ONU quer saber onde está Peng Shuai e WTA ameaça retirar provas à China
Peng Shuai está desaparecida há 18 dias e o mundo quer saber se está bem. A preocupação com o bem estar físico da tenista chinesa tem crescido a cada dia que passa. Peng acusou o ex-vice-presidente chinês, Zhang Gaoli, de agressão sexual no dia 2 e desde então que não deu sinais de vida.
O mundo não acredita na reclusão voluntária e pede provas do bem estar físico da atleta de 35 anos. A ONU exige mesmo "explicações" e uma "investigação transparente" às acusações. "É importante sabermos onde ela está, em que condições se encontra e como é que está", disse ontem Liz Throssell, porta-voz do Alto Comissariado para os Direitos Humanos da ONU, numa conferência de imprensa em Genebra.
Depois das críticas pela falta de ação do governo chinês, o presidente da Associação de Ténis Feminino (WTA), Steve Simon, admitiu na CNN estar "preparado" para suspender as competições na China se o desaparecimento da tenista não for investigado de forma completa e adequada, estando "disposto a enfrentar as complicações que surgirem" de uma decisão drástica. "Estamos numa encruzilhada no nosso relacionamento com a China. Estamos dispostos a suspender os nossos negócios e acordos, porque isto é sem dúvida maior do que o negócio", disse Simon, defendendo que "as mulheres devem ser respeitadas e não censuradas".
O ténis feminino chinês é mais influente que o masculino no panorama mundial e tem sido um forte aliado da WTA. Se o boicote avançar, o rombo será na ordem dos 25 a 30 milhões de euros. Foi esse o valor pago em torneios do circuito profissional, nas categorias de 125, 250, 500 e 1000, nos anos pré-pandemia da covid-19. Para 2022, estão previstos dez torneios, incluindo as WTA Finals, que reúne as oito melhores tenistas da época no torneio mais cotado a seguir aos quatro Grand Slams, atribuídas a Shenzhen até 2030.
O líder da entidade máxima do ténis feminino mundial confessou que não acredita que o email que recebeu como sendo de Peng - "não estou desaparecida. As alegações de abusos sexuais não são verdadeiras. Estou a descansar em casa e estou bem. Obrigado pela sua preocupação" - tenha sido enviado pela tenista. "É difícil acreditar que Peng Shuai escreveu aquela mensagem que recebemos ou que lhe pode ser atribuída. Peng revelou grande coragem ao descrever as alegações de abuso sexual contra um alto quadro do Governo chinês. A WTA e o resto do mundo precisam de obter evidência verificável de que ela está segura. Tentei contactá-la de várias maneiras, sem sucesso", revelou Simon.
A Imprensa chinesa quase ou nada diz sobre o assunto - exceção feita à difusão da carta enviada ao presidente da WTA - e o governo chinês, através do ministério dos negócios estrangeiros, disse "desconhecer o caso". Zhang Gaoli ainda não reagiu. Assim como o COI, que fez saber à comunicação social que acredita numa "diplomacia silenciosa" e não em tomadas de posição drásticas como as defendidas por vários grupos ativistas, que apelam ao "boicote" generalizado aos Jogos Olímpicos de Inverno Pequim 2022.
Peng acusou o antigo vice-primeiro-ministro chinês, Zhang Gaoli, agora com 75 anos e afastado da vida política desde 2018, de a ter forçado a manter relações sexuais apesar das repetidas recusas. A primeira vez foi após uma partida de ténis em casa do casal Gaoli, em Pequim. E, segundo a mensagem da tenista na rede social Weibo, entretanto censurada e apagada, a mulher de um dos homens mais poderosos da China entre 2013 e 2018 aguardou pelo marido à porta do quarto enquanto a agressão acontecia.
Na mesma mensagem, a tenista admitiu que começou a sentir "alguma coisa por ele" e manteve um relacionamento voluntário durante cerca de três anos, com conhecimento da mulher, até que o governante terminou o relacionamento há alguns meses.
A denúncia de Peng foi a primeira contra um alto quadro do regime desde que o movimento #MeToo chegou à China, em 2018, antes de ser amplamente reprimido pelas autoridades. Agora são muitos os que sob a hashtag #WhereIsPengShuai se pronunciam sobre o assunto. Caso de Serena Williams, que se mostrou "chocada" e "devastada" com o desaparecimento da colega chinesa. A mesma expressão - "chocada" - usou Naomi Osaka para relevar preocupação com Peng.
Nascida a 8 de janeiro de 1986, Peng fez carreira a jogar pares. Profissional desde 2000, foi número 1 do ranking mundial de pares e 14.ª em singulares em 2014. Conquistou 25 títulos, 23 deles em pares, com destaque para Wimbledon (2013) e Roland Garros (2014).
Foi também a primeira tenista chinesa a atingir o topo da hierarquia do ténis e rivaliza com Li Na - a única chinesa a ter conseguido vencer um Grand Slam na variante de singulares pelo título de rainha do ténis chinês. Em 2018 esteve suspensa por três meses por ter tentado coagir a então parceira de pares a desistir do torneio de Wimbledon em 2017 e desde 2019 que não conquista qualquer torneio.
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