Um dia Steve Witkoff está a ajudar a negociar o cessar-fogo entre Israel e o Hamas, no outro a dialogar com o Irão sobre um novo acordo nuclear. Nada de estranhar, afinal o magnata do imobiliário é o enviado especial dos EUA para o Médio Oriente. Mas o poder do parceiro de golfe do presidente Donald Trump (estava a jogar com ele quando o então candidato foi alvo da segunda tentativa de assassinato, na Florida) vai muito para lá desta região. Na semana passada, antes de ir para Omã falar com os iranianos, passou por São Petersburgo para um encontro com o presidente russo, levando a guerra da Ucrânia na bagagem. E não foi a primeira vez que se reuniu com Vladimir Putin. Witkoff parece ser o “enviado a tudo” do presidente norte-americano. “Ele tem uma coisa que mais ninguém tem. Tem a confiança total de Trump”, indicou uma fonte à CNN, sob anonimato. Com isso tornou-se no homem forte na política externa, mais do que o próprio secretário de Estado norte-americano, Marco Rubio - antigo adversário de Trump na corrida à presidência de 2016 que acabou ultrapassado por J.D. Vance na escolha para vice-presidente em 2024. A Casa Branca nega contudo que haja algum mal-estar entre Rubio e Witkoff, falando de uma “relação fantástica” entre ambos.Ao contrário de Rubio, cuja primeira viagem oficial foi apenas no início de fevereiro a cinco países da América Central, Witkoff andava para trás e para a frente no seu jato privado no Médio Oriente ainda antes da tomada de posse de Trump - ele esteve nas negociações que, no final da presidência de Joe Biden, levaram ao cessar-fogo entre Israel e o Hamas (entretanto já terminado) e à libertação de 33 reféns em troca de cerca de dois mil presos palestinianos. E, a visita da semana passada, foi a terceira que fez só este ano à Rússia (e a terceira em que se encontrou com o “amigo” Putin), tendo em fevereiro conseguido garantir a libertação do professor norte-americano Marc Fogel, condenado a 14 anos de prisão por posse de droga, em troca da libertação do perito em criptomoedas Alexander Vinnik. Também terá sido Witkoff que mencionou a Putin o caso de Ksenia Karelina, outra detida com nacionalidade norte-americana que os russos libertaram antes desta sua terceira viagem à Rússia.Mas quem é Witkoff?Nascido há 68 anos no Bronx, o empresário do setor imobiliário (dono de mais de 50 propriedades em todo o mundo, incluindo no Médio Oriente) conheceu o atual presidente nos anos 1980. Na altura, a empresa em que trabalhava como advogado (só fundou a sua na década de 1990) fez negócios com o milionário. Anos depois, reencontrou Trump num deli na cidade e, estando este sem dinheiro, pagou-lhe uma sanduíche de fiambre e queijo suíço. Quando, anos mais tarde, se reencontraram, Trump ainda se lembrava desta história e os dois tornaram-se amigos.Não seria a primeira vez que daria dinheiro a Trump, tendo sido um dos doadores da campanha presidencial. Witkoff discursou na Convenção Nacional Republicana, tendo descrito como Trump o ajudou e à família após a morte do filho mais velho, Andrew, numa overdose em 2011. O enviado especial dos EUA ao Médio Oriente terá dito às famílias dos reféns do Hamas que estão mortos, mas cujo corpo continua na Faixa de Gaza, que entendia a importância de recuperar os cadáveres para poder fazer o luto. “Sou um membro do clube dos que enterraram um filho. É um mau clube”, disse, citado pela AP. Witkoff também teve um cargo, mas menos visível, no primeiro mandato de Trump - fez parte do conselho de curadores do Centro John F. Kennedy para as Artes Performativas. Quando, no segundo mandato, Trump o nomeou enviado especial para o Médio Oriente, não lhe poupou elogios. “O Steve será uma voz implacável pela PAZ e deixar-nos-à a todos orgulhosos”, escreveu nas redes sociais. E agora?Mas a missão parece estar a complicar-se para o seu “enviado a tudo”. Apesar da última reunião de cinco horas com Putin, a guerra na Ucrânia não parece mais próxima do fim. Witkoff, que já foi criticado por dizer que a invasão “foi provocada” e “não necessariamente pelos russo”, disse contudo à Fox News que “finalmente” conseguiu saber quais são as exigências de Moscovo para a paz e que acredita que um acordo está “emergente”. Na guerra na Faixa de Gaza, e depois de ter caído o acordo de cessar-fogo, um “plano Witkoff” de libertação de mais reféns esteve em cima da mesa no mês passado. Mas não deu em nada. No Irão, uma nova ronda de negociações está prevista para este sábado, com Witkoff a dizer que o objetivo é um limite ao enriquecimento de urânio iraniano (não desmantelar o programa nuclear). O líder supremo iraniano, Ali Khamenei, disse não estar nem “muito otimista, nem pessimista” em relação ao diálogo.