Mais um restauro desastroso em Espanha. E desta vez há quem veja nele Donald Trump
Nos últimos anos têm-se multiplicado os restauros desastrosos de obras de arte em Espanha. Depois do famoso fresco do Ecce Homo da Igreja do Santuário da Misericórdia de Borja em 2012, da escultura em madeira de São Jorge, que era uma das atrações da igreja de Estella, perto de Navarra, em 2018, ou do quadro Imaculada Concepción de Los Vunerables, da autoria de Bartolomé Esteban Murillo, já este ano, desta vez foi uma das figuras humanas que adornam um edifício do início do século XX em Palencia que sofreu uma intervenção...original.
Aquela que era originalmente a figura sorridente de uma mulher que guardava o gado foi agora substituída por um rosto em que alguns até veem semelhanças com o presidente cessante dos Estados Unidos, Donald Trump - seja pela pala do cabelo ou pela boca arredondada. Mas as semelhanças são tantas quanta a imaginação deixar e o jornal britânico The Guardian vê naquele rosto parecenças também com "o Povo da Areia da saga Guerra das Estrelas. Ou qualquer ser saído de um pesadelo. Ou, para sermos honestos, qualquer coisa que queiramos projetar nele".
O último desta série de restauros falhados veio a público depois de Antonio Guzmán Capel, um artista local, ter colocado fotos da figura em causa no Facebook no sábado. "As imagens estão um pouco desfocadas mas pode ver-se a partida perfeitamente. Parece a cabeça de uma personagem de desenhos animados".
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Para Guzmán, Palencia tem agora uma atração turística capar de rivalizar com o Ecce Homo de Borja, disse com amargura. Em 2012, o restauro por parte de uma paroquiana idosa de um fresco de Elías Garcíaa Martínez na Igreja do Santuário da Misericórdia em Borja teve resultados desastrosos. Mas também chamou a atenção do mundo para aquela localidade de Aragão, chamando muitos turistas - mais de 50 mil visitaram a igreja logo no ano em que foi revelado o restauro e hoje não só milhares continuam a chegar àquela localidade como até ali foi criado um museu, onde podem ser comprados porta-chaves, T-shirts, canecas ou ursinhos com o Ecce Homo.
"Tenho a certeza que quem fez isto recebeu dinheiro", diz aindaa Guzmán, sublinhando que o maior crime foi de quem encomendou o restauro e depois fingiu que não se passava nada".
Perante estes restauros falhados, os especialistas em conservação em Espanha têm vindo a pedir uma legislação mais apertada, que impeça amadores e curiosos de tentarem fazer um trabalho de restauro que deveria ser qualificado.
"Eu não acho que essa pessoa - ou essas pessoas - deva ser considerada um restaurador", disse em junho Fernando Carrera, professor da Escola Galega de Conservação e Restauração do Património Cultural, ao The Guardian. "Vamos ser honestos: eles são profissionais que estragam tudo. Eles destroem as obras."
Embora os restauradores sejam "muito menos importantes que os médicos", acrescentou, o setor precisa ser regulamentado em prol da história cultural da Espanha. "Vemos esse tipo de coisas uma e outra vez", sem que ninguém faça nada para impedi-lo, lamentou. "Paradoxalmente, isto mostra o quão importantes são os restauradores profissionais. Precisamos investir na nossa herança, mas mesmo antes de falarmos sobre dinheiro, precisamos garantir que as pessoas que empreendem esse tipo de trabalho tenham formação."