Roma tapa estátuas de nus para visita do presidente iraniano

Obras de arte do mais antigo museu do mundo revestidas a pedido de Teerão. A razão é que seria inadequado Rouhani ver nus. Cerimónias oficiais também sem bebidas alcoólicas.
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A decisão de tapar uma série de estátuas de nus naquele que é considerado o complexo museológico mais antigo em existência, os Museus Capitolinos, em Roma, por ocasião de uma visita do presidente Hassan Rouhani, originou uma série de críticas ao governo italiano, acusado de "excesso de zelo" perante a distinta cultura do Irão.

Estátuas como a Vénus Capitolina (original do século IV a.C.), um Eros com Arco (de Lísipo, século IV a.C), uma Leda e o Cisne (360 a.C.) foram revestidas por painéis para encobrir a nudez das figuras. Outras foram removidas do local onde se encontravam. Quase tanto esteve para suceder à estátua equestre do imperador Marco Aurélio, neste caso devido à genitália do equídeo. A estátua está colocada na denominada Sala Esedra, onde decorreu uma sessão com a presença de Hassan Rouhani e de Matteo Renzi, o primeiro-ministro italiano. E se mais obras não tiveram de ser tapadas, foi porque o dirigente iraniano só teve de percorrer um setor do museu até chegar à sala.

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No caso da estátua do imperador romano, apesar das reticências da delegação iraniana, a questão resolveu-se colocando Rouhani e Renzi lateralmente e um pouco distantes do monumento e não à sua frente, como inicialmente previsto.

A decisão de revestir as obras provocou a ira da oposição e de alguns comentadores, com Luca Squeri, deputado da Força Itália (partido de Silvio Berlusconi), declarando que "respeitar outras culturas não pode nem deve equivaler à negação da nossa. Isto não é respeito, é cancelar as diferenças ou, pior, submissão" de Renzi aos iranianos. Estes tinham manifestado desconforto pela sessão na Sala Esedra, se algo não fosse feito, pelo menos, no respeitante às esculturas distribuídas ao longo dos corredores que a ela conduziam. O argumento foi o de que não seria próprio para um líder religioso ser confrontado com imagens de nus.

Para outro dirigente da oposição, Matteo Salvini, da Liga Norte, foi uma "patetice" esconder as esculturas atrás de painéis de contraplacado, especialmente para ceder a um representante do "Estado que quer aniquilar Israel da face da Terra". Finalmente, para um cronista do portal de notícias L" Ultima Ribattuta, Pietro D"Andrea, a "Itália tornou-se o país do respeito devido aos outros, mas que nunca o observa para consigo". Isto, segundo o comentador, só para se chegar a "acordos comerciais" e ao "aumento das exportações para o Irão". Nas redes sociais surgiu mesmo a etiqueta #statuenude para evidenciar o descontentamento com a decisão oficial.

No centro da visita de Rouhani esteve, de facto, o incremento das relações económicas bilaterais, tendo sido assinados 13 acordos no valor de 17 mil milhões de euros, próximo do montante máximo estimado antes do início da visita, que foi de 18 mil milhões. "Este é o início de um longo caminho, em que há setores onde podemos aprofundar a relação, como o elétrico e o petrolífero, mas também as pequenas e médias empresas, as novas tecnologias e a saúde", explicou Renzi na cerimónia perante a estátua de Marco Aurélio a cavalo. Dos acordos, destaque-se um com o grupo siderúrgico Danieli, que domina toda a tecnologia do setor, da etapa dos altos fornos ao produto final, no valor de 3,7 mil milhões de euros; um outro, com a construtora Pessina ,que edificará cinco hospitais no Irão; ainda um terceiro com a Italferr, que prestará assistência técnica ao projeto de comboio de alta velocidade Teerão-Qom-Isfahan. Ainda neste setor, outras empresas ganharam contratos para a modernização e ampliação das infraestruturas ferroviárias iranianas, que deverão passar de dez mil quilómetros para 25 mil daqui a uma década.

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Apesar dos resultados para a economia italiana, a presença do presidente iraniano em Roma foi ainda marcada por uma segunda, ainda que menor, controvérsia: o facto de, novamente em homenagem à diferença cultural e religiosa, não terem sido servidas quaisquer bebidas alcoólicas nas cerimónias oficiais.

Outro tanto deve suceder em França, onde está hoje e amanhã o presidente Rouhani. Não haverá nem almoço nem jantar oficiais para evitar a controvérsia em torno do álcool e igualmente das refeições preparadas segundo o preceito da lei islâmica, como sucedeu em 1999 durante a visita do então presidente Ali Khatami.

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