Putin ameaça NATO e Washington e garante ter armas "invencíveis"

No discurso do estado da nação, líder do Kremlin recorreu a retórica a lembrar o período da Guerra Fria, disse não temer o uso de armamento nuclear e classificou como "obsoletos" os sistemas de defesa antimíssil ocidentais.

A Rússia "não está a ameaçar ninguém e não vai atacar ninguém", mas o seu arsenal nuclear está agora reforçado com armas furtivas que tornam obsoletos os atuais sistemas de defesa antimíssil, anunciou ontem o presidente Vladimir Putin, falando em Moscovo no discurso do estado da nação.

Numa intervenção de mais de duas horas, em que havia a expectativa de que o dirigente russo se focasse em questões de política interna e na próxima eleição presidencial, Putin dedicou parte do tempo a falar das novas armas, em que se incluem mísseis de cruzeiro e um outro míssil que se desloca a uma velocidade cinco vezes superior à do som e sem limite de alcance, além de mini-submarinos nucleares não pilotados. Qualquer destas armas é invulnerável aos sistemas atualmente ao serviço dos Estados Unidos e da Aliança Atlântica, que estão agora "obsoletos", disse o presidente russo, que qualificou como "invencíveis" os novos mísseis. Putin criticou ainda a colocação de sistemas de mísseis balísticos e o "desenvolvimento das infraestruturas da NATO junto das nossas fronteiras". O que, com as novas armas de Moscovo, torna-se apenas "dispendioso, ineficiente e inútil".

O presidente russo deixou ainda no ar a garantia de considerar "a utilização de armas nucleares contra a Rússia ou qualquer dos nossos aliados como um ataque ao nosso país. A resposta seria imediata", indicou Putin, utilizando uma linguagem classificada por muitos observadores como reminiscente da retórica do período da Guerra Fria (1948-1991). A serem tomadas a sério as palavras do presidente russo - que fontes do Departamento de Defesa, num primeiro comentário sob anonimato, consideraram excessivas -, estaria abrir-se caminho para nova corrida aos armamentos. Numa reação oficial, uma porta-voz do Pentágono referiu "não serem surpresa" as palavras de Putin, explicando que "as armas em questão estão a serem desenvolvidas desde há muito".

Putin admitiu explicitamente uma nova corrida aos armamentos, referindo que nos últimos 15 anos "outros países" desencadearam uma corrida aos armamentos na tentativa de neutralizar o arsenal russo e foram aplicadas sanções para prejudicar o país, afirmou Putin. Mas, segundo este, "tudo o que tentaram impedir, já aconteceu (...). A Rússia não foi contida", disse.

O teor da intervenção do dirigente russo pode ser interpretado como uma resposta à recentemente divulgada Estratégia de Defesa Nacional 2018 pelo Departamento de Defesa. Neste documento, identifica-se como principais ameaças à supremacia militar americana a China, que se tornou "um adversário estratégico" e intimida os "países vizinhos, e a Rússia, que "pretende ter um poder de veto sobre as decisões em matéria de segurança, diplomacia e economia dos países seus vizinhos". Na análise do Departamento de Defesa, "é cada vez mais claro que a China e a Rússia querem moldar o mundo de acordo com o modelo autoritário" dos respetivos regimes. Em resposta a esta ameaça, a nova estratégia estabelece como prioridade a criação "de uma maior força letal" nas forças armadas americanas e o "reforço das alianças" internacionais dos EUA.

A questão militar ocupou mais de 30 minutos da intervenção do presidente, altura em que foram apresentados vídeos e gráficos para explicitarem as potencialidades das novas armas. À medida que Putin ia falando perante os representantes das duas Câmaras do Parlamento russo, iam sendo passando filmes e corriam gráficos animados num amplo ecrã colocado a trás de si. Num desses gráficos era mostrada a trajetória de um míssil a evitar a área de interceção dos sistemas de defesa antimíssil num modelo em rotação do globo terrestre.

A concluir esta parte do seu discurso, Putin insistiu na ideia de que "ninguém" queria "falar com a Rússia", "ninguém nos queria ouvir. Agora, vão-nos ouvir".

Putin dedicou a parte restante da intervenção às questões económicas e sociais, referindo, por exemplo, a importância de aumentar a esperança de vida, que tem "de exceder os 80 anos no final da próxima década", e na atração de cérebros estrangeiros.

Situação na Síria

O líder do Kremlin referiu-se também ao envolvimento na guerra civil na Síria, martelando a ideia de que este mostrou a capacidade das indústrias de defesa russas, mas não fez referência à continuação dos combates nem ao número de vítimas civis.

Estas terão já ultrapassado os 500 mortos só no enclave de Ghouta, arredores de Damasco, em poder da oposição. Sobre a situação nesta área, um responsável da ONU para os Direitos Humanos, Jan Egeland, considerou como "inadequada" a trégua de cinco horas sugerida pela Rússia, explicando que o elevado número de pessoas no enclave (mais de 400 mil) a necessitar de apoio alimentar e a dimensão de casos graves de feridos exigia muito mais tempo para a concretização, numa base diária, das operações humanitárias.

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