Odessa volta a ser alvo russo quando as atenções se viram para a Moldávia 

A partir da Transnístria a Rússia irá invadir o antigo estado soviético nos próximos dias, garante a secreta militar ucraniana, e com isso pressionar o sul, em particular Odessa, que voltou a ser bombardeada.

Um dia depois de o The Times ter avançado com a notícia de que o Kremlin já terá dado o aval à decisão de invadir a Moldávia, e que esta deverá acontecer antes de dia 9, a estratégica cidade de Odessa - situada somente a cem quilómetros de Tiraspol, a capital da Transnístria - foi alvo de vários ataques por parte das forças russas, que a leste manteve combates "ativos e intensos", mas retirou-se de Ruska Lozova, vila no distrito de Kharkiv que voltou para as mãos de ucranianos. Nas regiões menos afetadas pelo conflito, aumentam as filas para abastecimento de combustível. Em Bruxelas, os ministros com a pasta da energia discutiram a próxima ronda de sanções, que deverá abranger o embargo ao petróleo russo, embora possa haver exceções para os países mais dependentes.

De manhã, um míssil russo atingiu uma ponte no estuário do rio Dniestre, na região de Odessa, disse Sergiy Bratchuk, porta-voz da administração regional. A ponte, que já tinha sido atingida duas vezes pelo exército russo, é a única ligação entre o território ucraniano e uma grande parte da região sul de Odessa. A destruição da ponte corta também o abastecimento de armas dos países aliados através da Roménia. À tarde, novo ataque com mísseis causou "mortos e feridos" em Odessa, disse o governador regional Maxim Martchenko. Mais tarde, a porta-voz do comando militar do sul da Ucrânia disse que um jovem de 15 anos morreu e outra criança ficou ferida em resultado do ataque, quando ambos estavam num edifício residencial. Além disso, um edifício religioso também terá sido atingido.

Em sentido contrário, as autoridades ucranianas anunciaram a destruição de um drone russo em Odessa e a detenção de 12 "sabotadores russos", que estariam a "preparar provocações" na cidade do Mar Negro. A sudoeste de Odessa, não longe da ilha das Serpentes, Kiev anunciou ter destruído dois navios patrulha russos com recurso aos drones turcos.

Este ataque a Odessa surge dias depois de terem ocorrido explosões em Tiraspol, a capital da região separatista e pró-russa da Transnístria. Segundo os serviços de informações ocidentais e ucranianos, as referidas explosões - o ataque à sede da agência de segurança local em Tiraspol e a um centro de transmissão de televisão e rádio numa aldeia, sem feridos a registar - fazem parte do manual russo para repetir o cenário do Donbass, onde as autoridades locais, patrocinadas por Moscovo, irão apelar para a intervenção salvadora de Vladimir Putin.

Segundo o diário londrino The Times, o plano de invasão da Moldávia, antigo estado soviético, estará aprovado pelo líder russo e deverá ocorrer perto do Dia da Vitória, 9 de maio, altura em que Putin poderá anunciar o reconhecimento da independência da Transnístria em relação à Moldávia, país que tem pela primeira vez uma presidente reformista e com uma agenda pró-europeia. O plano passará também pelo surgimento de protestos e motins em Chisinau. A Rússia tem uma base militar na Transnístria e, segundo as informações recolhidas pelo jornal inglês junto dos serviços secretos ucranianos, tentará reforçar primeiro as capacidades militares no terreno antes de avançar, apesar de o exército moldavo ser constituído por apenas 3000 soldados.

O The Times nota, contudo, que as avaliações dos serviços secretos ocidentais concluem que a Rússia não tem capacidade de momento para percorrer com segurança a rota para Tiraspol sem correr o risco de os seus aviões serem derrubados pela defesa aérea ucraniana na região de Odessa. Além disso, para transferir munições e tropas, a Rússia precisaria de criar um corredor terrestre a partir de Kherson, a principal cidade ocupada pelos russos desde o início da invasão, e através de parte das regiões de Mykolaiv e Odessa.

Para os Estados Unidos, os planos de Moscovo passam, para já, pela realização de falsos referendos na cidade de Kherson e nas regiões de Donetsk e Lugansk para tentar anexá-las à Rússia. "Tais referendos fraudulentos, com votos forjados, não serão considerados legítimos, nem quaisquer tentativas adicionais de anexação de território ucraniano. Mas temos de agir com um sentido de urgência", disse o embaixador norte-americano na OSCE, Michael Carpenter.

Para o Pentágono, a ofensiva russa na região do Donbass é "anémica" e "penosa", tendo em conta que agora estará a usar uma abordagem avessa ao risco para evitar as pesadas baixas sofridas na primeira fase da invasão. Por outro lado, segundo o Ministério da Defesa britânico, "é provável que mais de um quarto" das unidades postas ao serviço da invasão russa "estejam agora imobilizadas".

Os ucranianos têm outras indicações. Os serviços de informações da Defesa afirmam que a Rússia poderá anunciar a mobilização geral em breve e no terreno o Estado-Maior das Forças Armadas diz que as tropas russas estão a tentar tomar o controlo das cidades Rubizhne e Popasna, em Lugansk, e ganhar o controlo total sobre a região. As tropas russas estão também a avançar de Izyum, na região de Kharkiv, para sudeste, em direção a Donetsk. E a sul, a Rússia está a tentar tomar toda a região de Kherson.

Um novo pacote de sanções à Rússia deve incluir um embargo ao petróleo, de forma progressiva, e com a possibilidade de isentar países altamente dependentes como a Hungria. O sexto pacote de medidas contra o regime russo visará também o maior banco do país, o Sberbank, que será excluído do sistema internacional de pagamentos SWIFT.

Da reunião de ministros da Energia e do Ambiente da União Europeia saiu a advertência de que os 27 devem preparar-se para uma possível rutura total no fornecimento de gás da Rússia, depois de Moscovo já o ter feito à Polónia e à Bulgária. A Rússia passou a exigir aos "países hostis", designação que inclui os Estados-membros da UE, o pagamento do gás em rublos, uma forma de contornar as sanções financeiras ocidentais contra o seu banco central. No final do mês vários países deveriam renovar os contratos de fornecimento. Para a Comissão Europeia é inaceitável o pagamento em rublos. Mas não há certeza de como todos os países irão proceder.

Israel exige retratação de Lavrov

O Ministério dos Negócios Estrangeiros de Israel convocou o embaixador russo em Telavive, Anatoly Viktorov, após o ministro dos Negócios Estrangeiros Sergei Lavrov ter sugerido que Hitler tinha raízes judaicas, ao mesmo tempo que atacava o presidente ucraniano. No domingo, em declarações a jornalista italianos, Lavrov defendeu a afirmação da Rússia de que está a tentar "desnazificar" a Ucrânia, tendo dito que não importava que o presidente Zelensky fosse judeu, porque "Adolf Hitler também tinha sangue judeu" - uma alegação sem provas. "O sábio povo judeu diz que os maiores antissemitas são geralmente judeus", afirmou ainda o ministro russo.

Estas declarações fizeram com que o primeiro-ministro israelita saísse do quase silêncio em que se encontra sobre a invasão russa. Telavive quer manter a coordenação militar com Moscovo no que respeita à Síria e poder servir como mediador em negociações de paz. "A utilização do Holocausto do povo judeu como uma arma de arremesso político deve cessar de imediato", disse Naftali Bennett.

Já o ministro dos Negócios Estrangeiros Yair Lapid disse que Lavrov tinha feito "uma declaração imperdoável e ultrajante" e exigiu um pedido de desculpas. "Os judeus não se mataram a si próprios no Holocausto. O nível mais baixo de racismo contra os judeus é acusar os próprios judeus de antissemitismo. Os ucranianos não são nazis, apenas os nazis eram nazis, apenas eles levaram a cabo o extermínio sistemático dos judeus", disse.

cesar.avo@dn.pt

Mais Notícias

Outros Conteúdos GMG