Dois dias depois das eleições presidenciais venezuelanas de 28 de julho, o candidato da oposição, Edmundo González, discursou diante de milhares de apoiantes numa manifestação junto à delegação das Nações Unidas em Caracas. Insistiu ser ele o vencedor das presidenciais - e não Nicolás Maduro como foi oficialmente proclamado - e lembrou às Forças Armadas que não havia razão para reprimir o povo que exigia nas ruas o reconhecimento da sua vitória..Estas e outras mensagens têm sido repetidas desde então, mas apenas através das redes sociais. Já passou mais de um mês e González nunca mais foi visto em público - nem nas outras manifestações convocadas pela oposição contra Maduro. Segundo a sua equipa, resguardou-se num “local seguro”, face às ameaças crescentes do presidente venezuelano, que o acusa de ser um “cobarde” e de “liderar um golpe de Estado do seu esconderijo”. .Na segunda-feira, e depois de o ex-embaixador ter faltado a três convocatórias da justiça, um juiz venezuelano emitiu um mandado para a sua captura. É acusado de seis crimes relacionados com as denúncias de fraude eleitoral que tem feito contra o regime de Maduro, incluindo desobediência às leis, conspiração, usurpação de funções - por ter, por exemplo, publicado as atas eleitorais que comprovam a sua vitória e que não foram oficialmente divulgadas pelo Conselho Nacional Eleitoral - ou sabotagem. .Segundo o seu advogado, José Vicente Haro, González tem saltado “de casa em casa para salvar a vida.” Em declarações à rádio colombiana W, disse ainda que ele não está a pensar pedir asilo político. Já o jornal brasileiro O Globo, citando fontes em Caracas, alega que ele estará escondido numa embaixada - não a brasileira. “Analistas e jornalistas especulam que o candidato opositor pode estar numa embaixada europeia”, escreve o jornal..Aniversário escondido.González, que fez 75 anos no final de agosto, foi escolhido como candidato opositor depois de María Corina Machado, a vencedora das primárias da Mesa da Unidade Democrática, ter sido impedida pelo regime de o fazer. Ela é o principal rosto da oposição, tendo feito campanha ao lado do ex-diplomata (quase desconhecido até então), cuja candidatura conseguiu passar pelos obstáculos do Governo..“Quero agradecer a todos as numerosas expressões de carinho e felicitações recebidas por mais um ano de vida, no meio de momentos difíceis. Sempre com vocês, com a verdade, pela paz, o progresso e o futuro da Venezuela”, escreveu no X, a 30 de agosto, um dia depois do aniversário. Sobre o mandado de captura, limitou-se a partilhar mensagens de condenação e apoio..Num comunicado conjunto, Argentina, Costa Rica, Equador, Guatemala, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Uruguai rejeitaram “de maneira inequívoca e absoluta a ordem de prisão” emitida na segunda-feira. Também os EUA criticaram o mandado de captura, que consideraram “injustificado”. O chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, rejeitou “categoricamente” o mandado de captura, exortando as autoridades venezuelanas “a respeitar a sua liberdade, integridade e direitos humanos.” Vários países reconhecem a vitória de González, enquanto outros insistem em querer a publicação das atas oficiais..As ameaças de Maduro contra González alargam-se também a María Corina Machado, igualmente escondida na clandestinidade - apesar de ter aparecido em vários protestos convocados pela oposição contra o presidente em agosto. A ex-deputada promete “lutar até ao fim”, não parecendo disposta a seguir o mesmo destino que outros opositores, que acabaram no exílio. Para alguns analistas, o objetivo do mandado de captura contra González é pressioná-lo a procurar refúgio noutro país, como Juan Guaidó ou Leopoldo López..susana.f.salvador@dn.pt