Acusações de racismo marcaram Assembleia Municipal do Porto
O episódio começou pouco depois da meia-noite de terça-feira para quarta-feira e estendeu-se ao longo de cerca de 45 minutos numa sessão que tinha iniciado às 21:00 e quando já o presidente da Câmara do Porto, o independente Rui Moreira, a maioria dos vereadores e alguns deputados municipais já não se encontravam na sala.
Tatiana Moutinho pretendia dirigir-se à Assembleia, mas antes de iniciar a sua intervenção foi questionada pelo presidente deste órgão autárquico sobre se falaria como munícipe ou "candidata a deputada", uma vez que a portuense integrou listas do Bloco de Esquerda (BE) nas últimas autárquicas e terá dirigido antes da sessão desta noite uma mensagem eletrónica aos deputados na qual indicava que pretendia falar nessa dupla função.
A Tatiana Montinho também foi explicado que não lhe seria permitido dirigir-se "a um deputado em particular em tons não adequados".
Após alguma troca de explicações entre a munícipe e o presidente da Assembleia Municipal, esta retomou o seu lugar no espaço que é destinado ao público, o que gerou alguns pedidos de esclarecimento e críticas por parte de várias bancadas que procuraram perceber se estava a ser, como referiu a deputada do BE, Susana Constante Pereira, "coartada a liberdade de expressão da munícipe".
Entretanto Tatiana Montinho retomou o local onde lhe era permitido falar, tendo sido interrompida quando a mesa considerou que a sua intervenção continha acusações dirigidas a um deputado.
"No passado dia 22 de julho, deparei-me com um texto de teor racista nas redes sociais (..) tendo reagido no sentido de alertar para o facto de que tais situações devem ser denunciadas como discurso de ódio. No seguimento dessa minha tomada de posição, vi-me rapidamente envolvida numa situação de violência declarada, na qual o agressor está perfeitamente identificado. O seu nome é António Santos Ribeiro, deputado municipal eleito pelo Movimento Rui Moreira: Porto, o Nosso Partido. O comportamento de António dos Santos Ribeiro é não só eticamente reprovável, como também marginal à lei e, nesse sentido, será tratado no local próprio", referiu a munícipe.
Em causa, um episódio que aconteceu no mês de julho, tendo epicentro a rede social Facebook. O mesmo gerou uma tomada de posição da SOS Racismo que considerou "particularmente grave que um responsável autárquico, com funções de representação do povo que o elegeu, difunda e torne públicas mensagens de natureza discriminatória, em afirmações pontuadas por preconceitos e por insultos".
"A situação agrava-se quando David Ribeiro [nome com o qual o deputado António dos Santos Ribeiro se identifica nesta rede social] insiste na culpabilização de quem o denuncia, revelando complacência com comentários de índole racista, sexista e violenta", prosseguiu a SOS Racismo.
Esta polémica tinha iniciado com uma publicação de António dos Santos Ribeiro, com o título "Ciganos romenos no Porto" e na qual se lia: "Não, não sou racista nem xenófobo, mas sou declaradamente contra quem recusa qualquer tipo de ajuda social e prefere continuar a viver da mendicidade e do pequeno furto e continuar a dormir em jardins públicos conspurcando os terrenos que são de todos nós (...). Qual é a solução? Não sei se alguém sabe, mas há que refletir sobre a situação e encontrar rapidamente formas eficazes de proteger os cidadãos destes energúmenos".
A publicação fazia referência a "um grupo de 20 a 30 romenos, maioritariamente mulheres e jovens" que, apontava o deputado, "criaram um autêntico martírio aos residentes e comerciantes da zona", sendo descritos problemas com lixo depositado e furtos em supermercados.
Este texto além de ter gerado as críticas da SOS Racismo, também gerou uma onda de comentários nas redes sociais.
Esta noite, perante a situação criada na Assembleia Municipal houve troca de palavras entre deputados municipais com, por exemplo, Pedro Batista do movimento independente a sair em defesa de António dos Santos Ribeiro, apelidando outros eleitos de "demagogos".
Já Gustavo Pimenta (PS) e Artur Ribeiro (CDU) pediram elevação nas intervenções da sessão, enquanto o presidente da Junta do Centro Histórico, António Fonseca, referiu existirem "situações preocupantes" de salubridade pública e segurança "provocadas por comunidades".
"Eu que até sou adepto do Boavista, se disser que um jogador mexicano do FC Porto não joga nada é considerado racismo?", perguntou por sua vez o deputado visado na intervenção que espoletou a polémica, António dos Santos Ribeiro, numa altura em que também a munícipe Tatiana Moutinho abandonava a sala.
Esta situação aconteceu no final de uma sessão extraordinária que tinha começado ao som de apitos, bombos e gritos de cerca de duas dezenas de pessoas que, no exterior do edifício dos Paços do Concelho, exigiram medidas para "acabar com os despejos na cidade".