O presidente dos EUA, Donald Trump, ameaçou esta quinta-feira (31 de julho) subir o tom da guerra comercial com o Canadá, depois de o primeiro-ministro Mark Carney ter anunciado os planos de reconhecer o Estado Palestiniano - à semelhança de França e Reino Unido. Os EUA mostraram, uma vez mais, que são os principais aliados de Israel. Mas Trump não está feliz com as imagens de fome extrema vindas da Faixa de Gaza e mandou o seu enviado especial, Steve Witkoff, a Gaza para avaliar no terreno a distribuição de ajuda humanitária. “Uau! O Canadá acaba de anunciar que apoia a criação de um Estado para a Palestina. Isso tornará muito difícil para nós fechar um acordo comercial com eles. Oh’ Canadá!!!”, escreveu Trump na Truth Social. O prazo para negociar termina esta sexta-feira (1 de agosto), sob pena de uma tarifa de 35% sobre todos os produtos canadianos (fora os abrangidos no acordo comercial que também engloba o México). Na quarta-feira (30 de julho), o primeiro-ministro canadiano revelou que, “para se manter no caminho da paz oferecido pela solução de dois Estados”, Otava irá reconhecer o Estado Palestiniano durante a Assembleia Geral da ONU, em setembro. Mas pôs condições, exigindo que a Autoridade Palestiniana se comprometa a “reformas muito necessárias”, incluindo “eleições gerais em 2026 nas quais o Hamas não poderá participar” e “a desmilitarização do Estado palestiniano”. Nem Carney nem o governo canadiano responderam à ameaça de Trump. O primeiro-ministro tinha dito antes que as negociações tinham sido construtivas em relação a um acordo comercial, mas que podiam não ficar concluídas até ao final do prazo. Como parte das negociações, o Canadá tem feito concessões, elogiadas por membros da Administração de Trump - mas o presidente norte-americano tem sido mais crítico, tendo há uma semana admitido que podia não haver acordo. Entretanto, os EUA anunciaram ainda sanções contra membros da Autoridade Palestiniana e da Organização de Libertação da Palestina, considerando que estão a bloquear os esforços de paz com Israel. O Departamento de Estado disse que vai negar vistos para aqueles que queiram viajar para os EUA, mas não especificou os nomes dos afetados.Witkoff no terrenoEm relação à situação na Faixa de Gaza, Trump deixou outra mensagem na Truth Social. “A forma mais rápida de acabar com a crise humanitária em Gaza é o Hamas render-se e libertar os reféns!!!”, indicou. O seu enviado especial para o Médio Oriente, Steve Witkoff, esteve esta quinta-feira (31 de julho) em Jerusalém, tendo reunido com o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu.A revista The Atlantic, citando duas fontes anónimas da Administração Trump, alegava ontem que o presidente acredita que Netanyahu está a prolongar a guerra na Faixa de Gaza por considerações políticas - e a minar os esforços para alcançar um cessar-fogo. Contudo, as duas fontes duvidam que Trump tome alguma medida contra isso. A revista diz que parte da razão para a visita de Witkoff é para verificar de forma independente os esforços que Israel está a fazer para fornecer mais ajuda aos palestinianos, com Trump cada vez mais insatisfeito com os relatos de fome extrema no enclave. A Casa Branca confirmou isso, anunciando que Witkoff - junto com o embaixador norte-americano em Israel, Mike Huckabee - irá esta sexta-feira (1 de agosto) à Faixa de Gaza para avaliar a transferência de ajuda humanitária. O enviado e o embaixador “deslocar-se-ão a Gaza para inspecionar os atuais locais de distribuição de alimentos”, disse a porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt. A visita será a um dos centros da polémica Fundação Humanitária de Gaza, apoiada por Israel e financiada pelos EUA, mas criticada pelas Nações Unidas e outras organizações. “Vão encontrar-se com a população local para se inteirarem em primeira mão da terrível situação no terreno”, acrescentou Leavitt, explicando que depois de receber um relatório sobre a visita, Trump decidirá sobre um futuro “plano final para a distribuição de alimentos e ajuda humanitária na região”.No terreno, os bombardeamentos israelitas continuavam ontem, com pelo menos 51 palestinianos a morrer - incluindo 23 que estariam nas filas para receber ajuda humanitária. As autoridades de saúde de Gaza, controladas pelo Hamas, dizem que pelo menos três palestinianos morreram à fome. Egito, Jordânia e Emirados Árabes Unidos foram entretanto autorizados a lançar mais apoio a partir de aviões - um método caro e considerado pouco eficaz pelas Nações Unidas e organizações humanitárias. Alemanha e ItáliaAlém do Canadá, outros países já indicaram a intenção de reconhecer o Estado Palestiniano - é o caso de Malta e San Marino, além de Portugal. Austrália e Nova Zelândia dizem que é uma questão de tempo. Na União Europeia, Alemanha e Itália têm sido os principais obstáculos a medidas mais fortes da parte de Bruxelas contra Israel. Mas até daí vêm avisos. O chefe da diplomacia alemã, Johann Wadephul, também está em Jerusalém, tendo previsto visitar esta sexta-feira (1 de agosto) a Cisjordânia ocupada, depois de esta quinta-feira ter mantido encontros políticos em Israel. Num comunicado antes de deixar Berlim, o ministro disse que o objetivo da viagem é discutir a situação humanitária na Faixa de Gaza e a crescente pressão internacional sobre Israel. Por causa do Holocausto durante o regime nazi, a Alemanha sente uma responsabilidade histórica para com Israel. Mas o chanceler Friedrich Merz tem aumentado as críticas contra o país, em resposta à situação humanitária que se vive no enclave palestiniano. Esta quinta-feira, Wadephul foi mais longe, desencadeando críticas da extrema-direita israelita - que o Governo desautorizou.“A Alemanha está convencida: para resolver o conflito de forma sustentável, uma solução negociada de dois Estados continua a ser o único caminho que permite a ambos os povos viver em paz, segurança e dignidade”, disse Wadephul num comunicado. “Para a Alemanha, o reconhecimento de um Estado palestiniano acontece mais no final deste processo. Mas este processo precisa de começar já”, instou o ministro, alertando que “se este processo continuar bloqueado, a Alemanha deve considerar reagir em conformidade”.O ministro da Segurança Nacional, Itamar Ben Gvir (extrema-direita), respondeu sem qualquer subtileza, escrevendo no X: “80 anos após o Holocausto, a Alemanha está a voltar a apoiar o nazismo.” O chefe da diplomacia israelita, Gideon Sa’ar, “rejeitou fortemente” na mesma rede social essas declarações, considerando que são “desnecessárias e prejudiciais”. Sa’ar lembrou que a Alemanha é um “país amigo” e que “isso não muda quando há desacordos entre nós”. Apelidando Wadephul de “bom amigo”, o ministro disse depois que, no encontro entre ambos, discutiu os esforços israelitas para aumentar a ajuda humanitária a Gaza. Mas também falaram da questão do reconhecimento do Estado Palestiniano. “Disse ainda ao ministro que as medidas tomadas por certos países, como a França e o Reino Unido, para reconhecer um Estado palestiniano virtual, foram aplaudidas pelo Hamas e prejudicaram os esforços para alcançar um acordo de reféns e um cessar-fogo, atribuindo ao Hamas um prémio que endureceu a sua posição. Estas medidas são geopoliticamente insensatas e moralmente distorcidas”.Wadephul, citado pela Reuters, disse por seu lado que “Israel corre o risco de isolamento” e que está a tentar impedir isso. “Israel precisa sempre de amigos, parceiros e apoiantes na comunidade internacional. Isso está em perigo neste momento, e se há um país que tem a responsabilidade de evitar isso, é a Alemanha”, indicou o ministro, acrescentando que ainda “há necessidade de melhorias fundamentais para a população de Gaza”. A Itália é outro país que tem estado ao lado dos israelitas - depois dos EUA (e a um nível muito menor), Alemanha e Itália são os maiores fornecedores de armas a Israel. Na quarta-feira, a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, falou ao telefone com Netanyahu, insistindo “na necessidade de cessar imediatamente as hostilidades, dada a situação em Gaza que, sublinhou, é insustentável e injustificável”.