Rússia ameaça Lituânia com "represálias graves" e "sérias"
118 dias de guerra. 15 milhões de deslocados. 4569 civis mortos, mais de 6 mil feridos. Quase 12 mil soldados ucranianos mortos, mais de 15 mil militares russos mortos. A ONU diz que os números reais das vítimas, estes são estimativas, devem ser muito superiores e que só serão conhecidos quando houver acesso total ás zonas cercadas ou sob intensos combates.
Nestes três meses e 29 dias, a Rússia ocupou mais do triplo no território que estava sob domínio das forças separatistas apoiadas pela Rússia na região de Donbass - uma área que tem agora mais de mil quilómetros de extensão e cerca de 150 de largura.
No terreno, nos últimos dias, a guerra está localizada em cinco zonas consideradas estratégicas: Severodonetsk, cidade quase na totalidade ocupada, exceto a zona oriental, que conquistada abre o caminho final para Lysychansk que fica a menos de 10 quilómetros e de Bilohorivka - é o que falta para o controle total da região de Lugansk; Lzyam a menos de 150 de quilómetros de Severodonetsk , mais a Norte; em Kharkiv, ainda mais a Norte, as tropas russas continuam a atacar as posições ucranianas que têm conseguido travar, ganhando inclusivé terreno, os intentos de Moscovo; e a Sul a região de "fronteira" acima de Kherson que permite o acesso a Mykolaiv e, mais a Leste, a Zaporizhzhia. Aqui os contra ataques ucranianos têm impedido o avanço russo, em particular a chegada a Odessa.
O ministério da defesa do Reino Unido afirma ser "provável" que, dada a violência dos combates, a Rússia tenha "sofrido perdas devastadoras entre os seus oficiais de nível médio e inferior". A consequência, estimam os britânicos, terá sido a "perda de moral e falta de disciplina entre os escalões mais baixos" e a natural perda de "quantidades significativas perdas de armamento".
A solução russa, dizem, terá sido o juntar de "algumas unidades fortemente esgotadas", as denominadas Forças de Frankenstein, que estão a "lutar no Leste".
A Sul, a cidade de Mariupol, onde ainda estão cerca de 100 mil pessoas, corre o risco de "um grande surto de cólera por haver falta de água potável e de instalações médicas".
No total, desde 24 de fevereiro, a Rússia já bombardeou 28 áreas do território da Ucrânia.
Três fronteiras: Polónia a Sul, mar Báltico a Oeste e a Lituânia a Norte e Leste. Moscovo fica a 1 300 quilómetros.
A "grande cidade", que antes da Segunda Guerra Mundial se chamava Königsberg e era alemã, foi cedida à União Soviética em 1945 na cimeira, entre Joseph Estaline, Winston Churchill e Harry Truman, que decidiu das novas fronteiras da Europa. Em homenagem ao revolucionário bolchevique Mikhail Kalinin, a cidade mudou de nome e foi repovoada por soviéticos após a expulsão da população alemã.
O enclave russo acabou, após o colapso da União Soviética, por ficar "preso" entre dois países da Nato e da União Europeia: Polónia e Lituânia que foi a primeira república soviética a declarar a independência, em 1990.
Apesar de receber da Europa, dos países vizinhos, uma grande parte do abastecimento alimentar, Kaliningrado depende muito do petróleo e carvão russo que chegam, maioritariamente, por via férrea - todos os meses mais de 100 carruagens.
Na segunda-feira, a Rússia protestou: a Lituânia "bloqueou o trânsito de mercadorias" no seu território em direção a Kaliningrado. Esta terça-feira chegou a ameaça: "exigimos uma restauração imediata do trânsito. Caso contrário, seguir-se-ão represálias".
Josep Borrell, chefe da diplomacia europeia, garante que "o trânsito terrestre entre a Rússia e Kaliningrado não foi interrompido nem proibido. O trânsito de passageiros e mercadorias continua. Não há bloqueio".
O que existe? "Não é a Lituânia que está a fazer nada, são as sanções europeias que começaram a funcionar a partir de 17 de junho", assegura o ministro dos Negócios Estrangeiros lituano, Gabrielius Landsbergis. Ou seja, os serviços ferroviários lituanos informaram os clientes que os bens de aço e metais ferrosos sancionados pela UE "deixarão de ser autorizados a transitar pela Lituânia", no âmbito das sanções contra a Rússia por ter invadido a Ucrânia, a 24 de fevereiro.
"Isto está a ser feito em consulta com a Comissão Europeia e em conformidade com as diretrizes da Comissão Europeia", explicou Landsbergis. Ou seja, há um bloqueio parcial.
A explicação de pouco serve a Moscovo que considera a medida "provocatória" e "abertamente hostil". E a ameaça é clara : "Se o trânsito de mercadorias entre Kaliningrado e o resto do território da Federação Russa através da Lituânia não for totalmente restabelecido em breve, então a Rússia reserva-se o direito de tomar medidas em defesa dos seus interesses nacionais".
O governo russo lembra, a seu favor, o Acordo de Colaboração e Cooperação com a União Europeia, assinado em 1994, sobre a "liberdade de trânsito" que é dos pilares" da Organização Mundial do Comércio.
"Se continuarmos assim, o Ocidente pode acabar a violar a Convenção das Nações Unidas sobre o direito do mar de 1982, onde também há liberdade de trânsito e liberdade em mar aberto e que permite que navios atravessem águas neutras para chegar a Kaliningrado", afirmou o vice-presidente do Senado russo. Se assim for, diz, "o mesmo vale para o espaço aéreo".
Outra ameaça: "medidas apropriadas estão a ser elaboradas a nível interministerial e serão adotadas em breve. Elas terão graves consequências negativas para o povo da Lituânia".
Estas palavras alimentam os receios de uma intervenção militar russa, a partir da Bielorússia, através do corredor Suwalki - uma faixa de quase 80 quilómetros entre a fronteira da Polónia e Lituânia que a ser cortada isolaria a Lituânia e a Letónia da Polónia e, assim, da União Europeia.
Kaliningrado, com 430 mil habitantes, é a sede da frota russa no mar Báltico e base de mísseis.