O filme reúne em 70 minutos uma série de testemunhos e momentos marcantes da produção desse espetáculo, que foi concebido pela coreógrafa Diana Seabra especificamente para explorar em palco a experiência de seis bailarinos profissionais da Sublime e a sensibilidade de movimento de sete utentes da Cercioeiras com idades entre os 25 e os 40 anos..Foi dessa instituição de apoio a portadores de deficiência que surgiu, aliás, o desafio lançado à companhia luso-americana, que já antes desenvolvera projetos de dança inclusiva com utentes de paralisia cerebral do Centro Nuno Belmar da Costa.."Desta vez tive que procurar bailarinos que, além de se identificarem com o meu repertório de movimento, tivessem disponibilidade emocional para lidar com os colegas especiais que iam ter em palco e capacidade de improviso suficiente para se adaptarem a imprevistos - já que a capacidade de memorização das pessoas com deficiência é muito diferente da de um dançarino profissional", afirma Diana Seabra. .O trabalho testou os limites de uns e outros, mas "foi bem-sucedido e muito gratificante, não só pelo resultado final obtido, mas também porque os portadores de deficiência não têm filtro nenhum e obrigam os outros a lidar com uma perspetiva diferente das coisas"..Para Diana Seabra, isso enriqueceu-a pessoal e profissionalmente: "Obrigou-me a adaptar a minha linguagem a um registo mais claro, fez-me valorizar a capacidade de viver 'no momento', libertou-me de certos estereótipos relativos a esta faixa da população - como aquele de que eles não conseguem perceber certas coisas ou sentir certas emoções - e mostrou-me como é importante estar atento a novas possibilidades"..Alex Wiczor também se terá apercebido desse potencial quando decidiu substituir o estilo do trabalho videográfico que vem desenvolvendo para a Sublime por um registo mais documental, que se revelou particularmente exigente a nível técnico.."Gravar um documentário - especialmente quando se é uma 'one-man-band' [banda de um homem só] - é sempre desafiante", declarou à Lusa. "É tomar decisões a toda a hora e por isso é que 'Parte de Coisa Nenhuma' envolveu filmagens muito intensas, com horários apertados, locais difíceis, às vezes protagonistas improváveis", explica..Feito o balanço, contudo, o realizador alemão radicado em Portugal garante que o esforço compensou: "Acabou por ser um projeto muito emotivo, em que me tornei parte desta 'família' durante dois meses, e a história merecia definitivamente ser contada"..Sara Espírito Santo, coordenadora do projeto na Cercioeiras, reconhece-lhe "um impacto significativo" na vida dos utentes da instituição, na medida em que lhes deu oportunidade de "experimentar diferentes estilos de dança, aumentar o seu repertório motor e expressivo, conhecer o seu corpo, vivenciar o sentimento de pertença a um grupo e melhorar as suas competências sociais"..Recordando que a dança já vem sendo explorada na Cercioeiras desde que em 2004 aí foi criado o grupo Korpus, entretanto envolvido em diferentes projetos de desenvolvimento pessoal e cultural através das artes performativas, a mesma responsável acrescenta que iniciativas como o espetáculo da Sublime e o documento de Alex Wiczor têm ainda duas outras vantagens: "sensibilizar a sociedade em geral para a inclusão através da Arte e reconhecer o valor artístico e expressivo das pessoas com deficiência".."Parte de Coisa Nenhuma" tem estreia marcada para as 17:00 de domingo no Espaço Nimas, após o que a sala irá acolher uma conversa com a crítica de dança Luísa Roubaud e a coreógrafa Ana Rita Barata, e ainda uma atuação com o pianista Giovanni Barbieri e os bailarinos Nuno Cabral (utente da Cercioeiras) e Olsi Gjeçi (fundador da Sublime Dance Company e da plataforma mundial de dança UMUV).