À espera do Brexit, Reino Unido confirma participação nas europeias. E agora?
46,5 milhões de britânicos vão votar para eleger 73 eurodeputados. Mas cumprirão o mandato todo? Como fica a sua situação com e sem Brexit? E a dos eurodeputados dos outros países que, sem Reino Unido, seriam eleitos para a legislatura de 2019-2024, mas que, com Reino Unido, poderão não conseguir passaporte para Bruxelas?
Afinal o Reino Unido vai participar nas eleições europeias?
O governo de Theresa May, primeira-ministra britânica, do Partido Conservador, confirmou esta quarta-feira que o Reino Unido vai mesmo participar nas eleições europeias de 23 e 26 de maio.
O Reino Unido é dos primeiros países a votar - a 23 - e em Portugal os eleitores vão às urnas no domingo 26. Noutros países, como a Bélgica ou a Espanha, ocorrem em simultâneo outras eleições, como legislativas, autonómicas e municipais.
A confirmação do governo de May surge numa altura em que o grupo parlamentar dos conservadores exige que ela clarifique a data em que deixará o poder. Isto no contexto da crise do Brexit. Que continua. Apesar da aparente acalmia e das aparentes negociações entre os Tories e o Labour de Jeremy Corbyn sobre um acordo alternativo para o Brexit. Um que conseguisse ser aprovado pela maioria da câmara dos Comuns, depois de o acordado entre May e a UE27 ter sido chumbado, três vezes.
Neste momento o Reino Unido está a gozar uma segunda extensão do Artigo 50.º concedida. Esta permite, em última análise, adiar o Brexit até 31 de outubro, com uma revisão pelo meio, a 30 de junho. O país tem assim que participar nas eleições europeias, como qualquer outro Estado membro da UE, sendo a nova eurocâmara constituída no dia 2 de julho.
Quantos eurodeputados tem o Reino Unido direito a eleger?
O Reino Unido pode eleger 73 eurodeputados, os mesmos que tem agora. A questão é que, com o Brexit, foi calculada uma nova distribuição dos lugares no Parlamento Europeu. E o número total foi reduzido, de 751 para 705 eurodeputados. Houve países que ganharam mais deputados com isso, por exemplo, Espanha, França, Irlanda, Holanda e Estónia.
Portugal, tal como a Alemanha, a Eslovénia, a Bélgica, a República Checa e a Bulgária, não altera o número de deputados - tem direito a eleger 21. A sede do Parlamento Europeu é em Estrasburgo, França, embora os eurodeputados se encontrem, na maior parte do seu tempo, em Bruxelas.
Quando os deputados britânicos foram retirados da equação, falou-se em distribuir parte desses lugares por listas transnacionais, uma ideia promovida pelo presidente de França, Emmanuel Macron, mas rejeitada por outros líderes e pelo próprio Parlamento Europeu. Se esses lugares já tivessem sido atribuídos a pessoas eleitas pelas listas transnacionais, a confusão seria ainda maior do que já é.
Então e se, a 30 de junho, os britânicos ainda não tiverem aprovado um acordo?
A terem eleito os seus eurodeputados, esses deputados britânicos irão ocupar os seus lugares, só não se sabe durante quanto tempo. Se, de acordo com a extensão máxima do Artigo 50.º agora concedida, o Reino Unido só sair da UE a 31 de outubro, os eurodeputados britânicos ficarão lá até essa data. A sua saída obrigará a um novo reajustamento da eurocâmara.
Ainda assim, segundo declarações de Donald Tusk, citadas pela agência de notícias oficial polaca, Polska Agencja Prasowa SA, parece haver ainda na UE um desejo secreto de que o Brexit nunca venha a acontecer. "Talvez possamos evitar que o Reino Unido deixe a UE", declarou o presidente do Conselho Europeu, na madrugada de quinta-feira.
O prazo de 31 de outubro terá sido imposto por Emmanuel Macron, pois o presidente francês não quer que o Reino Unido entre na próxima Comissão Europeia nem participe na eleição do próximo presidente da Comissão Europeia, que deverá suceder a Jean-Claude Juncker a 1 de novembro.
A discussão sobre os novos cargos europeus ocupará os chefes do Estado e do governo na cimeira desta quinta-feira, Dia da Europa, na Roménia. Além do posto de presidente da Comissão, ficarão vagos este ano também os do presidente do Conselho Europeu, do BCE, do Parlamento Europeu e de Alto Representante da UE para a Política Externa.
Quanto custa aos britânicos organizar eleições europeias?
Segundo números das eleições europeias de 2014, citados pelo site da BBC, organizar o escrutínio custa 108,7 milhões de libras, ou seja, cerca de 96,5 milhões de euros.
Porém, avançou o Telegraph na segunda-feira, a organização de europeias no Reino Unido pode ter um custo adicional de 50 milhões de libras, dado o atraso nos procedimentos, por causa da confusão do Brexit e da hesitação constante de May.
E o Brexit quanto é que já custou?
Segundo Gertjan Vlieghe, economista britânico de origem belga que trabalha no Banco de Inglaterra, o Brexit custa 800 milhões de libras por semana e 40 mil milhões de libras por ano.
Desde o referendo de 23 de junho de 2016, em que 52% votaram a favor do Brexit e 48% contra, o economista estima que a economia britânica já viu o PIB cair 2%, segundo dados citados pelo The Guardian, em fevereiro passado.
Os brexiteers participarão nas eleições para o Parlamento Europeu?
Nigel Farage, ex-líder do Ukip, ideólogo do Brexit e eurodeputado há 20 anos, foi o primeiro a entrar em campanha a 12 de abril.
"Vou liderar o Partido Brexit nas eleições europeias, pois agora parece certo que elas acontecerão", declarou o eurodeputado eurocético à Sky News, no início de abril. E acrescentou: "Estou feliz com isto? Não. Pensei que já tínhamos vencido a batalha do Brexit, e tenho muitas outras coisas que gostaria de fazer na minha vida."
Farage concordou ainda que "a extensão do prazo e a votação subsequente permitirão que as pessoas expressem a sua opinião". O homem que foi um dos principais promotores do Brexit, usando por vezes argumentos falsos como o do dinheiro do orçamento europeu que seria redirecionado para o serviço nacional de saúde (NHS), já avisou que voltará a defender o Brexit se for organizado um novo referendo sobre a permanência do Reino Unido na UE.
De que forma isso pode influenciar a formação de grupos políticos no PE?
Até agora, as projeções que têm sido feitas, a nível do Parlamento Europeu, não incluem o Reino Unido. A média de sondagens na UE27, divulgadas pelo PE, mostram uma queda do PPE e dos socialistas e democratas, que sempre foram os dois maiores grupos políticos na eurocâmara. E uma subida dos liberais do ALDE.
O grupo dos eurocéticos, populistas e nacionalistas, cuja liderança clara ainda está por apurar, sobe também, para mais de meia centena de eurodeputados. Matteo Salvini, vice-primeiro-ministro, tem tentado uni-los numa só aliança, podendo vir a receber o apoio do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán. O partido deste, o Fidesz, está suspenso do PPE, por causa das suas campanhas contra os valores do próprio partido. Leia-se políticas xenófobas contra migrantes e refugiados. Orbán indicou que, depois das eleições, decidirá se a formação sai ou fica no maior grupo político europeu.
A Liga de Salvini poderá ser, ainda segundo as projeções, o segundo partido mais votado a nível nacional nestas europeias, ficando só atrás da CDU da chanceler alemã, Angela Merkel. Isso poderá dar ao ministro do Interior italiano, conhecido pelas suas posições anti-imigração, um novo elã.
Quantos eleitores serão chamados a participar nas eleições no Reino Unido?
O Reino Unido tem cerca de 46,5 milhões de eleitores. Na UE são chamados a votar nas europeias cerca de 400 milhões de pessoas.