Ucrânia e UE em reunião de família para mostrar ao vizinho
Zelensky vê o seu país em negociações de adesão à União Europeia ainda este ano, ao que os altos dirigentes europeus responderam com palavras de alento mas também de diplomática prudência. Líder ucraniano elege Bakhmut como fortaleza da resistência.
Alarmes antiaéreos soaram em Kiev, bem como noutras cidades ucranianas, antes do início da 24.ª cimeira Ucrânia-União Europeia. O ataque aéreo acabou por não se concretizar, mas lembrou ao colégio de comissários europeus e respetivas equipas do que é feito o quotidiano dos anfitriões, que a um tempo sonham com o fim da invasão russa e aspiram à pertença no clube europeu. Em relação à guerra, o presidente Volodymyr Zelensky voltou a pedir urgência na entrega de armamento. Sobre a integração europeia disse que a meta é iniciar as negociações o quanto antes, ou seja, ainda este ano. O presidente do Conselho Europeu respondeu de forma genérica aos dois temas: "Não somos intimidados e não seremos intimidados pelo Kremlin. Porque a Ucrânia e a UE somos família."
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O longo comunicado conjunto de 32 pontos assinado por Zelensky, Michel e a presidente da Comissão Ursula von der Leyen no final da cimeira não trouxe qualquer surpresa, prometendo o reforço das relações entre Bruxelas e Kiev. Destaque, ainda assim, para o reafirmar pela União Europeia de que planeia utilizar os bens russos congelados para compensar os danos da guerra, "em conformidade com o direito comunitário e internacional", embora não tenham sido dadas explicações sobre que passos irão ser dados para reencaminhar uma quantia que ascende a 300 mil milhões de euros.
A UE também reiterou "o apoio à fórmula de paz do presidente Zelensky" e o "empenho em trabalhar ativamente com a Ucrânia no plano de paz de 10 pontos", o que inclui a realização de uma cimeira da fórmula de paz.
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"Não somos intimidados e não seremos intimidados pelo Kremlin. Porque a Ucrânia e a UE, somos família (...) O vosso futuro é connosco, na nossa União Europeia comum, o vosso destino é o nosso destino." Charles Michel
Ficou também estabelecida a vontade comum na criação de um gabinete internacional em Haia para ajudar a investigar a Rússia pelo "crime de agressão" na Ucrânia. A medida é um ponto intermédio antes da criação de um tribunal especial competente para processar a liderança russa, como Kiev almeja.
Fora do comunicado, já na conferência de imprensa, von der Leyen regressou ao tema das sanções económicas à Rússia, cujo décimo pacote deverá entrar em vigor no dia 24 - coincidindo com o aniversário da invasão russa. Lembrando que "a sociedade e a economia russas já estão a pagar um preço muito elevado devido às sanções", disse que estas representam cerca de 10 mil milhões de euros e vão "concentrar-se na tecnologia que não pode e não deve ser utilizada pela máquina de guerra russa". A dirigente alemã deu como exemplo os componentes usados no fabrico de drones e disse ainda que a questão da evasão às sanções vai ser também encarada.
Destaque ainda para dois dados revelados pela presidente da Comissão. O primeiro, relativo à energia. Depois de recordar que antes da ofensiva em larga escala da Rússia a Ucrânia e a UE ligaram as redes de energia, e que então Kiev exportava eletricidade, von der Leyen disse que a UE está em condições de fornecer 2,2 gigawatts de eletricidade à Ucrânia. "Isto é solidariedade, é o rosto europeu que queremos mostrar", comentou. E para as obras de reparação de infraestruturas anunciou que vão ser desde já disponibilizados mil milhões de euros.
"O nosso objetivo é absolutamente claro: iniciar negociações sobre a adesão da Ucrânia à União Europeia. Não perderemos um único dia no nosso trabalho de aproximação entre a Ucrânia e a UE." Volodymyr Zelensky
Sobre o caminho a percorrer para a integração europeia, a presidente da Comissão, que na véspera elogiara os esforços na luta contra a corrupção, voltou a mostrar-se satisfeita. "A vossa determinação em avançar é impressionante. Estão a dar importantes passos em frente com todas as reformas para cumprir as recomendações. E não devemos esquecer que o fazem enquanto lutam contra um agressor", disse, embora tenha refreado o ímpeto de Zelensky. O presidente ucraniano não quer perder "um único dia" e deseja que as negociações comecem ainda este ano.
Adesão sem tamanho único
Questionada sobre a proposta de adesão da Ucrânia à UE, Ursula von der Leyen lembrou que o processo é "baseado no mérito", embora a trajetória varie entre os países candidatos. "Por outras palavras: não existem linhas temporais rígidas, mas existem objetivos. Não há um tamanho único, depende muito do país candidato e de como este avança".
A presidente da Comissão recordou que a sua instituição vai redigir um relatório inicial sobre o progresso da adesão da Ucrânia na primavera e depois enviado aos estados-membros para avaliação. Depois, no outono, o executivo comunitário vai divulgar um relatório sobre o alargamento, o qual engloba todos os países considerados como candidatos à adesão.
Enquanto presidência e governo ucranianos mostram ambição para fazer parte da família europeia, o vizinho russo estará a preparar-se para uma nova ofensiva na frente leste e não só em Bakhmut. Segundo Andii Yusov, representante dos serviços de informações militares em declarações à televisão ucraniana, são esperados "eventos muito ativos em fevereiro-março" porque "a meta de Putin é capturar o Donbass até março".
Aos jornalistas, Zelensky disse que não vai abrir mão de Bakhmut. "Lutaremos enquanto pudermos. Consideramos Bakhmut a nossa fortaleza." O presidente ucraniano mostrou-se esperançado em alcançar os objetivos militares se a entrega de armas, "especialmente de longo alcance", for agilizada. "A nossa tarefa consiste em não lhes dar uma oportunidade até que o nosso exército seja reforçado com as armas apropriadas."
Livro de cheques europeu
Reformas, ajuda humanitária, assistência militar, energia, desminagem, reconstrução e reparação de infraestruturas: Bruxelas, que desembolsou 49 mil milhões de euros em menos de um ano, vai continuar a ajudar Kiev.
450 milhões
Além dos 18 mil milhões de euros de assistência macrofinanceira para a máquina do Estado ucraniano continuar a funcionar, dos quais 3 mil milhões já foram desembolsados, Kiev vai receber mais 450 milhões, entre 305 milhões em apoios ao nível bilateral para a continuidade das reformas e 145 milhões em ajuda humanitária.
750 mil milhões
O primeiro-ministro ucraniano Denis Shmyhal disse estimar entre 600 e 750 mil milhões de euros os custos de reconstrução do país, enquanto um primeiro momento de reconstrução urgente está avaliado em 17 mil milhões. Von der Leyen anunciou, para este efeito, a alocação de mil milhões de euros.
30 000 militares
O novo objetivo da missão de assistência militar da UE à Ucrânia é chegar aos 30 mil soldados com formação militar ministrada em solo da UE até ao fim do ano, anunciou o chefe da diplomacia Josep Borrell.
375 500 explosivos
Segundo o governo ucraniano, as forças de segurança e os serviços de emergência neutralizaram 375 500 explosivos em 11 meses. A UE anunciou 25 milhões de euros para equipamento de desminagem.
cesar.avo@dn.pt
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