O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, chegou à Casa Branca sabendo que o presidente norte-americano, Donald Trump, o iria pressionar a aceitar um acordo de cessar-fogo na Faixa de Gaza. Mas levava um trunfo na manga para o jantar entre os dois, na segunda-feira à noite: uma cópia da carta que escreveu para nomear o republicano para o prémio Nobel da Paz. Trump, que não esconde o desejo de ser galardoado, pareceu surpreendido e agradeceu. Netanyahu conseguiu seduzir Trump com as palavras - para trás parece ter ficado a irritação com Israel (e o Irão) nas primeiras horas do cessar-fogo que incluiu o uso de um palavrão. Mas o primeiro-ministro israelita ainda não conquistou o presidente com a ação esperada: um cessar-fogo na Faixa de Gaza. .Trump irrita-se mas diz que cessar-fogo se mantém. “Foi uma grande honra parar a guerra!”.Esta terça-feira, pelo menos 78 palestinianos morreram nos ataques israelitas, tendo Israel anunciado também a morte de cinco soldados na explosão de bombas no norte do enclave. Apesar disso, as negociações indiretas com o Hamas continuam em Doha, com os israelitas a dizer que houve avanços mas que um acordo ainda pode demorar dias. O próprio Qatar, que com o Egito e os EUA serve de mediador, disse que o cessar-fogo “vai levar tempo”. Netanyahu fica em Washington até quinta-feira (um segundo encontro com Trump estava previsto para esta quarta-feira à noite) e o enviado especial dos EUA para o Médio Oriente, Steve Witkoff, vai juntar-se aos negociadores no fim da semana no Qatar, não estando de lado a hipótese de o acordo ser finalizado então.A proposta em cima da mesa prevê a libertação de 28 dos 50 reféns (incluindo dez dos 20 ainda vivos), a retirada das forças israelitas de partes do enclave, a entrada de ajuda humanitária e o fim da guerra. Serão estes dois últimos pontos os mais complicados. Em relação à ajuda, o grupo terrorista palestiniano quer que esta passe pelas Nações Unidas e não pela Fundação Humanitária de Gaza (junto de cujos centros alega que já morreram mais de 600 palestinianos). Quanto ao fim do conflito, quer garantias, enquanto Israel quer o Hamas totalmente fora da Faixa de Gaza.Quando os jornalistas perguntaram a Trump se uma solução de dois Estados era possível, o presidente norte-americano limitou-se a dizer “não sei” e a passar a pergunta a Netanyahu. “Faremos a paz com os nossos vizinhos palestinianos, aqueles que não nos querem destruir, e faremos uma paz em que o poder soberano da segurança permanecerá sempre nas nossas mãos”, respondeu o primeiro-ministro israelita, alegando que dar um Estado ao Hamas seria dar “uma plataforma para a destruição de Israel”. Netanyahu admitiu que os palestinianos não terão um “Estado completo”, mas disse não querer saber porque prometeu “nunca mais”. No primeiro encontro entre Trump e Netanyahu na Casa Branca, no início de fevereiro, o presidente dos EUA falou na ideia de enviar todos os palestinianos para outro lado e criar no enclave a “Riviera do Médio Oriente”. Nas declarações prévias ao jantar de segunda-feira, Netanyahu disse que os EUA e Israel estão a trabalhar com outros países que queiram dar “um melhor futuro” aos palestinianos, sugerindo de novo que estes vão para outro lugar. “Se as pessoas querem ficar, podem ficar, mas se querem sair, devem poder sair. Não deve ser uma prisão. Deve ser um espaço aberto e dar às pessoas uma escolha livre”, indicou o primeiro-ministro israelita. Horas antes, o seu ministro da Defesa, Israel Katz, tinha falado na criação de um acampamento para 600 mil palestinianos nas ruínas de Rafah, onde todos são livres de entrar, mas de onde não terão depois autorização para sair. No jantar Trump falou na “grande cooperação” dos “países vizinhos” para a proposta de recolocação dos palestinianos, apesar de a região ter criticado a proposta de os obrigar a deixar a Faixa de Gaza - um crime de guerra para um presidente que quer o Nobel da Paz. “O presidente Trump demonstrou uma dedicação firme e excecional à promoção da paz, da segurança e da estabilidade em todo o mundo”, diz a carta que Netanyahu escreveu a 1 de julho e enviou para o Comité Nobel Norueguês, responsável pela escolha do Nobel da Paz. Ao entregar uma cópia a Trump, elogiou o seu anfitrião por “forjar a paz, enquanto falamos, num país depois do outro na região”. O primeiro-ministro também cita na missiva o papel do presidente nos chamados Acordos de Abraão, que já permitiram o estabelecimento de relações diplomáticas entre Israel e vários países árabes, como Emirados Árabes Unidos ou Bahrain. A ideia de Trump é alargar esse projeto - a Arábia Saudita é o grande prémio - mas isso tornou-se complicado por causa na guerra em Gaza. Com o cessar-fogo, o presidente espera ultrapassar essa barreira. Netanyahu não é o primeiro a nomear Trump, com os críticos a dizer que essas nomeações se tornaram numa tentativa de cair nas boas graças do presidente. No mês passado, o Paquistão disse que ia nomear Trump, depois de ele ter travado a guerra com outra potência nuclear, a Índia - iniciada após a morte de turistas na disputada Caxemira. Os EUA também já ajudaram a negociar um acordo de paz entre o Ruanda e a República Democrática do Congo, esperando ajudar a acabar com o conflito que já causou milhares de mortos e de deslocados. Trump quer ficar conhecido como “um homem de paz” e mesmo quando os EUA atacaram o nuclear iraniano disse que o objetivo era parar a escalada do conflito. Mas não conseguiu, como queria e diz ser possível, acabar com a guerra da Ucrânia no primeiro dia de regresso à Casa Branca.