Sem confinamento, a Suécia cometeu um erro ou evitou uma crise pior?
Desde o primeiro momento, a Suécia foi diferente. A estratégia de combate à pandemia de covid-19 não passou pelo confinamento, mas sim por um apelo à responsabilidade individual. O país tem sido duramente criticado, mas é atualmente uma das nações europeias com maior redução de casos e uma economia sobrevivente, segundo alguns especialistas.
Foram poucos os que pouparam nas críticas à Suécia quando o país optou por se manter a funcionar desde o início da pandemia, contrariando o exemplo do resto do mundo. Mas agora começam a surgir mais vozes dissonantes. O país é, em conjunto com Portugal, um dos que mais diminuíram o número de infeções diárias na última quinzena de julho e a sua economia teve uma recessão menor do que a média europeia.
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A Suécia preferiu apostar na responsabilidade individual para que a economia não parasse. Apesar do distanciamento social ter sido sempre aconselhado, o trabalho presencial continuou e os espaços públicos e comércio mantiveram-se abertos, sem restrições maiores.
Esta estratégia terá levado o país, com uma dimensão muito próxima da de Portugal, a acelerar o contágio e o número de mortes, tendo o principal epidemiologista sueco admitido erros no caminho traçado, que se queria rumo à imunidade. No entanto, alguns economista têm apontado, nas últimas semanas, benefícios económicos.
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Num artigo de opinião publicado no jornal britânico The Telegraph, o jornalista Allister Heath refere que "o PIB da Suécia caiu apenas 8,6% na primeira metade do ano" e economistas, ouvidos pela Bloomberg, antecipam uma quebra de 7% do mesmo indicador no segundo trimestre, o que corresponde a aproximadamente metade da descida observada na zona euro. Não deixando de se tratar de uma quebra histórica, está entre os melhores resultados da União Europeia.
"A economia sueca não saiu incólume, apesar das regras brandas de confinamento, mas acreditamos que a queda do PIB no segundo trimestre provavelmente terá sido cerca de um terço do observado na zona euro", disse, nesta semana, David Oxley, economista da Capital Economics.
Economistas antecipam uma quebra do PIB de 7% no segundo trimestre, inferior à média europeia.
Em termos sanitários, a Suécia, que confirmou o primeiro caso de infeção pelo novo coronavírus a 31 de janeiro, tem até este domingo 84 294 infetados. Ou seja, 8340 casos por milhão de habitantes, quando Portugal tem 5308.
No entanto, tanto um como o outro país são mencionados no último relatório do Centro Europeu de Controlo e Prevenção de Doenças (ECDC) como as nações europeias onde se registaram maiores reduções na taxa de incidência de novos casos de covid-19, no período entre 20 de julho e 2 de agosto.
Ambos os países apresentaram uma redução de casos na ordem dos 30%. Em sentido oposto, por exemplo, encontram-se a Espanha, a Bélgica, a Roménia, o Luxemburgo, a República Checa ou Malta, que apresentam subidas de 30% ou mais.
Letalidade elevada
Independentemente do número de casos diários, a Suécia desde cedo que tem uma taxa de letalidade elevada, que, atualmente, se encontra nos 6,9%. Muito superior à dos países vizinhos, Dinamarca e Noruega, e à portuguesa (país da mesma dimensão), de 3,3%.
Desde o início da pandemia, morreram na Suécia 5783 pessoas vítimas da covid-19 - 572 por cada milhão de habitantes.
Tal como acontece na maioria dos países, a população idosa tem sido a mais atingida, com os críticos a garantir que estes óbitos poderiam ter sido evitados se tivessem sido tomadas medidas de proteção dos grupos de risco.
A Suécia tem, neste domingo, 31 doentes internados em serviços de cuidados intensivos. Portugal tem 39.
A estratégia sueca
O governo sueco deixou a cargo dos cidadãos a responsabilidade pela sua saúde. Não impôs um confinamento à população, antes apelou às pessoas para que aplicassem o distanciamento social, um comportamento não muito difícil de seguir num país com baixa densidade populacional e cuja cultura valoriza o individualismo e a autodisciplina.

Um dia normal em Estocolmo em plena pandemia. Só estão proibidos os ajuntamentos com mais de 50 pessoas.
© EPA/Anders Wiklund
Restaurantes, bares, ginásios, lojas e cabeleireiros mantiveram-se em atividade.
Ainda assim, foram proibidos ajuntamentos com mais do que 50 pessoas e as escolas secundárias (mais de 16 anos) e as universidades transitaram para o ensino à distância.
Se soubessem o que sabem hoje, os suecos tinham feito diferente
Já em julho, o principal epidemiologista da Suécia admitiu que a sua estratégia para combater a covid-19 resultou em muitas mortes.

Anders Tegnell é o cérebro que delineou a controversa abordagem sueca para combater o novo coronavírus. Foi nele que o governo de Stefan Lofven confiou para a resposta oficial à pandemia.
© EPA
"Se encontrássemos a mesma doença, com o conhecimento que temos hoje, acho que a nossa resposta chegaria a um ponto de equilíbrio entre o que a Suécia fez e o que o resto do mundo seguiu", confessou Anders Tegnell numa entrevista a uma rádio sueca, citada pela Bloomberg.
Até aqui, o especialista, que delineou a controversa abordagem sueca, tinha argumentado que a natureza de longo prazo da pandemia de covid-19 exigia uma resposta mais sustentável do que confinamentos severos e repentinos. Apesar das críticas, a estratégia de Tegnell teve amplo apoio na Suécia.