Lula da Silva, presidente da República, o Partido dos Trabalhadores (PT) e a esquerda em geral sofreram mais um choque de realidade nas eleições municipais encerradas no domingo: a direita predomina na política do Brasil. Mas Jair Bolsonaro (PL), ex-presidente da República e principal rosto da oposição, também sofreu um abalo: percebeu que representa apenas um pedaço dessa direita. Quem ganhou a eleição foram PSD, MDB, PP e União Brasil, partidos da direita moderada e (muito) pragmática que apoiaram Bolsonaro e agora apoiam Lula. .O PSD, partido jovem (de 2011) mas com velhas práticas (alia-se à esquerda e à direita de acordo com as circunstâncias), elegeu 891 prefeitos, superando o tradicional vencedor MDB, partido de Ricardo Nunes, eleito com 59% em São Paulo, a maior cidade do país. Nunes, que herdou o cargo, na qualidade de vice, de Bruno Covas, prefeito falecido em 2021, foi aposta pessoal de Tarcísio de Freitas (Republicanos), o governador de São Paulo especulado como candidato do bolsonarismo nas presidenciais de 2026, dada a inelegibilidade de Bolsonaro, e, por isso, talvez o maior vencedor nacional das municipais, uma vez que o ex-presidente receou empenhar-se na campanha..“Tarcísio é um líder maior”, disse Nunes, num discurso de vitória cheio de recados a Bolsonaro. “O seu nome é presente mas o seu sobrenome [apelido] é futuro”, concluiu, após derrotar Guilherme Boulos (PSOL), o candidato lulista em São Paulo..Boulos teve percentagem quase idêntica à obtida nas eleições de 2020, quando perdeu para a dupla Covas-Boulos, mas a diferença que o torna num dos derrotados desta eleição é ter gasto oito vezes mais na campanha e ter tido o apoio explícito, se bem que pouco presente, de Lula..Com menos holofotes do que Tarcísio, também Ronaldo Caiado (União Brasil), governador do Goiás, e Ratinho Junior (PSD), governador do Paraná, outros dois nomes do campo da direita especulados para a sucessão de Bolsonaro, conseguiram fazer eleger os seus candidatos nas respetivas capitais estaduais, Goiânia e Curitiba, contra os preferidos do ex-presidente. .Entretanto, concorra quem concorrer contra Lula, enfrentará o atual presidente, que completou 79 anos no domingo eleitoral, com quase 81 em 2026. Por isso não é de excluir que Lula passe o bastão a alguém do seu campo. Mas quem? Um nome que emerge na esquerda é o de João Campos, reeleito com larga folga prefeito do Recife. Campos, meros 30 anos, é filho de Eduardo Campos, candidato presidencial que morreu na campanha de 2014 num acidente de avião, e filiado ao PSB, do vice Geraldo Alckmin..No polo ideológico oposto ao de Campos, as municipais lançaram nacionalmente Pablo Marçal, o ex-coach e novo político que, sem estrutura no minúsculo PRTB e correndo à margem do bolsonarismo oficial, quase chegou à segunda volta em São Paulo a reboque das redes sociais, noutro sintoma da fragmentação da direita. .Como a tão falada polarização nacional entre Lula e Bolsonaro, ilustrada pelo duelo presidencial taco a taco de 2022, sofreu um baque, mais uma liderança com eventual força nacional é Eduardo Paes (PSD), vencedor claro na corrida à prefeitura do Rio de Janeiro..O PSDB, que chegou, via Fernando Henrique Cardoso, ao Planalto por duas vezes, caiu de 520 para 272 prefeituras, nenhuma delas capital. Sob a presidência de Marconi Perillo, ex-governador de Goiás, ainda tentou adaptar-se aos novos tempos, lançando José Luiz Datena na eleição paulistana, mas o apresentador de programas de crime na TV obteve irrelevantes 1,84% dos votos. .Por outro lado, Fortaleza, no estado do Ceará, foi uma das votações mais acompanhadas na noite eleitoral. No terceiro município mais populoso do Brasil, só atrás de São Paulo e Rio (Brasília não tem eleição local), o PT, de Evandro Leitão, conquistou a sua única capital estadual em luta direta com o bolsonarista André Fernandes por meros 0,76% percentuais. O resultado fez de Ciro Gomes (PDT), antigo prefeito de Fortaleza, governador do Ceará e candidato presidencial, um dos grandes derrotados por ter apoiado José Sarto (PDT), que nem chegou à segunda volta..Ainda em Fortaleza, um detalhe curioso: na eleição de 2020, a estrela da campanha de Sarto foi a sua cadela, Marrion, batizada em homenagem à atriz Marion Cotillard, presente em inúmeros eventos. Em 2022, porém, Sarto separou-se da mulher, que levou Marrion, de quem é tutora, para eventos de campanha de Leitão – ou seja a cadela da raça Lulu da Pomerânia reelegeu-se. .VENCEDORES.-Tarcísio de Freitas (governador de São Paulo).-Eduardo Paes (prefeito reeleito do Rio de Janeiro).-João Campos (prefeito reeleito do Recife).-Gilberto Kassab (presidente do PSD, partido com mais prefeitos eleitos).-Ronaldo Caiado (governador de Goiás).-Ratinho Júnior (governador do Paraná).-Pablo Marçal (terceiro mais votado na municipal de São Paulo).-Marrion (cadela “reeleita” em Fortaleza).ASSIM-ASSIM.-Jair Bolsonaro (ex-presidente da República).DERROTADOS.-Lula da Silva (presidente da República).-Guilherme Boulos (candidato derrotado em São Paulo).-Marconi Perillo (presidente do PSDB, partido em perigo de extinção).-Ciro Gomes (ex-candidato presidencial).--