O político de origem asiática que vai dirigir a República da Irlanda

O partido de centro-direita Fine Gael escolhe hoje novo líder que irá tornar-se o próximo chefe do governo em Dublin. A surpresa é que tem pai indiano e é abertamente <em>gay</em>.
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"Não sou um político meio-indiano, nem político médico nem sequer um político gay. Isso são algumas das minhas facetas. Não me defino só por isso", dizia Leo Varadkar em 2015, o político que está prestes a ganhar a liderança do Fine Gael (FG), partido no poder em Dublin. Sucederá ao primeiro-ministro Enda Kenny, que deixa o cargo devido a um escândalo de abuso de menores por elementos da polícia. A votação decorre hoje e a vitória de Varadkar é dada como adquirida.

Médico de formação, descendente de pai indiano (Ashok Varadkar, também médico) e de mãe irlandesa (Miriam Varadkar, enfermeira), aos 38 anos, Leo vai tornar-se o mais jovem primeiro-ministro na Europa, ao lado dos da Estónia e da Macedónia, e o primeiro chefe de governo da Irlanda de origem asiática e abertamente gay. Será também o mais jovem primeiro-ministro na história do país desde a independência em 1922. A sua eleição está a ser vista como um ponto de viragem numa Irlanda tradicionalmente católica e considerada conservadora. Leo Varadkar tem duas irmãs mais velhas, Sonia e Sophie.

Durante a campanha para a liderança do FG que lhe abre automaticamente a porta para chefe do governo (Taoiseach em gaélico), Varadkar, ministro da Proteção Social, obteve forte apoio entre os parlamentares e militantes do partido, de centro-direita, frente ao segundo candidato, o ministro da Habitação, Simon Coveney. Um dos principais deputados do FG, Pat Deering, considerava recentemente que Varadkar "é a pessoa ideal para nos guiar em 2017". O médico "é uma pessoa do seu tempo e para o seu tempo", disse aquele parlamentar. As próximas eleições estão previstas para 2019 e entre as propostas que Varadkar apresentou na campanha para a liderança estão a reforma profunda da Segurança Social, novos benefícios no acesso das crianças à saúde, aposta nas energias renováveis e na rede de estradas, redução da carga fiscal para os rendimentos mais altos e abertura de mais embaixadas. Uma figura que Varadkar invocou como inspiração foi a de Robert F. Kennedy, irmão do antigo presidente dos Estados Unidos John F. Kennedy, cuja família era de origem irlandesa: "Há pessoas que olham para o mundo como é e perguntam-se "porquê?". Outros imaginam o mundo como poderia ser e interrogam-se "por que não?"." Segundo o político irlandês, esta frase "sintetiza tudo o que a política deve ser: Imaginar a Irlanda como deveria ser e desenvolver as políticas que o tornem possível".

Varadkar iniciou a carreira política na organização juvenil do FG e chegou a vice-presidente das juventudes do Partido Popular Europeu. Esteve inscrito num programa de formação de futuros líderes nos Estados Unidos e é deputado desde 2007. Três anos antes, fora eleito para um cargo autárquico no Condado do Norte de Dublin pelo mais elevado número de votos em todo o país. Em 2010, participou num movimento no partido contra Enda Kenny, então na oposição, mas este "perdoou-me", recordava recentemente ao The Independent irlandês. Kenny obteria uma histórica vitória no ano seguinte mas terá de gerir as repercussões da crise financeira e bancária de 2008-2011.

Admirador confesso da série Star Trek, fez a primeira comunhão no "ano em que Johnny Logan ganhou a Eurovision [a primeira vez, em 1980, com What"s Another Year]", lembrou a mãe ao mesmo diário. Miriam contou ainda que em criança, ao contrário do que hoje sucede, o filho receava andar de bicicleta e saía da piscina a chorar. Hoje é nadador exímio e compete no triatlo.

Pessoa tímida, teve um gesto de coragem pública ao assumir, numa entrevista em janeiro de 2015, a homossexualidade, reconhecendo uma relação com Matthew Barrett, colega de profissão, com quem vive desde 2013. Interrogado então se tencionava levar o companheiro a cerimónias oficiais, Varadkar respondeu que "não tem necessariamente de ser assim", até porque "ele tem um emprego próprio", notando o político irlandês que "acabou-se o tempo em que, tradicionalmente, o líder era masculino e a mulher não tinha emprego. Agora, em que os casais têm próprias carreiras".

A Irlanda descriminalizara a homossexualidade em 1993 e introduzirá o divórcio dois anos depois. Em 2015 tornou-se o primeiro país na Europa a adotar, por voto popular, o casamento gay num referendo em que Varadkar se empenhou ativamente. O resultado mostrou o declínio da influência da Igreja Católica na Irlanda, devido a uma série de abusos sexuais e maus-tratos em instituições sob sua tutela. Mas reflete também uma mudança cultural. Comentava à Reuters uma antiga dirigente do FG, Nora Owen: "o facto de um homem abertamente gay (...) tornar-se Taoiseach e ninguém sequer pestanejar é maravilhoso e um dia extraordinário para a Irlanda", que está na UE desde 1973 e integra a eurozona desde a sua fundação em 1999.

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