A ideia de Downing Street era cortar o mal pela raiz, mas na realidade o gabinete do primeiro-ministro britânico acabou por criar o problema. Keir Starmer teve esta quarta-feira (12 de novembro) que defender-se (e ao seu Executivo) depois de vir a público que haveria uma alegada revolta interna no Governo e no Partido Trabalhista contra a sua liderança, numa altura em que nada parece correr-lhe bem. “Nunca autorizei ataques a membros do Governo”, disse ontem Starmer na sessão semanal de perguntas e respostas no Parlamento. Em causa estão os briefings que alegados membros da sua equipa terão feito a dizer que o primeiro-ministro iria lutar contra qualquer tentativa de o afastar da liderança. A líder da oposição, Kemi Badenoch, falou numa “guerra civil” dentro do Executivo, alegando que Starmer “perdeu o controlo do seu Governo”. Questionado sobre se mantinha a sua confiança no seu chefe de gabinete, Morgan McSweeney, Starmer fugiu à resposta. Mas o seu porta-voz disse mais tarde que o primeiro-ministro tinha confiança total nele, alegando que o briefing polémico terá partido de “aliados” e “apoiantes”, não de ninguém dentro de Downing Street.Vários media britânicos indicaram, na terça-feira (11 de novembro), que haveria uma operação para proteger o primeiro-ministro de uma corrida à liderança - que poderia aparecer depois das eleições locais de maio ou já depois de ser apresentado o Orçamento, a 26 de novembro. Nesta ocasião, a ministra das Finanças britânica, Rachel Reeves, deverá quebrar uma promessa de campanha e anunciar um aumento de impostos para fazer face ao buraco de cerca de 20 mil milhões de libras (22,6 mil milhões de euros) nas contas públicas. A revolta teria um rosto: o ministro da Saúde, Wes Streeting, que é popular dentro do partido. Esta quarta-feira (12 de novembro), num périplo pelos vários programas da manhã de rádio e televisão, o ministro negou tudo e apontou o dedo à “cultura tóxica” em Downing Street - instando Starmer a demitir os responsáveis. E mostrou-se irritado com a situação, dizendo que a polémica só distrai da mensagem que o Governo quer passar de tudo aquilo que está a fazer. Streeting já disse publicamente que gostaria um dia de liderar o partido e o Governo, mas aos 42 anos não parece ter pressa. “Eu apoio o primeiro-ministro, apoio-o desde que foi eleito líder do Partido Trabalhista”, disse Streeting na Sky News. “Não votei nele na eleição para a liderança, mas apoiei-o desde o momento em que foi eleito e apoiei-o em todos os momentos, incluindo quando fez coisas que ninguém achava possíveis”, insistiu, negando qualquer tentativa de o derrubar - brincando até que também não teve nada a ver com o assassinato do então presidente John F. Kennedy e que acredita que os EUA foram mesmo à Lua.A facilidade de comunicação de Streeting é uma das mais valias apresentada em relação a Starmer, que muitas vezes parece quase robótico. Se o objetivo de o culpar por uma eventual revolta era destruí-lo, isso parece não ter resultado. Depois de ter ganho uma maioria histórica em junho de 2024, Starmer é hoje um primeiro-ministro impopular. Uma sondagem YouGov de 3 de novembro mostra que 73% dos inquiridos acham que está a fazer um mau trabalho à frente do Governo, com apenas 17% a considerar que está a fazer um bom trabalho. Se as eleições fossem hoje, o Reform UK de Nigel Farage teria 27% dos votos, com trabalhistas e conservadores a não ir além dos 18%. .Farage galga a onda da imigração e deixa trabalhistas britânicos em mínimos.Os problemas económicos são uma das razões para a impopularidade de Starmer, com a inflação acima do previsto (3,8% no último ano). Mas também não ajudam as questões da imigração - com número recorde de pessoas a cruzar ilegalmente o Canal da Mancha. O acordo com França, de entregar um ilegal e receber um legal, não está a ser suficiente para travar a situação, com registo de pelo menos dois migrantes expulsos que voltaram dias depois. Outro problema recente tem a ver com as prisões e com o número de presos libertados indevidamente - um deles um imigrante ilegal que foi condenado por abuso sexual e libertado quando devia ter sido deportado. Houve uma caça ao homem para o recapturar, apenas para se descobrir que não é caso único.