"Vingança Divina". Ali Khamenei ameaça sauditas. Ban Ki-moon pede calma
Quarenta pessoas foram presas após o ataque contra a embaixada da Arábia Saudita na noite de sábado para domingo em Teerão, anunciou o procurador da capital iraniana, Abbas Jafari Dolatabadi.
"Até agora, 40 pessoas que estão dentro da embaixada foram identificadas e presas. A investigação está em curso para identificar outros responsáveis por este incidente", disse o procurador, citado pela agência iraniana ISNA.
A embaixada saudita em Teerão foi atacada por manifestantes que protestavam contra a execução na Arábia Saudita do clérigo xiita Nimr Baqer al-Nimr, segundo a ISNA.
Os manifestantes lançaram 'cocktails Molotov' contra a embaixada da Arábia Saudita na capital do Irão e forçaram a entrada na representação diplomática, tendo sido depois obrigados a recuar pela polícia.
"Labaredas elevam-se no interior da embaixada, onde manifestantes conseguiram entrar mas foram retirados de seguida", noticiou a agência, acrescentando que houve também manifestantes que conseguiram subir ao telhado do edifício.
Em fotos publicadas em alguns sites da internet, é possível ver manifestantes empunhando aquilo que parece ser a bandeira saudita, que terão arrancado do respetivo mastro.
Nimr al-Nimr, que passou mais de uma década a estudar teologia no Irão, foi um dos 47 xiitas e sunitas executados após condenação por terrorismo na Arábia Saudita. Al-Nimr foi o impulsionador dos protestos xiitas contra o Governo saudita desde 2011.
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[destaque:EXECUÇÕES SÃO UMA AGRESSÃO]
O principal líder religioso xiita do Iraque, aiatola Ali al-Sistani, considerou hoje a execução do religioso xiita Nimr Baqir al-Nimr como uma agressão.
"Recebemos com profunda tristeza e lamentamos a notícia do martírio de um grupo de nossos irmãos na região (...) O derramamento do seu sangue puro é uma injustiça e uma agressão", afirmou al-Sistini.
[destaque:ALI KHAMENEI: ARÁBIA SAUDITA SOFRERÁ VINGANÇA DIVINA]
O líder supremo do Irão, o ayatollah Ali Khamenei, disse hoje que a Arábia Saudita vai sofrer uma "vingança divina" pela execução de um líder religioso xiita, horas depois de manifestantes atacarem a embaixada do reino em Teerão.
"O derramamento injustificado de sangue deste mártir vai ter rápidas consequências", disse Khamenei perante um grupo de clérigos na capital, referindo-se a Nimr al-Nimr, que foi executado juntamente com outros 46 homens, no sábado.
"Este académico não encorajava pessoas à ação armada nem conspirava secretamente. A única coisa de que é culpado foi de fazer duras críticas públicas, impelido pelo seu zelo religioso", afirmou.
[destaque:BAN KI-MOON APELA À CALMA]
O secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, está "profundamente consternado" com a execução de 47 pessoas na Arábia Saudita, incluindo um líder religioso xiita, e apelou à calma nas reações à sua morte, segundo o porta-voz da ONU.
Nimr al-Nimr, que passou mais de uma década a estudar teologia no Irão e foi o impulsionador dos protestos xiitas contra o Governo saudita desde 2011, foi um dos 47 xiitas e sunitas executados no sábado na Arábia Saudita, tendo a sua morte provocado violentos protestos no Irão.
Ban Ki-moon apelou "à calma e à moderação nas reações à execução de Nimr al-Nimr e pediu a todos os dirigentes da região para tentar evitar o agravamento tensões sectárias", disse o porta-voz da ONU no sábado noite.
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[destaque:A REVOLTA]
Os condenados - 45 sauditas, um egípcio e um chadiano -- julgados em diferentes casos, foram executados com sabre ou fuzilados em 12 cidades da Arábia Saudita. Eram, na maioria, 'jihadistas' da Al-Qaida.
O objetivo da execução de 47 pessoas na Arábia Saudita era mostrar que o país não vai tolerar ataques de jihadistas sunitas ou da minoria xiita e ainda desencorajar os jovens a juntarem-se a grupos extremistas numa altura em que o Estado Islâmico ganha terreno. Mas a inclusão do clérigo xiita Nimr al-Nimr, crítico da monarquia dos Al-Saud, entre os condenados com ligações à Al-Qaeda, gerou uma onda de choque no mundo islâmico e arrisca intensificar as tensões sectárias. "A Arábia Saudita vai pagar um preço elevado", defendeu o Irão, grande rival xiita do reino sunita.
Al-Nimr, um dos rostos dos protestos da Primavera Árabe no país, foi condenado à morte em 2014 por rebelião, desobediência ao soberano e porte de armas. Mas para os defensores dos direitos humanos, o objetivo era calar um crítico. "O caso específico de Nimr al-Nimr levanta sérias preocupações relativamente à liberdade de expressão e ao respeito dos direitos civis e políticos básicos, que devem ser salvaguardados em qualquer situação, mesmo no âmbito da luta contra o terrorismo", reagiu em comunicado a chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, recordando a oposição de Bruxelas à pena de morte.
As mortes decorreram em 12 cidades da Arábia Saudita - quatro prisões recorreram aos fuzilamentos e as restantes às decapitações. A execução simultânea de 47 pessoas - 45 sauditas, um egípcio e um chadiano - foi a maior em massa realizada por questões de segurança desde a morte, em 1980, de 63 jihadistas que tinham participado na tomada de reféns na Grande Mesquita de Meca. Foram as primeiras execuções de 2016 - no ano passado foram executadas 157 pessoas, contra 90 em 2014.
O anúncio da morte de Al-Nimr desencadeou protestos no distrito de Qatif, no leste da Arábia Saudita, onde se concentra a minoria xiita do país. "Fora os Al-Saud", gritava-se, segundo testemunhas citadas pela Reuters. A segurança foi aí reforçada. Os protestos repetiram-se em países de maioria xiita: no Bahrein as autoridades usaram mesmo gás lacrimogéneo para travar os manifestantes em Sitra. Os EUA, um dos maiores aliados da Arábia Saudita, mantiveram ontem o silêncio.
[destaque:AMEAÇA. VÃO PAGAR UM PREÇO ELEVADO]
O Irão, principal potência xiita, acusou a Arábia Saudita de ter fabricado as acusações de terrorismo contra o clérigo apenas para calar as suas críticas. No site do líder supremo, o ayatollah Ali Khamenei, foi publicada uma foto de um carrasco saudita junto ao famoso executor do Estado Islâmico Jihadi John com a legenda: "Alguma diferença?"
O porta-voz da diplomacia iraniana, Hossein Ansari Jaber, disse que a Arábia Saudita vai pagar um "preço elevado" pela execução . "O governo saudita apoia, por um lado, os movimentos terroristas e extremistas e, ao mesmo tempo, utiliza a linguagem da repressão e da pena de morte contra os seus opositores internos", afirmou. Riade reagiu chamando o embaixador iraniano para protestar contra esta declaração "agressiva" que considera uma "ingerência".
Face à ameaça comum que representa o Estado Islâmico, Riade e Teerão tentaram uma aproximação. Mas sem sucesso. E acabam por apoiar lados opostos na guerra na Síria - o Irão está ao lado do presidente Bashar al-Assad, tal como o Hezbollah - enquanto os sauditas têm participado nos ataques aéreos da coligação internacional. Também no Iémen estão em lados opostos da trincheira - Teerão apoia a minoria xiita dos houthis, que expulsou o governo apoiado pelos sauditas. A execução de Al-Nimr promete ser mais um prego no caixão das relações.
A morte do clérigo xiita surge também um dia depois de Riade reabrir a embaixada no Iraque, 25 anos depois do corte de relações diplomáticas que se seguiu à invasão iraquiana do Kowait em 1990. A aproximação entre os dois países decorria no meio de um esforço regional para combater os militantes do Estado Islâmico (que controlam parte do território do Iraque e da Síria), com o primeiro-ministro iraquiano, Haider al-Abadi, a alertar para as repercussões que este caso terá a nível da segurança regional.
No Iraque são cada vez mais as vozes que defendem novamente ao fecho da embaixada, entre eles o clérigo xiita Moqtada al-Sadr, que apelou aos protestos em toda a região do Golfo. O ex-primeiro-ministro iraquiano, Nuri al-Maliki, acredita que este caso irá terminar na queda do regime saudita.