Mick Meaney fez manchetes por todo o mundo ao bater, em 1968, um recorde mundial inusitado: maior tempo de permanência enterrado vivo num caixão. Numa altura em que atravessava dificuldades financeiras, este operário irlandês acreditava que, se permanecesse debaixo da terra num caixão durante mais tempo do que qualquer outra pessoa, o mundo se lembraria do seu nome. A 21 de fevereiro desse ano, curiosos e equipas de reportagem seguiram o seu caixão, com 1,90 m de comprimento e 76 cm de largura e forrado com espuma, em procissão pelas ruas de Kilburn, o coração da comunidade de imigrantes irlandeses em Londres, enquanto Meaney era enterrado numa vala num estaleiro de construção.O caixão foi sepultado na terra, apenas com um tubo para a entrada de ar e por onde se desciam alimentos e líquidos.Meaney concretizou o objetivo de bater o recorde mundial e conquistar fama, mas também acreditava que esse feito lhe pudesse render dinheiro, o que não se concretizou.A proeza e as suas comoventes consequências vão ser agora contadas num documentário que será exibido no canal de televisão em língua irlandesa TG4 a 26 de novembro. Intitulado Beo Faoin bhFód (Enterrado Vivo), o filme já foi exibido em festivais. Realizado por Daire Collins, concilia entrevistas a familiares e amigos de Meaney com imagens de arquivo.“O meu pai era um orgulhoso homem de Tipperary. Era mais um irlandês, aqueles que hoje são chamados de irlandeses esquecidos, que lá trabalhavam com picareta e pá e enviavam o dinheiro para as suas famílias. Os tempos eram difíceis naquela época", afirmou a filha de Mick Meaney, Mary, no documentário.Meaney, um robusto homem que sonhava ser campeão de boxe, acabou a escavar túneis em Londres após sofrer um acidente que o deixou debaixo de escombros. Antes dele, o recorde permanecia a um norte-americano, um texano chamado Bill White, que esteve enterrado vivo durante 55 dias.Para bater esse recorde, Meaney, então com 33 anos, contou com a ajuda de Michael "Butty" Sugrue, um artista de circo que se tornou proprietário de um bar e empresário na comunidade irlandesa de Londres. Um camião transportou o caixão até um terreno pertencente a um empreiteiro, Mick Keane, que cedeu parte do local para a proeza. Um alçapão que dava acesso a uma cavidade debaixo do caixão, ligeiramente maior que um caixão comum, servia de casa de banho."Dormi muito bem ontem à noite", disse Meaney, através de um telefone instalado dentro do caixão, a um apresentador de um telejornal no seu segundo dia enterrado. No subsolo, estabeleceu uma rotina: acordar às 7h, fazer exercício compatível com o confinamento, aplicar pomada no corpo, comer, ler livros e jornais e falar com pessoas ao telefone.O interesse pelo desafio de Meaney foi desvanecendo com o passar das semanas, numa altura em que a guerra do Vietname e o assassinato de Martin Luther King dominavam as atenções. O caixão foi desenterrado e transportado em cima de um camião passados 61 dias, a 22 de abril, tendo passado por multidões em festa até chegar a um pub. Quando a tampa foi retirada, Meaney, com óculos escuros para proteger os olhos e a barba, sorriu. "Gostaria de continuar por mais cem dias. Estou encantado por ser o campeão do mundo", disse à empresa.Meaney julgava que após sair do caixão iria em digressão mundial e teria um patrocínio da Gillette, mas tal nunca se concretizou. "Em todas as áreas da vida, há pessoas que simplesmente te usam como vampiro", afirmou Mary Meaney, contando que o pai voltou à Irlanda "sem sequer o valor de uma garrafa de leite no bolso".Como se não bastasse, nenhum representante do livro dos recordes do Guinness registou o feito de Meaney. E, também em 1968, uma ex-freira chamada Emma Smith deixou-se enterrar debaixo de um parque de diversões em Skegness durante 101 dias.