Casa do Design de Matosinhos acolhe exposição sobre trabalho gráfico de Tóssan

Uma exposição dedicada ao trabalho gráfico e plástico de Tóssan, nome artístico de António Fernando dos Santos (1918-1991), é hoje inaugurada na Casa do Design, em Matosinhos, mostrando uma "qualidade inspiradora".
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Com o título "Tóssan -- A Vida é Engraçada mas eu Levo-a a Sério", a mostra estará patente até 02 de março de 2019, e segue-se a uma homenagem ao artista multidisciplinar, com obra como designer, poeta e ilustrador, na Festa da Ilustração, que decorreu em junho, em Setúbal.

"Esta exposição, essencialmente visual, mostra quer originais quer 'prints', numa retrospetiva bastante larga da obra dele, ao longo de vários anos, começa nos anos 1940 e vai até a década de 1980, antes da sua morte em 1991", explicou à Lusa o comissário da mostra, Jorge Silva.

Organizada pela Câmara de Matosinhos, em parceria com a autarquia de Setúbal e a esad-idea, núcleo da Escola Superior de Artes e Design (ESAD), a mostra recolhe obras do homem que "não queria ser um grande artista, nem um grande ator, escritor ou pintor", proferiu o historiador brasileiro Alberto da Costa e Silva, que foi embaixador do Brasil em Lisboa, Prémio Camões em 2014.

"Ele queria ser o Tóssan, e o Tóssan ele foi plenamente", notou.

O espólio, que chegou a Jorge Silva através da família Gens, do lado da viúva do artista, inclui material de todo o tipo, e o "bombom" da exposição, referiu o designer, é a exibição, pela primeira vez, de um filme do autor algarvio.

"Vamos ver um filme que estava perdido, de 1963, chamado 'A Gravata de Tóssan', uma obra de sete minutos recuperada pela Cinemateca. É um filme mudo, em que ele anda às voltas com uma gravata, viva. Não se quer deixar engravatar", contou o comissário.

Outro dos destaques é a exposição das 22 crónicas ilustradas de "Lógica Zoológica", publicadas no jornal satírico O Bisnau (1983), com "desenhos soberbos e crónicas hilariantes, numa escrita absurda e muitos trocadilhos".

"Essa série, pode dizer-se, era como que a súmula do que fez toda a vida como humorista, mas também como ilustrador, e isso está muito bem patente na exposição", destacou Jorge Silva.

Numa exposição que se foca no lado gráfico e não tanto na escrita, tornada famosa pela "Ode ao Futebol", especialmente depois de ter sido interpretada no "Zip Zip", em 1969, a ilustração ganha destaque.

A divisão das obras, entre desenhos, rascunhos, originais e outros formatos, é por "capítulos, que vão dando uma forma mais ou menos cronológica" ao caminho trilhado pelo algarvio, que viveu sobretudo em Lisboa, mas passa por um período "notável" em Coimbra, onde chegou através do Sanatório, para curar a tuberculose.

Ao lado das centenas de caricaturas para livros de finalistas, o artista acabou por se envolver em 1947 com o Teatro dos Estudantes da Universidade de Coimbra (TEUC), onde foi cenógrafo, mas também ator, caracterizador e encenador, num período em que conhece um dos grandes amigos, António Aleixo, e também a mulher, Madalena.

O "nomadismo do Tóssan, até assentar em Lisboa", reflete Jorge Silva, está patente na exposição, ainda que venha do período neo-realista dos anos 1940 até à estada no Brasil e às centenas de ilustrações para o suplemento Juvenil do Diário de Lisboa (1957).

Mais tarde, foi o envolvimento com a Editora Portugália, para quem faz capas de livros - o que dá conta de "um trabalho muito versátil" de Tóssan -, e com a Terra Livre, onde "trabalha e acaba a vida profissional", já depois de regressar do Brasil, em 1973.

Pelo meio, há trabalho como ilustrador de livros infantis, um "universo muito caro a Tóssan, porque tinha sobrinhos e filhos de amigos com quem passava o tempo a inventar brincadeiras", mas também a atividade versátil e "notável" de um artista multifacetado, entre performances de rua, a contar histórias ou anedotas, e a ser um "grande conviva".

Amigo de Mário Viegas, Raul Solnado e Almeida Santos, o acervo de Tóssan revela uma nota do antigo presidente da Assembleia da República sobre "cão pêndio", obra de 1959 que era "modesta, em volta de trocadilhos com o cão", mas que foi muito bem recebida e recentemente reeditada. Trata-se de um dos poucos títulos disponíveis, entre imensos trabalhos que nunca foram editados.

"Foi um grande comediante em toda a linha da vida dele. Isso manifesta-se, naturalmente, na sua obra gráfica, onde há um otimismo, uma alegria, no traço e nas coisas que conta. É muito marcante", descreve Jorge Silva, que se refere à qualidade plástica e gráfica de Tóssan como "inspiradora". "Era tão bom como os melhores da altura", garantiu o comissário da mostra à agência Lusa.

Segundo o designer, essa qualidade permite-lhe ser "uma pedra importante" no passado do design português, e no panorama global da cultura nacional, mas também conseguir ainda "alguma atualidade".

A exposição pertence a um grupo de atividades que têm por objetivo assinalar o centenário do nascimento do artista, em Vila Real de Santo António, e que vai culminar, revelou Jorge Silva, com uma retrospetiva marcada "para Loulé e que terá, à margem, a edição de um livro com a obra literária, inédita, de Tóssan".

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