A crise orçamental e política em França, que se agravou ontem com a queda do governo de Michel Barnier, tem levado os mercados internacionais a penalizar as ações das empresas francesas e, sobretudo, a dívida francesa, mas não se vê pânico, considerou ao DN o analista financeiro Filipe Garcia..“De facto, o mercado está preocupado com o tema. Há um efeito França indiscutível, mas não há pânico. Porquê? Porque não há sinais de contágio a outros países”, disse Filipe Garcia. Nos dias que antecederam a decisão de ontem, o prémio que os investidores exigiam pela dívida francesa a 10 anos chegou a ser de 90 pontos base face à dívida alemã com o mesmo prazo. .Não é coisa pouca. Trata-se de um máximo histórico deste diferencial - que, na prática, mede o risco da dívida de um país - desde meados de 2012, em plena crise das dívidas soberanas. E trata-se do dobro do spread da dívida portuguesa na tarde de ontem, que era de 45 pontos base. À mesma hora, o risco de França era de 88 pontos base..Como se chegou até aqui? O governo de Michel Barnier, que assumiu como prioridade a redução do défice orçamental de França (as projeções para o fecho de 2024 são de 6,1%), propôs para 2025 um corte de 40 mil milhões de euros na despesa e um aumento de impostos no valor de 20 mil milhões. O objetivo seria o de descer o défice para os 5%, ainda assim acima dos 3% impostos pelas regras europeias (a Comissão já acionou um procedimento por défice excessivo contra a França). A proposta chocou de frente com os partidos da oposição em França..Apesar do impacto dos mercados, há poucas semelhanças com as crises que afetaram Portugal, Grécia, Espanha ou Irlanda há uma década. A França continua a ter uma forte capacidade de se financiar no mercado, tendo recentemente -segundo o jornal online Politico - conseguido ir buscar 8,3 mil milhões aos mercados, com taxas de juro relativamente baixas. E o mercado de capitais francês há meses que já estava com performances mais fracas que os índices homólogos. O euro depreciou-se, mas sem os grandes sobressaltos de dívidas anteriores. .“Isto significa que os mercados não estão a sentir receio de contágio. Não há pânico, porque só um país está a alargar” [face à dívida da Alemanha], completa Filipe Garcia..Então para onde estão a olhar os mercados? “Se o governo não caísse todos iriam gostar, porque seria um aval a políticas de contenção orçamental. Mas caindo, vão olhar para uma posição assertiva do [presidente] Macron após a queda”, salienta o analista, recordando ainda que a presidente do BCE, Christine Lagarde, também falou sobre o assunto e isso deu outro sinal ao mercado..“A presidente do BCE disse, em traços gerais, que a estabilidade francesa também contribui para a estabilidade de preços. Ou seja, abriu caminho à interpretação: se for preciso o BCE intervir, intervém”. No caso de França, isso remete-nos para a frase história de Mario Draghi: “whatever it takes” (faremos tudo o que for preciso).