Israel continuou a bombardear alvos do Hezbollah em Beirute.
Israel continuou a bombardear alvos do Hezbollah em Beirute.EPA/WAEL HAMZEH

Tiros de luto e de alegria em Beirute, Irão promete retaliar 

Efeitos da morte do líder do Hezbollah num ataque israelita ainda por apurar, enquanto a população da capital libanesa se mostra aturdida com o fim de uma era.
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As forças israelitas prosseguiram a sua campanha aérea no Líbano, um dia depois de terem matado o líder do Hezbollah, e este respondeu com o lançamento de foguetes e mísseis, tal como os rebeldes houthis, do Iémen, lançaram um míssil quando o primeiro-ministro israelita acabava de chegar de Nova Iorque. Decapitado, o movimento xiita só confirmou a morte de Hassan Nasrallah horas depois de Telavive.

elo Médio Oriente registaram-se as mais desencontradas reações ao fim do homem que se tornou num dos seus mais poderosos líderes, tendo do seu maior patrocinador, o Irão, vindo o anúncio de que a sua morte “não ficará impune”. A declaração é do guia supremo Ali Khamenei, o qual, segundo a Reuters, foi levado para um local seguro. As fontes iranianas disseram que Teerão estava a concertar-se com os seus grupos aliados na região. 

Em Beirute, houve tiros para o ar com significados opostos. Nos bairros cristãos celebrava-se a morte de Nasrallah, enquanto noutros bairros homens armados obrigavam ao encerramento de lojas e outros disparavam em sinal de luto, enquanto a maior parte dos entrevistados pelos jornalistas mostrava descrença de que o sayyed (termo honorífico para os descendentes de Maomé) tinha morrido.

A eliminação de Nasrallah e dos comandantes militares do Hezbollah - segundo uma imagem distribuída nas redes sociais pelo governo israelita foram mortos 17 nos últimos tempos - levanta mais dúvidas do que certezas. Quem se segue a Nasrallah? Em que estado fica o Hezbollah? Irá outra fação daquele país tentar preencher o vazio de poder? Israel vai avançar com a invasão terrestre e, em caso positivo, voltar a ocupar o sul do Líbano? Qual será a resposta do Irão? 

Algumas interrogações não têm resposta cabal, para outras já há pistas. Segundo a Reuters, quem está na primeira linha de sucessão de Nasrallah é o seu primo Hashem Safieddine. De 60 anos, assemelha-se ao líder morto no seu currículo. Também é clérigo e usa o turbante preto que o sinaliza como descendente direto de Maomé; chefia há 30 anos o braço político da organização e é um eloquente orador com um discurso semelhante ao do primo. Tal como Nasrallah, Safieddine foi designado terrorista pelos Estados Unidos. O seu vínculo com o Irão é também familiar: um dos seus descendentes é casado com a filha de Qassem Soleimani, o general morto no Iraque por um drone norte-americano.

Em Beirute, o investigador Monahad Hage Ali, do Carnegie Endowment, diz à Reuters que o Hezbollah “enquanto organização foi significativamente enfraquecida em termos de reputação, capacidade militar e liderança”. E conclui: “Penso que a sua capacidade de se reerguer e de se manter de pé foi significativamente diminuída.”

Em Israel, onde se registaram festejos (também há relatos na Síria e no Irão), o ministro da Defesa Yoav Gallant considerou o ataque de sexta-feira à tarde “uma das ações mais importantes da história de Israel” e disse que estão a ser planeados os próximos passos. Segundo a ABC News, um desses passos será uma “incursão terrestre limitada no sul do Líbano”. O canal cita uma fonte norte-americana, sem adiantar mais pormenores. 

Regressado de Nova Iorque, onde discursou na Assembleia Geral da ONU, Benjamin Netanyahu disse que o seu país “acertou contas” com um “assassino em massa”. Para o primeiro-ministro israelita, Nasrallah “não era mais um terrorista, ele era o terrorista” e “o motor central do eixo do mal do Irão”, um homem que, acusa, tinha conspirado “para destruir Israel”. Segundo Netanyahu, a morte do líder xiita não só vai proporcionar o regresso dos 60 mil habitantes do norte, “mas também com o regresso dos reféns no sul”, referindo-se às dezenas de sequestrados pelo Hamas.

O presidente e a vice-presidente dos EUA mostraram-se satisfeitos com a morte do libanês. “Hassan Nasrallah e o grupo terrorista que liderou, o Hezbollah, mataram centenas de americanos durante um reino de terror que durou quatro décadas. A sua morte num ataque aéreo israelita é um ato de justiça para muitas das suas vítimas, incluindo milhares de civis americanos, israelitas e libaneses”, declarou Joe Biden. Kamala Harris disse que Nasrallah era um “terrorista com sangue americano nas mãos”, mas reafirmou que não quer que o conflito se torne “numa guerra regional mais vasta”.

Ataques em crescendo

27 de julho  
Fuad Shukr, conselheiro militar de Hassan Nasrallah, é morto na sequência de um ataque com mísseis a um edifício no Bairro de Dahieh, em Beirute. Shukr era suspeito de envolvimento no atentado de 1983 que matou cerca de 300 soldados norte-americanos e franceses na capital libanesa.

17 de setembro  
No que foi considerado pelo ex-diretor da CIA Leon Panetta “uma forma de terrorismo”, milhares de pagers sabotados de funcionários do Hezbollah explodiram em simultâneo. Milhares de pessoas ficaram feridas, o embaixador iraniano incluído, e pelo menos 12 morreram.

18 de setembro  
Mais dispositivos eletrónicos explodiram, em especial walkie-talkies, matando 30 pessoas, ferindo 750 e deixando a organização islamista sem linhas de comunicação. Em fevereiro, Nasrallah tinha dado ordens para evitar os telemóveis, alegando que Israel espiava através destes.

20 de setembro  
Novo ataque aéreo ao Bairro de Dahieh, em Beirute. Desta vez o alvo é Ibrahim Aqil, comandante da Unidade Especial Militar do Hezbollah, Força Redwan, o qual morrerá entre os escombros do edifício, entre 16 membros do Hezbollah e dezenas de outras vítimas.

23 de setembro  
As forças israelitas iniciam uma campanha de ataques aéreos contra alvos do Hezbollah. Só no primeiro dia fizeram 1600 bombardeamentos, dos quais morreram para cima de 550 pessoas. É preciso recuar a 2006 para encontrar um dia tão mortífero no Líbano.

cesar.avo@dn.pt 

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