A sugestão de invocar a lei da insurreição para enviar tropas para mais cidades dos Estados Unidos é o mais recente capítulo de como Donald Trump está a testar os limites do poder e da lei. Ao ver os seus planos para enviar elementos da Guarda Nacional para Portland e Chicago contestados pelas autoridades estaduais e locais, bem como pelo poder judicial, o presidente norte-americano disse que o fará se a isso for obrigado pelas circunstâncias. “Se as pessoas estiverem a ser mortas, e os tribunais nos estiverem a atrasar, ou os governadores ou presidentes de Câmara nos estiverem a atrasar, temos de garantir que as nossas cidades estão seguras”, disse.Na semana passada, frente a uma audiência de militares de alta patente, Trump disse que as forças armadas deveriam dar prioridade às ameaças internas em vez das externas e concentrarem-se nas cidades para combater uma “guerra interna”. E foi mais além: “Deveríamos usar algumas destas cidades perigosas como campos de treino para as nossas forças militares.” Esta política é reprovada pela maioria dos norte-americanos: 58% contra, 42% a favor, segundo uma sondagem YouGov para a CBS News. Uma percentagem exatamente igual às taxas de reprovação e aprovação de Trump. Além de impopular e de ser contestada pelos democratas, deixa ex-militares preocupados. “Esta administração está a utilizar os militares para vigiar o povo americano, de forma particularmente direcionada, nomeadamente nas cidades governadas pelo Partido Democrata, assim como de forma predominante sobre pessoas negras”, disse o general na reserva Randy Manner, que foi vice-chefe da Guarda Nacional, ao The Washington Post.O uso de militares para combater o crime ou reprimir protestos através da lei da insurreição não é uma ideia nova para Trump. A sua equipa de campanha, quando faltava um ano para ser reeleito, já trabalhava na hipótese de usar a legislação de 1807 como uma prioridade. Segundo foi então noticiado, Trump, que se mostrou arrependido por não ter enviado tropas para as cidades onde decorreram os protestos mais violentos na sequência do assassínio de George Floyd por forças policiais, em 2020, afirmou que não hesitaria em fazê-lo no futuro.A lei da insurreição recebeu uma alteração em 1956 que permite ao presidente atuar de forma unilateral “sempre que o Presidente considerar que obstruções, combinações ou ajuntamentos ilegais ou rebelião contra a autoridade dos Estados Unidos tornam impraticável a aplicação das leis”. Esta lei foi invocada pela última vez em 1992, mas a pedido do governador da Califórnia, durante os motins em Los Angeles na sequência da absolvição de quatro polícias que haviam espancado Rodney King..EUA. O que levou a Guarda Nacional a ser destacada para Los Angeles?.Donald Trump já ordenou o envio de elementos da Guarda Nacional para Los Angeles, na Califórnia, e para a capital do país. No primeiro caso, o presidente respondeu às manifestações contra as operações policiais de fiscalização aos imigrantes, valendo-se de uma disposição legal sobre os serviços armados e que permite ao presidente mobilizar tropas federais em caso de “uma rebelião ou perigo de uma rebelião” contra o governo dos EUA. O caso de Washington, D.C. é particular, uma vez que esta cidade goza de um estatuto próprio, no qual os poderes federais se sobrepõem aos locais, pelo que o presidente pode agir sem quaisquer restrições. Além de Portland e de Chicago, a administração prepara o envio de militares para Memphis, no Tennessee, e Nova Orleães, Baton Rouge e Shreveport, no Louisiana, mas nestes estados de forma concertada com os governadores republicanos. Além disso, também disse que poderia deslocar tropas para Nova Iorque, Baltimore e São Francisco. Procuradora-geral recusa dar explicações Durante uma tensa audição na Comissão de Justiça do Senado, a procuradora-geral Pam Bondi recusou-se a informar se discutiu com Trump as questões legais levantadas sobre o uso da Guarda Nacional. “Não vou discutir quaisquer conversas internas com a Casa Branca.” O senador Dick Durbin, de Ilinóis, denunciou o “segredo” da razão do destacamento de tropas, ao que Bondi respondeu: “Gostaria que amasse Chicago tanto quanto odeia o presidente.” O senador republicano da Carolina do Norte Thom Tillis também questionou a lógica de usar tropas para combater o crime.