Kiev propõe trégua parcial em troca de informações dos EUA
A Ucrânia apresenta esta terça-feira aos EUA uma proposta de cessar-fogo por ar e mar, à imagem do que tinha sido sugerido pelo presidente francês no início do mês, como forma de demonstrar que quer restabelecer as relações com os norte-americanos depois da desastrosa receção a Volodymyr Zelensky na Casa Branca. O secretário de Estado norte-americano congratulou-se com a ideia “promissora”, ao chegar a Jidá, Arábia Saudita, para se reunir hoje com altos dirigentes ucranianos. Na véspera, Zelensky - que no início do mês rejeitara a ideia que agora apresenta - reuniu-se na mesma cidade com o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman.
Um responsável ucraniano, sob anonimato, disse à AFP que a proposta para uma trégua centrada no ar e no mar se deve ao facto de serem as “opções de cessar-fogo que são fáceis de pôr em prática e controlar, e é possível começar com elas”. Horas depois, o conselheiro da chefia do gabinete presidencial, Serhiy Leshchenko, explicou na TV que uma trégua total está fora de questão: “A Ucrânia não vai concordar com isso, porque isso iria simplesmente dar a Putin alguns meses para tratar os seus feridos, recrutar infantaria da Coreia do Norte e recomeçar a guerra.” Já ao Financial Times, fontes próximas das negociações na Arábia Saudita esperam que a Ucrânia proponha um cessar-fogo parcial na esperança de convencer Washington a reverter a sua decisão de congelar a ajuda militar e a partilha de informações.
O presidente dos EUA tem dito uma e outra vez que a Ucrânia “não tem cartas” para negociar e depois do “grande momento de televisão” - como Donald Trump se referiu ao tratamento dado ao líder ucraniano na Sala Oval - suspendeu a assistência militar e a partilha de informações militares. A deputada Yulia Sirko-Klymenko explicou à Sky News o que está em jogo: “Podemos sobreviver sem armas norte-americanas durante algum tempo, mas não podemos sobreviver sem informações; precisamos delas para a defesa aérea. É sobretudo para proteger os civis e não para as linhas da frente. Esperamos recuperá-las na próxima semana e este será um dos principais pontos de discussão na Arábia Saudita.” À mesma estação televisiva uma fonte ucraniana disse que o seu país continuou a receber informações, mas que os EUA deixaram de alertar sobre os ataques russos de mísseis em preparação.
Pouco antes, o enviado especial norte-americano Steve Witkoff havia afirmado que o seu país “nunca cortou informações relativas a quaisquer necessidades defensivas da Ucrânia”. O referido enviado - empresário do imobiliário de luxo e parceiro de Trump nas partidas de golfe - disse à Fox News que Zelensky enviou uma carta ao presidente dos EUA a pedir desculpa “pelo incidente havido na Sala Oval”.
Keir Starmer voltou a falar com Trump, desta feita para discutir as conversações sobre a Ucrânia na Arábia Saudita, e abordou a questão da assistência norte-americana a Kiev. “O primeiro-ministro disse [a Trump] que está confiante de que um bom resultado das conversações permitirá retomar a ajuda e os serviços de informações dos EUA à Ucrânia”, disse um porta-voz de Downing Street. Também o secretário de Estado Marco Rubio, durante a viagem para Jidá, mostrou abertura ao restabelecimento do nível das relações com Kiev: “Penso que toda a noção de pausa na ajuda, em termos gerais, é algo que espero que possamos resolver... o que acontecer amanhã [hoje] será fundamental para isso.”
"O mais importante é que a Ucrânia esteja preparada para fazer coisas difíceis, tal como os russos terão de fazer coisas difíceis para pôr fim a este conflito."
Marco Rubio
As movimentações diplomáticas e militares também tomam lugar esta terça e quarta-feira em Paris. Chefias militares de mais de 30 países, incluindo da Ásia e da Oceânia participam numa reunião para discutir a criação de uma força internacional a destacar para a Ucrânia, em resultado de uma proposta franco-britânica. Na quarta-feira, é a vez de os ministros da Defesa de França, Alemanha, Reino Unido e Polónia se reunirem para “coordenarem-se no apoio a Kiev”.
No terreno, as tropas russas tomaram uma localidade na região norte de Sumy, o que acontece pela primeira vez desde 2022. O comandante ucraniano Oleksandr Sykyrsky garantiu que a situação na fronteira Sumy-Kursk está controlada e que as tropas presentes em Kursk não correm risco de serem cercadas. Kiev disse ainda ter atingido duas refinarias, uma na região de Samara e outra em Ryazan.
Moscovo acusa Londres
Dois diplomatas britânicos receberam ordem de expulsão da Federação Russa, anunciou o serviço de segurança FSB. Moscovo acusou os indivíduos em questão de terem prestado informações falsas à entrada do país e que são suspeitos de exercerem atividades de espionagem. Em paralelo, o Serviço de Informações Externas (SVR) russo acusou o Reino Unido de ser o “principal instigador de um conflito global, tal como fez nas vésperas das duas Guerras Mundiais” e afirmou que Londres vê uma ameaça aos seus interesses” se os EUA e a Rússia restabelecerem relações.
Kiev n.º 1 a importar armas
A Ucrânia tornou-se no principal destino oficial de armas no período 2020-2024, ou 8,8% do total das importações, com um aumento de 9.627% face ao período 2015-2019, revela a base de dados do Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo (SIPRI). Os EUA reforçaram a liderança nas exportações, tendo passado de 35% para 43% no total do mercado. A Rússia, até agora o segundo maior exportador, viu o negócio cair 64%, e foi ultrapassada pela França.
Tusk apela a Musk e Rubio
O primeiro-ministro polaco apelou nas redes sociais aos seus “amigos” para não serem arrogantes. Um dia depois de os chefes da diplomacia de Varsóvia e Washington e de o multimilionário Elon Musk trocarem azedas mensagens sobre a hipótese de o serviço de internet Starlink (da Space X de Musk) ser suspenso na Ucrânia, Donald Tusk disse que “a verdadeira liderança significa respeitar os parceiros e aliados” e “nunca a arrogância”. Musk classificou o ministro Radoslaw Sikorski de “pequeno homem” e disse que este deveria “calar-se”. Já o secretário Marco Rubio disse que o homólogo polaco estava a mentir quando mencionou a hipótese de o Starlink deixar de funcionar na Ucrânia.