Lula da Silva. "Vou dedicar o resto da minha vida a este país"
Antigo presidente do Brasil diz que foi vítima "da maior mentira jurídica contada em 500 anos de história", pede ao povo brasileiro para "não seguir nenhuma indicação imbecil do presidente ou do ministro da saúde" na pandemia e deixa nas entrelinhas a vontade de concorrer às eleições de 2022
Lula da Silva deu sinais claros de que vai ser o candidato do Partido dos Trabalhadores (PT) à presidência da República do Brasil em 2022 mas não o confirmou palavra por palavra. Em comunicação ao país dois dias depois de um juiz do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, ter retirado as condenações de que foi alvo na Operação Lava Jato e no dia seguinte à suprema corte ter discutido a parcialidade do ex-juiz Sérgio Moro naqueles processos, o presidente brasileiro de 2003 a 2010 remeteu qualquer decisão para meio do próximo ano.
Relacionados
"Seria pequeno se eu tivesse pensando já em 2022, o partido vai pensar nisso só no meio do ano que vem, a minha cabeça não tem tempo, por agora, para pensar nisso: eu, o Fernando Haddad [plano B do partido nas eleições], a Gleisi Hoffmann [presidente do PT] e outras lideranças para já vamos discutir país, economia, vacina, auxílio emergencial ao povo", afirmou ao lado de apoiantes na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, perto de São Paulo.
Mas garantiu que quer voltar a andar pelo Brasil. "Eu quero voltar a andar por esse país e dedicar o resto da minha vida ao país, sinto-me jovem para brigar muito, desistir jamais, não existe essa palavra no meu dicionário, minha mãe dizia "lute sempre"".
Subscreva as newsletters Diário de Notícias e receba as informações em primeira mão.
"Não tenham medo de mim. Radical? Eu sou radical porque eu quero ir à raiz, quero um mundo mais justo, mais humano, quero um mundo em que não haja mais balas perdidas, em que cada um tenha a sua religiosidade, em que os LGBT tenham a vida que quiserem", prosseguiu.
Lula respondeu até a outros pré-candidatos, nomeadamente a Ciro Gomes, que disse saber que "Lula é inocente" mas não ter a certeza "de que Lula é honesto". "Ciro Gomes tem 64 anos, deve ter responsabilidade em vez de dizer coisas que ele dizia quando era menino", reagiu o antigo presidente, "se ele chegar aos 70 anos com essa ignorância, já não evolui, logo ele que se acha professor de Deus, se ele continuar assim perderá a confiança da esquerda e da direita e terá menos votos do que nas outras eleições".
Mas, depois de indiretas a Luciano Huck, ainda sem partido, e João Doria, do PSDB, os pré-candidatos de centro-direita, foi o presidente Jair Bolsonaro o maior alvo do seu discurso. "Não posso permitir que o Bolsonaro continue a criar as maldades que vai criando", começou.
"O governo é um verdadeiro desgoverno na saúde. O Brasil não merecia estar passando o que está passando. Para a semana vou tomar a minha vacina, não me interessa de que país é. Quero dizer ao povo brasileiro para não seguir nenhuma indicação imbecil do presidente ou do ministro da saúde, tome a vacina e continue em isolamento e usando máscara".
"O governo não é eleito para armar as pessoas, não são os fazendeiros que estão a precisar de armas para afastar os Sem Terra, não são os milicianos para matar meninos e meninas nas periferias, de armas precisa o exército, ele devia era ter feito gabinete de crise na pandemia e comprado vacinas de todos os lados mas o Brasil rejeitou comprá-las porque o presidente inventou uma tal de cloroquina, disse que era ex-atleta, chamou as pessoas de maricas, de cobardes".
O diagnóstico de Lula na economia também é de desorganização. "E o país é desorganizado porque não tem governo, o governo não cuida da economia, da saúde, da educação, do meio ambiente, da periferia, do jovem, do emprego, este país foi a sexta economia do mundo no nosso governo, era o país em que o povo mais tinha felicidade, respeitado por China, Rússia, pelos EUA, este país tinha um projeto de nação".
"Agora não tem governo, tem um fanfarrão como presidente que por não saber de nada diz "é tudo por conta do [ministro da economia] Paulo Guedes". Enquanto isso, o país está empobrecido, o PIB caiu, a massa salarial caiu, o comércio está enfraquecido, a produção de comida das pessoas está ficando insustentável. E o presidente não se preocupa com isso".
"Será que vamos ficar reféns do deus mercado? Fomos descobertos há 500 anos, quando vamos ser donos do nosso nariz? Quando é que eu vou acordar de manhã sem ter que pedir licença aos americanos para respirar?", concluiu.
As queixas à Lava Jato tomaram, entretanto, todo o início da comunicação do antigo sindicalista. "Por conta da operação Lava Jato, o Brasil deixou de ter investimento de 172 mil milhões de reais, por conta da Lava Jato, segundo estudo do Dieese [departamento intersindical de estatística], o país perdeu 4,4 milhões de empregos", disse, ainda se referindo à economia.
"Faz quase 3 anos que eu saí da sede deste sindicato para me entregar à Polícia Federal. Eu fui, obviamente, contra minha vontade porque sabia que estavam prendendo um inocente" afirmou. E, sem se deter, concluiu: "Fui vítima da maior mentira jurídica contada em 500 anos de história".
"[A sua mulher] Mariza Letícia morreu por causa disso, fui proibido de visitar o meu irmão, se há uma pessoa que tem razão para mágoas sou eu mas não tenho porque a dor que eu sinto não é nada perante a dor de quem não tem pão com manteiga, de manhã, feijão e farinha, ao almoço".
"Quanto a Deltan Dallagnol [chefe da task force de procuradores da Lava Jato] e Moro, eles estão sofrendo muito mais do que eu sofri porque eles sabem que eles cometeram um erro e eu sabia que eu não tinha cometido um erro", acrescentou.
"Não há espaço para guardar ódio, para perder tempo remoendo raiva, eu estou muito bem com a vida, a Lava Jato desapareceu da minha vida, a verdade venceu e continuará a vencer".