Indígenas acusam Bolsonaro de genocídio no Tribunal Penal Internacional
Foi solicitada uma investigação por "crimes contra a humanidade (extermínio, perseguição e outros atos desumanos) e genocídio (severos danos físicos e mentais e condições infligidas deliberadamente visando a destruição dos povos indígenas)".
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) acusou esta segunda-feira o governo de Jair Bolsonaro de genocídio da população nativa no Tribunal Penal Internacional (TPI), sediado em Haia, nos Países Baixos.
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Com foco na gestão da pandemia de covid-19, que já matou mais de mil indígenas de 163 povos no Brasil, a Apib pediu à procuradoria do TPI que examine os alegados crimes praticados contra os povos indígenas pelo presidente Jair Bolsonaro desde o início do seu mandato, em janeiro de 2019.
Com base em artigos do Estatuto de Roma, a Apib solicitou uma investigação por "crimes contra a humanidade (extermínio, perseguição e outros atos desumanos) e genocídio (severos danos físicos e mentais e condições infligidas deliberadamente visando a destruição dos povos indígenas)", segundo um comunicado divulgado pela organização de referência do movimento indígena do Brasil.
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"Acreditamos que estão em curso no Brasil atos que se configuram como crimes contra a humanidade, genocídio e ecocídio. Dada a incapacidade do atual sistema de justiça no Brasil de investigar, processar e julgar essas condutas, denunciamos esses atos junto à comunidade internacional, mobilizando o Tribunal Penal Internacional", indicou o coordenador jurídico da Apib, Eloy Terena, um dos oito advogados indígenas que assinam a denúncia.
A organização sustentou a acusação de genocídio argumentando que existe uma política anti-indígena sistemática e intencional promovida por Bolsonaro, que causa severos danos físicos e mentais e procura sujeitar os povos nativos a "condições tais que podem gerar a sua destruição, seja pela desassistência de saúde, insegurança alimentar, contaminação por covid-19 ou por metais devido à expansão do garimpo ilegal e da invasão de terras".
O documento entregue ao TPI hoje - Dia Internacional dos Povos Indígenas - é composto por denúncias de lideranças e organizações indígenas, documentos oficiais, investigações académicas e notas técnicas, que comprovam o alegado planeamento e execução de uma "política anti-indígena explícita, sistemática e intencional" liderada por Jair Bolsonaro.
De acordo a acusação, "o desmantelamento das estruturas públicas de proteção socioambiental e aos povos indígenas desencadeou invasões nas Terras Indígenas, desflorestação e incêndios nos biomas brasileiros, aumento do garimpo e da mineração nos territórios" nativos.
Para a Apib, os ataques aos povos originários foram incentivados por Bolsonaro em muitos momentos ao longo da sua gestão, como a explícita recusa em demarcar novas terras ou projetos de lei, decretos e portarias que tentam legalizar as atividades invasoras, o que acabou por estimular conflitos nessas regiões.
"Lutamos todos os dias, há centenas de anos, para garantir a nossa existência e hoje a nossa luta por direitos é global. (...) Jamais nos calaremos diante das violências que estamos sofrendo. Enviamos esse comunicado ao TPI porque não podemos deixar de denunciar essa política anti-indígena de Bolsonaro. Ele precisa pagar por toda violência e destruição que está cometendo", frisou a coordenadora executiva da Apib, Sonia Guajajara.
O documento também acusa Bolsonaro de uma série de ações e omissões na gestão do meio ambiente.
Ambientalistas acreditam que uma das melhores formas de preservar as áreas isoladas da floresta amazónica é reconhecê-las oficialmente como terras indígenas, onde qualquer mineração ou lavoura não tradicional é proibida.
Mas o reconhecimento desses territórios reservados aos indígenas estagnou desde a chegada ao poder de Jair Bolsonaro, que garantiu durante a sua campanha eleitoral que não daria "nem mais um centímetro" de terra aos indígenas.
Para que uma investigação formal seja aberta, a procuradoria do TPI, criado em 2002 para julgar as piores atrocidades cometidas no mundo, precisa de concluir que tem o mandato para tal e que a denúncia é sólida o suficiente para justificar o inquérito.