Depois da aceitação do plano de trégua total de 30 dias por parte da Ucrânia, os Estados Unidos viraram-se para a Rússia, com várias declarações públicas a pressionar o Kremlin para - ainda antes de o enviado especial dos EUA aterrar em Moscovo - também dar o sim ao calar das armas. O líder russo, que já fez saber que não está muito interessado numa pausa nas hostilidades, deslocou-se à região de Kursk. Aí, onde as suas forças, em conjunto com as norte-coreanas, registaram avanços significativos nos últimos dias, Vladimir Putin deu ordens para a libertação total do oblast localizado no ocidente do país e que faz fronteira com a região ucraniana de Sumy. “Espero que todas as missões de combate que as nossas unidades enfrentam sejam cumpridas e que o território da região de Kursk seja em breve completamente libertado do inimigo”, disse ao chefe do Estado-Maior Valery Gerasimov, em declarações transmitidas pela televisão. Putin falava em primeiro lugar para a sua população, um dia depois de as forças da Ucrânia terem executado o maior ataque com drones a várias regiões da Rússia, Moscovo incluída. Além disso, a incursão ucraniana em Kursk, iniciada em agosto, foi uma humilhação para a Rússia, que teve de recorrer a milhares de soldados norte-coreanos para contrariar a perda de território seu. Kiev explicou desde o início que o objetivo desta operação era triplo: obrigar a Rússia a deslocar forças da frente para ali acorrer; capturar militares russos para trocar com os seus aprisionados pela Rússia; e que o território viesse a servir de moeda de troca em futuras negociações..1100Km2 foi quanto a Rússia recuperou de território na região de Kursk. Em agosto, a Ucrânia fez uma incursão naquela região e tomou o controlo de cerca de 1300 km2.. De trajes militares - um atavio incomum -, o chefe do Kremlin aproveitou o momento positivo para as suas forças, que se aproveitaram do apagão das informações militares norte-americanas a Kiev para surpreender as posições ucranianas, e deslocou-se junto da linha da frente, outro momento raro desde o início da invasão. O líder russo propôs a criação de uma zona tampão ao longo da fronteira e disse que os militares ucranianos capturados “devem ser tratados como terroristas”. Já Gerasimov, que na véspera tinha agraciado soldados que participam no esforço de recaptura do território, disse que nos últimos cinco dias as suas forças reocuparam 24 localidades e 259 km2, num total de 1100 km2 retomados aos ucranianos. O general alegou ainda que as tropas ucranianas sofreram “pesadas baixas”, nada menos do que 67 mil soldados, e que as restantes estão cercadas. Também disse que foram tomados 430 soldados como prisioneiros. Na quarta-feira, a principal localidade tomada, Sudzha, passou de novo ao controlo russo. Do lado ucraniano, o comandante do exército ucraniano, Oleksandr Syrsky, disse que as suas tropas iriam combater em Kursk “enquanto for necessário”, mas deu a entender que estavam a retirar-se. “Na situação mais difícil, a minha prioridade tem sido e continua a ser salvar as vidas dos soldados ucranianos. Para o efeito, as unidades das forças de defesa estão, se necessário, a manobrar para posições mais favoráveis”, declarou. .“Não vamos reconhecer que os territórios ocupados são russos. Esta é a linha vermelha mais importante. Nunca deixaremos que ninguém se esqueça deste crime contra a Ucrânia.”Volodymyr Zelensky.Em Moscovo, o Kremlin disse estar a aguardar por informações pormenorizadas por parte dos EUA sobre os resultados das negociações com Kiev na cidade saudita de Jidá. Dmitri Peskov alvitrou a hipótese de uma nova conversa entre Putin e Donald Trump. Já este, ao receber o primeiro-ministro irlandês Micheál Martin, disse que pessoal seu estava a caminho da Rússia, confirmando a viagem do enviado especial Steve Witkoff a Moscovo. “Esperemos que consigamos um cessar-fogo. Agora depende da Rússia”, disse o presidente norte-americano aos jornalistas. Trump aproveitou para exercer pressão ao dizer que não o estava a fazer. “Podemos pressionar, mas espero que não seja necessário. Podemos tomar medidas no âmbito financeiro que seriam muito duras para a Rússia”, afirmou. Nas redes sociais, o senador Lindsey Graham complementou as palavras de Trump. Disse que Zelensky mostrou querer a paz e que agora é a vez de Putin, mas mostrou-se cético, e anunciou que até ao final da semana vai propor “sanções e tarifas muito pesadas” para pressionar Moscovo. .“Estou extremamente cético de que a Rússia aceite o cessar-fogo e tenho muitas dúvidas de que queiram acabar com esta guerra. Zelensky passou o teste de querer a paz.”Lindsey Graham.O regime de Putin não estará interessado em aceitar a proposta dos EUA. Segundo um documento de um grupo de reflexão próximo do FSB, que o The Washington Post revelou, Moscovo vai exigir o reconhecimento da soberania russa sobre os territórios ucranianos de que Moscovo se apoderou, e prevê uma nova divisão da Ucrânia para criar uma zona-tampão no nordeste e uma zona desmilitarizada nas regiões do sul da Ucrânia, perto da Crimeia, além de exigir o “desmantelamento completo” do atual governo ucraniano.