Em reação aos acontecimentos precipitados pela nova abordagem da Casa Branca à Ucrânia -- e sobretudo a Vladimir Putin --, líderes europeus reuniram-se em Paris para “garantir a curto prazo que a paz seja durável”, disse o ministro dos Negócios Estrangeiros francês Jean-Noël Barrot. Um dos temas em cima da mesa no Palácio do Eliseu foi a possibilidade de enviar tropas europeias para a Ucrânia como força de dissuasão. Uma força que poderá ter até 30 mil militares, e para a qual a França disponibilizou um terço desse número. Mas nem todos estão de acordo que este seja o momento nem o formato correto para a discussão. Olaf Scholz foi a voz mais crítica do encontro que reuniu no Palácio do Eliseu o presidente francês Emmanuel Macron, os chefes de governo da Alemanha, Dinamarca, Espanha, Itália, Países Baixos e Reino Unido, o secretário-geral da NATO, o presidente do Conselho Europeu e a presidente da Comissão Europeia. O chanceler, nas vésperas das eleições legislativas - saiu inclusive mais cedo devido à agenda da campanha - compareceu, mas mostrou-se indignado com o “momento errado” para debater sobre o envio de tropas para a Ucrânia porque este país, disse, continua a ser vítima de uma “guerra brutal”. .Para o social-democrata, o debate é “descabido” pelo tema e pelo momento. As críticas não se ficaram por aqui: “Admito que estes debates me surpreendem. Estão a falar nas costas dos ucranianos sobre os resultados de conversações que ainda não tiveram lugar, com as quais a Ucrânia não consentiu e para as quais não foi convidada.”O presidente ucraniano, no entanto, não se mostrou desagrado com esta reunião, a avaliar pelas declarações após a visita aos Emirados Árabes Unidos, e nas quais disse que se registaram progressos para a criação de um contingente militar no seu país. “Acredito que esta é a primeira plataforma para a futura criação de uma força deste tipo - as Forças Armadas da Europa, um exército que será capaz de responder no céu, na água, em terra, com drones de inteligência artificial, bem como no caso de uma ofensiva russa”, disse. No entanto, numa entrevista concedida no sábado e difundida na segunda-feira à estação alemã ARD, Zelensky disse que em termos de “número de tropas de combate, frota, força aérea, drones, sinceramente a Europa é fraca”, declarações em consonância com o seu discurso na Conferência de Segurança de Munique, e na qual apelou para a criação de um exército europeu.Na referida entrevista, o presidente ucraniano lamentou a atitude da nova administração norte-americana face ao líder russo. “O problema é que os Estados Unidos estão a dizer hoje coisas que são muito agradáveis para Putin. Penso que é aí que reside o problema. Porque querem agradar-lhe”, disse. No entanto, o enviado especial Keith Kellogg disse agora que os EUA não afastam a hipótese de enviar tropas de manutenção de paz para a Ucrânia. “A política sempre foi não tirar nenhuma opção da mesa”, disse o general após reunir-se com aliados da NATO em Bruxelas. “Não se quer entrar numa posição de negociação onde as opções foram tomadas.” Uma mensagem num tom mais conciliador, depois das declarações do secretário da Defesa Pete Hegseth e do vice-presidente J.D. Vance em Bruxelas e em Munique, em especial deste último. “Ao ouvir este discurso, tivemos a impressão de que [os Estados Unidos] queriam começar uma querela connosco, e nós não queremos começar uma querela com os nossos amigos”, reagiu Kaja Kallas, chefe da diplomacia da União Europeia. Também Kiev, num difícil jogo de equilibrismo, se mostra preocupada com o possível virar de costas dos EUA à Europa. “A Europa não pode substituir a ajuda norte-americana”, disse à Al Jazeera o antigo chefe do Estado-Maior da Ucrânia Ihor Romanenko. Nesse caso, diz, a Ucrânia duraria “seis meses”. .“Estamos prontos e dispostos a contribuir para as garantias de segurança da Ucrânia, enviando as nossas próprias tropas para o terreno, se necessário.”Keir Starmer.Keir Starmer afirma estar pronto para enviar tropas britânicas para a Ucrânia.Os líderes europeus reunidos em Paris também saberão dessa dura realidade, pelo que apelaram para Washington não se retirar da equação. “Uma garantia de segurança norte-americana é a única forma de dissuadir efetivamente a Rússia de voltar a atacar a Ucrânia”, afirmou o primeiro-ministro britânico Keir Starmer. “Neste momento, temos de reconhecer a nova era em que nos encontramos e não nos agarrarmos desesperadamente ao conforto do passado. É altura de assumirmos a responsabilidade pela nossa segurança e pelo nosso continente”, acrescentou o trabalhista que, em entrevista ao Daily Telegraph, avançou com a disposição do envio de tropas de paz para o país sob agressão russa, “se necessário”. O primeiro dirigente a levantar a questão, embora noutro âmbito, foi Macron. Há um ano, ao lado de Scholz, o chefe de Estado francês mencionou pela primeira vez o envio de soldados ocidentais para a Ucrânia. No mês passado, Macron e Zelensky voltaram a falar sobre o possível “envio de contingentes militares estrangeiros” para a Ucrânia.As conversações para um cenário de envio de tropas europeias para a Ucrânia uma vez caladas as armas ganharam um sentido de urgência depois de a administração norte-americana dar indicações de que estará disposta a negociar com a Rússia sem a presença da Ucrânia ou da Europa. Segundo fontes da administração norte-americana ouvidas pelo The Washington Post, os países europeus preparam uma força de dissuasão de entre 25 mil e 30 mil soldados, os quais não estariam na linha da frente, mas em estado de prontidão para responder a qualquer tentativa de reinício da guerra. As mesmas fontes dizem que a França pode enviar cerca de 10 mil militares para essa missão. Em troca, os europeus querem que os EUA ajudem na recolha de informações, vigilância e reconhecimento, bem como uma eventual defesa aérea para proteger as tropas.“Também queremos ter o domínio da escalada se surgirem tensões e se houver algum conflito. E precisamos de ter os Estados Unidos a bordo”, disse o ministro da Defesa holandês, Ruben Brekelmans, ao Post.Mas nem assim todos estão dispostos a colaborar com o envio de soldados. “Se for possível dar garantias de segurança através da presença, em conjunto com os EUA e a NATO, a Polónia estará ativa de várias formas, mas não estou a pensar enviar tropas polacas para a Ucrânia”, reafirmou o primeiro-ministro Donald Tusk, que tal como Scholz também joga com o calendário eleitoral..Alemanha e Países Baixos rejeitam aumentar a dívida da UE para gastar em defesa