em 2016 e caiu agora para 3,7 milhões. E dos 71 deputados, passa a ter apenas 42 no Congresso espanhol, ultrapassado pelo Ciudadanos. Um resultado que só não será catastrófico para Pablo Iglesias porque Pedro Sánchez precisa dos seus votos para poder garantir a investidura, mesmo o PSOE dizendo que quer governar sozinho.
O resultado do Podemos explica-se não só pela conjuntura, com Sánchez a conseguir captar bem o "voto útil" para evitar uma maioria de direita, mas também pelas divisões internas, com as lutas entre Iglesias e Íñigo Errejón. Da mesma forma, os escândalos em torno dos dirigentes do partido não ajudaram, como a história do famoso "chalet" de 600 mil euros que o líder do Podemos comprou nos arredores de Madrid que não caiu bem entre algum eleitorado.