May sobre Boris: "Os sucessos dele serão os sucessos do nosso país"

Theresa May participou na última sessão de perguntas e respostas no Parlamento britânico, desafiando o líder da oposição a demitir-se. Depois despediu-se da equipa no número 10 de Downing Street e fez um pequeno discurso, antes de apresentar oficialmente a demissão à rainha Isabel II, que foi oficializada às 15.05.
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Nas últimas palavras como primeira-ministra, frente ao número 10 de Downing Street, Theresa May voltou a dar os parabéns a Boris Johnson por ganhar as eleições no Partido Conservador, desejando-lhe sorte e à sua equipa. "Os sucessos deles serão os sucessos do nosso país e espero que sejam muitos", afirmou ao lado do marido, Philip.

May defende que os sucessos de Boris Johnson serão a continuação de um trabalho de quase uma década de governo liderado pelo Partido Conservador. "Durante esse tempo, a nossa economia foi restaurada, os nossos serviços públicos reformados, e os nossos valores defendidos no palco mundial", referiu.

A ainda primeira-ministra admitiu contudo que falta fazer muito, mas reiterou que "a prioridade imediata é completar a nossa saída da União Europeia numa forma que trabalha para todo o Reino Unido". Uma referência à Irlanda do Norte, sendo que um dos pontos complicados do Brexit é o backstop, o mecanismo de salvaguarda destinado a evitar uma fronteira física com a República da Irlanda.

"Servir como primeira-ministra do Reino Unido é a maior honra", disse May. "A pesada responsabilidade é ultrapassada pelo enorme potencial de servir o país. Mas não alcanças nada sozinho. Quando deixo Downing Street, as minhas palavras são de sincero agradecimento", acrescentou, referindo-se aos funcionários do gabinete, mas também do Parlamento, as forças armadas, os funcionários públicos nas escolas, nos hospitais, nas esquadras de polícia.

"Também quero agradecer ao povo britânico", refere. "Obrigada por depositarem a vossa fé em mim e por me darem uma oportunidade de servir", indicou. A ainda primeira-ministra disse esperar que as jovens que a viram no cargo acreditem que não há nada que não possam alcançar.

Um agradecimento final foi para o marido, Philip, que apelidou de o seu maior apoiante e mais próximo companheiro. O agradecimento foi interrompido por um grito de "Stop Brexit". Depois de uma pausa, May respondeu: "Acho que não".

"Estou prestes a deixar Downing Street, mas vou continuar a ser membro do Parlamento", disse "Vou continuar a fazer tudo que posso para servir o interesse nacional. E desempenhar o meu papel em tornar o nosso Reino Unido, um grande país com um grande futuro, um país que verdadeiramente trabalha para todos", concluiu.

O adeus à rainha e novo governo até às 22.00

Depois da última sessão de perguntas e respostas de May no Parlamento e de um pequeno discurso frente ao número 10 de Downing Street (onde estão dezenas de jornalistas), a ainda primeira-ministra seguiu para o Palácio de Buckingham para uma reunião com a rainha, onde apresentou oficialmente a demissão e disse a escolha do Partido Conservador para a substituir à frente do governo britânico.

A partir do momento em que Theresa May deixou o palácio, pelas 15.00, o Reino Unido esteve oficialmente sem primeiro-ministro até Boris Johnson ser nomeado. Algo que acontecerá exceto uma surpresa de última hora -- Isabel II pode exigir que seja submetido a uma votação nos Comuns. Será o 14.º chefe de governo do seu reinado e o 10.º do Partido Conservador.

Nas redes sociais, May mudou rapidamente o perfil no Twitter. "Membro do Parlamento por Maidenhead. Ex-primeira-ministra do Reino Unido", publicando as suas últimas palavras como primeira-ministra.

Pelas 16.00, Boris Johnson deverá chegar ao número 10 de Downing Street, onde falará pela primeira vez ao país enquanto primeiro-ministro. Seguirá depois para a Câmara dos Comuns, para várias reuniões, prevendo-se ainda hoje o início da remodelação governamental -- segundo o The Guardian, espera ter pelo menos 12 novos ministros nomeados até às 22.00.

Antes de May deixar Downing Street, vários dos seus ministros apresentaram a demissão, incluindo o ministro das Finanças, Philip Hammond, que já tinha anunciado que o faria no fim de semana, ou o ministro da Justiça, David Gauke. Uma medida que o correspondente político da Sky News, Lewis Goodall, considera "estranha" por ser desnecessária, visto que a demissão oficial de May significa a demissão de todo o governo.

May continuará como deputada

Na última sessão de perguntas e respostas no Parlamento britânico, May anunciou que irá continuar a ser deputada depois de deixar a liderança do governo. "Esta manhã, tive encontros com ministros e outros. Esta tarde, terei um encontro com a rainha. Depois disso, continuarei com os meus deveres desta Câmara, como backbencher [deputados que não têm lugar no governo], como deputada por Maidenhead", afirmou.

A primeira questão na sessão de perguntas e respostas aos primeiros-ministros é tradicionalmente sobre a agenda deles para o resto do dia, tendo sido no passado respondido com humor por Tony Blair ou David Cameron, que também deixaram o cargo a uma quarta-feira depois da sessão de perguntas e respostas no Parlamento.

"Esta manhã, tive encontros com ministros e outros. Além dos meus deveres nesta Câmara, não terei mais reuniões do género hoje ou em qualquer outro dia", disse Blair a 27 de junho de 2007, lembrou o The Guardian. A 13 de julho de 2016, Cameron atualizou a piada: "Além de um encontro esta tarde com a sua majestade a rainha, o resto do meu dia é incrivelmente leve".

No final do debate, May lembrou que é deputada desde 1997 e será a primeira vez em 21 anos que não estará nas filas da frente da Câmara dos Comuns, reservada a membros de governo. Antes de assumir o cargo de primeira-ministra, May foi por exemplo secretária de Estado para as Mulheres e a Igualdade ou ministra do Interior. Dizendo ter respondido a mais de 4500 perguntas no Parlamento, May explica que está desejosa, no futuro, de ser quem faz as perguntas, lembrando que o seu "dever para servir os seus eleitores continuará a ser a sua maior ambição".

Frente a frente com Jeremy Corbyn

O líder da oposição, Jeremy Corbyn, começou por louvar o "serviço público" de May, dizendo contudo esperar que a primeira-ministra continue com esse "serviço público" desde o backbench para o ajudar a opor-se aos planos imprudentes do seu sucessor.

Depois, Corbyn enumera tudo aquilo que aumentou nos últimos anos (acompanhado por um coro a dizer "up" sempre que ele usa a palavra): desde a pobreza infantil, ao crime violento, passando pelo número de sem abrigos ou o de pessoas que recorrem aos bancos alimentares.

May fala do positivo nos últimos anos, desde o número de pessoas que têm empregos pela primeira vez, das crianças que vão à universidade, ou do número de proprietários de casa que aumentou.

Antes, a primeira-ministra teve tempo para atacar Corbyn, arrancando risos do Partido Conservador. Usando uma expressão que o líder trabalhista tinha usado, disse que é bom ver os Tories felizes e esperançosos, acrescentando: "Não podemos dizer o mesmo do Labour."

May diz ainda que está orgulhosa de muitas coisas que fez, incluindo dar mais dinheiro para o sistema nacional de saúde. E acusa Corbyn de usar dados falsos nos seus debates. "Temo que os nossos sucessos não têm sido o que deviam, dado a quantidade de notícias falsas que ele usa desde o seu lugar."

Corbyn defende ainda que Johnson não tem qualquer mandato para ser primeiro-ministro, defendendo que ele tem que convocar eleições antecipadas. A primeira-ministra defende que não, criticando-o depois por não ter cumprido as promessas da sua campanha.

May convida Corbyn a demitir-se

May deixa um último recado a Corbyn: "Como uma líder partidária que aceitou quando o seu tempo chegou ao fim, talvez você deva fazer o mesmo".

Contudo, a BBC lembra que o antecessor de May, David Cameron, fez o mesmo há três anos. E que Corbyn ainda continua no cargo. "Pode ser do interesse do meu partido que ele se sente ali [no lugar de líder da oposição], mas não é do interesse nacional, e diria, por amor de Deus, homem, vá-se embora".

Mais à frente no debate, o ex-deputado trabalhista (atualmente independente) Ian Austin disse que concorda com May e que Corbyn devia demitir-se. Mais, que a "grande maioria" dos deputados trabalhistas também concordam.

O debate com os deputados ficou marcado quer pelos tributos a May, da parte do Partido Conservador, como de ataques da oposição não só à primeira-ministra cessante, mas também ao seu sucessor. O deputado Kevin Brennan, por exemplo, disse que os presidentes norte-americanos de saída podem perdoar pessoas. E questionou se ela iria perdoar Boris Johnson por ter sabotado o seu governo em nome das suas próprias ambições. "O meu sucessor vai continuar a empreender as políticas que melhoraram a vida das pessoas deste país", respondeu, dizendo também que está desejosa de dar o seu apoio total ao próximo primeiro-ministro desde o cargo de deputada.

Questionada pela deputada trabalhista Ruth Cadbury sobre se está satisfeita por entregar o poder a Boris Johnson, que acusa de "demonizar os muçulmanos", May responde que está satisfeita de passar a pasta ao novo primeiro-ministro com quem trabalhou no seu governo, que foi eleito com base no manifesto conservador e que quer garantir que aquilo que os britânicos votaram será cumprido, referente ao Brexit.

Quando a questionaram sobre que conselho quer dar ao sucessor, May acaba por não responder, mas das bancadas ouve-se gritos de "watch your back", algo como toma cuidado com as pessoas à tua volta, noutra referência à suposta sabotagem de Johnson.

Quando a nova líder dos Liberais Democratas, Jo Swinson, eleita esta semana, disse que é uma inspiração para jovens do país verem mulheres em cargos de poder. E perguntou a May que conselho ela tem para os homens que acham que podem fazer um trabalho melhor, mas não estão preparados para fazer o trabalho.

A primeira-ministra disse que as mulheres devem ser elas próprias e congratulou Swinson pela eleição. Depois, lembrou que quase todos os partidos com assento Parlamentar, até o grupo independente, já tiveram mulheres na liderança. A exceção, é o Labour, lembrou.

Segundo a Sky News, esta foi a mais longa sessão de perguntas e respostas do mandato de May, tendo ultrapassado uma hora. Os deputados conservadores, assim como os dos DUP, dos liberais-democratas e os independentes, aplaudiram de pé quando se foi embora.

O futuro de Theresa May

Depois do encontro com a rainha, a ex-primeira-ministra volta para a sua casa no seu círculo eleitoral de Maidenhead, em Berkshire, estando também previsto que tire férias.

"No Reino Unido, quando sais, não perdes apenas o emprego, mas também a casa de um dia para o outro e a capacidade de te apresentares como algo", disse o ex-primeiro-ministro Gordon Brown, citado pela BBC; acerca da experiência do dia da saída. "É bastante dramático", acrescentou.

May manterá a segurança que tinha até agora, incluindo o motorista e o carro oficial, e continuará a ser deputada (exceto se decidir deixar esse cargo). Como deputada, terá um salário anual de quase 80 mil libras, menos de metade do salário como primeira-ministra.

Dois dos seus antecessores, Tony Blair e Gordon Brown, publicaram livros sobre a sua passagem por Downing Street, tal como o próprio David Cameron -- a ideia era a sua autobiografia só ser publicada depois do Brexit, mas apesar da extensão do prazo até 31 de outubro, a editora mantém o seu lançamento para setembro.

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