Putin exige NATO fora da Ucrânia. Zelensky quer estar na próxima cimeira da aliança
A cimeira da NATO terá lugar em Haia, nos dias 24 e 25 de junho. Planeada para ter uma agenda curta e assim evitar choques entre o norte-americano Donald Trump e os restantes líderes, esta passou para o centro das atenções depois de terem surgido notícias de que este ano o ucraniano Volodymyr Zelensky não seria convidado, por um lado; e, por outro, de que uma das condições de Vladimir Putin para a paz será o compromisso ocidental de que a aliança militar não se alargue a leste.
Segundo três fontes ouvidas pela Reuters em Moscovo, Putin vai condicionar o processo de paz na Ucrânia a um compromisso escrito dos países membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte segundo o qual o alargamento a leste, isto é, à Ucrânia, Moldávia e Geórgia, ficaria fora de questão e que a Ucrânia teria de ser neutral.
Em meados de dezembro de 2021, a Rússia enviou a cada país da Aliança Atlântica uma proposta de acordo para "abster-se de qualquer novo alargamento da NATO, incluindo a adesão da Ucrânia e de outros estados". Também exigia o regresso da NATO às suas fronteiras de 1997, o que, na prática, implicaria a saída de 14 aliados -- países que pertenceram à União Soviética como a Estónia, Lituânia e Letónia, ou que tinham estado sob a Cortina de Ferro soviética. Estados Unidos e NATO rejeitaram as exigências de Putin e propuseram em alternativa diálogo e acordos de desarmamento em paralelo ao fim da concentração de tropas junto à fronteira com a Ucrânia. Menos de um mês depois, eclodia a "operação militar especial". O líder russo alegou que forçar a Ucrânia à neutralidade e "desmilitarizar" o país estaria entre os objetivos da invasão.
Os planos de Moscovo saíram furados quanto a afastar a aliança da chamada esfera de influência. Com a adesão da Finlândia, em 2023, a extensão da fronteira dos países da NATO (agora seis) com a Rússia duplicou.
Para Kiev, aceitar a exclusão da NATO -- ainda que num futuro longínquo --é um recuo estratégico difícil de aceitar, principalmente por ser imposto pelo país invasor. Além de a adesão à aliança militar estar inscrita na sua Constituição, da cimeira da NATO anterior, em Washington, ficou inscrito no seu comunicado o "caminho irreversível para a integração euroatlântica plena, incluindo a adesão à NATO".
No entanto, ainda antes de Trump voltar a sentar-se na Casa Branca já se sabia que os seus conselheiros não estavam inclinados a conceder o caminho de adesão da Ucrânia à NATO. Longe vão os tempos em que o pré-candidato republicano às eleições de 2016 dizia não se importar com o tema. "Se entrar, ótimo. Se não entrar, ótimo." Já em 2025, disse para Kiev "esquecer" a aliança. O seu secretário da Defesa, Pete Hegseth, disse que os EUA "não acreditam que a adesão da Ucrânia à NATO seja um resultado realista de um acordo negociado". Em resposta, Zelensky disse que se a Ucrânia ficar arredada da organização fundada em Washington, "isso significa que a Ucrânia irá construir a NATO no seu território", ou seja, implicaria ter "umas forças armadas tão grandes como as que os russos têm" e que, para tal, precisariam de apoio financeiro ocidental.
Além de afastar de vez Kiev da NATO e de impor a neutralidade, Moscovo também exige o levantamento de sanções, o fim do congelamento dos bens russos no Ocidente e a "proteção dos falantes de russo na Ucrânia". Recorde-se que Putin chegou a dizer que Kiev cometeu "genocídio" no Donbass, a região do leste ucraniano que desde 2014 foi palco de movimentos separatistas apoiados pelo Kremlin.
Estas exigências devem fazer parte do memorando para um acordo de paz que, no seguimento das conversações de 16 de maio em Istambul, Putin se comprometeu a apresentar depois de ter falado ao telefone com Trump. A porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo Maria Zakharova clarificou que o documento será trocado e discutido com a parte ucraniana na próxima reunião e não será enviado de antemão a Washington. Já o ministro Sergei Lavrov anunciou ter proposto a segunda ronda de negociações para a próxima segunda-feira, de novo em Istambul.
Entretanto, a pressão de Trump a Putin continuou. Embora num tom mais ameno, o presidente norte-americano disse que saberá dentro de "semana e meia a duas semanas" para concluir se o líder russo de facto está interessado num cessar-fogo e, nesse caso, "responder de uma forma um pouco diferente". Trump disse aos jornalistas que ao chamar Putin de "completamente louco" e de que estava "a brincar com o fogo", as suas "palavras falam por si".
Segundo as fontes ouvidas pela Reuters, Putin "está pronto para alcançar a paz mas não a qualquer preço"; o russo não estará disposto a devolver território e, ao invés, se vir uma oportunidade irá tentar conquistar mais ainda. Se Putin não chegar a um acordo de paz que lhe agrade, dizem, tentará mostrar através de vitórias militares que "a paz no futuro será ainda mais dolorosa".
Cimeira na berlinda
Há duas semanas, a agência italiana ANSA, citando fontes diplomáticas, noticiou que o líder ucraniano não seria convidado para a cimeira anual da NATO, o que sucederia pela primeira vez desde a invasão russa. O site Euroactiv complementou a informação: o objetivo da reunião de líderes é mostrar unidade da aliança e ter à mesma mesa Trump e Zelensky poderia criar tensões, explicaram as fontes ouvidas.
De visita a Berlim, Volodymyr Zelensky voltou ao tema: "Se a Ucrânia não estiver presente, será uma vitória para Putin, mas não contra a Ucrânia, e sim contra a NATO. A decisão cabe, portanto, aos nossos parceiros."
Na sequência da notícia da ANSA, o secretário de Estado Marco Rubio disse que os EUA não se opuseram a que o ucraniano estivesse na reunião. O embaixador dos EUA na NATO, Matthew Whitaker, disse esperar que Zelensky esteja presente em Haia, mas não sabia em que qualidade. Segundo o The New York Times, a cimeira não incluirá uma reunião do Conselho NATO-Ucrânia, mas está previsto um fórum da indústria de defesa, na qual o presidente ucraniano poderá comparecer.
Na capital alemã, os ministros da Defesa da Ucrânia e da Alemanha assinaram um acordo para financiar a produção de mísseis de longo alcance em território ucraniano. Também foi anunciado um apoio militar suplementar no valor de 5 mil milhões de euros. A questão da transferência dos mísseis Taurus ficou na penumbra. Segundo o chefe de gabinete do chanceler Merz, em declarações ao Welt, a discussão sobre este tema não deve ser pública e o governo não afastou a hipótese. "Cada arma no seu devido tempo e em consonância com os respetivos desafios militares", disse Thorsten Frei.