Hamas anuncia morte de refém português e confirma o maior medo da sua mulher, Nira
Um dos reféns do Hamas com nacionalidade portuguesa, Yossi Sharabi, foi esta segunda-feira dado como morto pelo grupo terrorista palestiniano, que alega num vídeo que ele terá sido vítima de um bombardeamento das Forças de Defesa de Israel. Um segundo refém, Itai Svirsky, que figurava num primeiro vídeo divulgado no domingo, terá morrido noutro ataque aéreo, de acordo com a mesma fonte. Israel não confirmou as mortes, tendo o ministro da Defesa, Yoav Gallant, acusado o Hamas de “abuso psicológico” das famílias.
Nira Sharabi, mulher de Yossi, esteve em Lisboa no início de dezembro, para pedir ao governo português que fizesse mais para ajudar a libertar o marido, de 53 anos, que tinha sido levado da casa da família no kibutz Be’eri, um dos atacados pelo Hamas a 7 de outubro. Ela e as três filhas, Yuval (17 anos), Ofir (14) e Yuval (13) foram deixadas para trás, sendo que o namorado da filha mais velha foi também raptado. Libertado na troca de reféns do final de novembro, disse que tinha visto Yossi na Faixa de Gaza.
“Ele estava vivo na altura, agora não sei. Fisicamente estava bem, mentalmente é outra história. Mas tenho muito medo de que possa não voltar”, contou Nira ao DN, numa entrevista na sua passagem por Lisboa, onde também apelava à libertação do cunhado, Eli Sharabi, cuja família está entre os cerca de 1200 mortos do dia do ataque. Nos 100 dias de guerra, Nira recebeu a notícia que não queria.
(Leonardo Negrão / Global Imagens)
Um vídeo divulgado no domingo, de 37 segundos, mostrava Yossi visivelmente mais magro. Ele dizia o nome, a idade, e acrescentava: “Devemos parar a guerra agora.” No vídeo, sem data, surgiam também outros dois reféns, Itai Svirsky, de 38 anos, e Noa Argamani, de 26, dizendo-se que seria revelado “o seu destino” no dia seguinte. O segundo vídeo chegou ontem, durante a tarde. A narradora é Noa, que revela a morte dos outros dois, sendo mostradas imagens dos alegados corpos, de acordo com o jornal Jerusalem Post.
“Eu estava num edifício. Foi bombardeado por um ataque aéreo das IDF [a sigla, em inglês, para as Forças de Defesa de Israel], um caça F16. Foram disparados três rockets. Dois deles explodiram, o outro não”, conta Noa, explicando que ela e os dois outros reféns estavam com homens da Brigada Ezzedine Al-Qassam (o braço militar do Hamas). “Depois de o edifício em que estávamos ter sido atingido, ficámos soterrados sob os escombros. Os soldados da Al-Qassam salvaram a minha vida e a do Itai, infelizmente, não conseguimos salvar a do Yossi”, refere, explicando que Itai acabaria também por morrer noutro bombardeamento quando estava a ser transferido para outro local, duas noites mais tarde.
O porta-voz das IDF, Daniel Hagari, acusa o Hamas de mentir. “O Itai não foi morto pelas nossas forças. Isto é uma mentira do Hamas. O edifício onde estavam não foi alvo de ataques nem foi bombardeado pelas nossas forças”, indicou. “Não sabíamos em tempo real o paradeiro dos sequestradores. Não atacamos nenhum local onde sabemos que há reféns”, explicou, admitindo contudo que bombardearam perto do sítio onde eles estiveram. “Estamos a investigar o incidente e as circunstâncias e a examinar as fotos publicadas pelo Hamas juntamente com outras informações que temos”, acrescentou. As IDF mataram a tiro, por engano, três reféns com bandeias brancas em Gaza, confundindo-os com terroristas.
Israel considera os vídeos dos reféns “guerra psicológica”, tendo o ministro da Defesa acusado o Hamas de “abuso psicológico” das famílias. Hagari contou que as famílias dos dois reféns foram informadas há dias de que havia preocupação com a sua situação, mas ainda não confirmou as mortes.
Em Lisboa, a mulher de Yossi tinha contado que, no dia em que a vida de todos mudou, ofereceu cadernos a cada uma das filhas para elas poderem escrever como foi o seu dia, para que o pai pudesse ler quando voltasse. “Anotamos cada momento que passamos sem ele, porque todas as coisas pequenas parecem agora tão importantes”, explicou então entre lágrimas. Na altura Yossi tinha sido raptado há 60 dias e ela temia que o caderno não chegasse até ele ser libertado. Agora há a possibilidade que nunca os venha a ler.
Ataque com carro
O anúncio da alegada morte dos dois reféns surge no dia em que o Hamas reivindicou um ataque em Ra’anana, nos subúrbios de Telavive. Pelo menos uma mulher de 70 anos morreu e 12 pessoas ficaram feridas, entre as quais um homem de 66 anos que foi esfaqueado, depois dos suspeitos lançarem os carros (usaram três, pelo menos um deles roubado) contra os transeuntes em várias ruas.
Os dois suspeitos, que serão familiares, foram detidos, não sendo conhecidos os pormenores. São de Hebron, na Cisjordânia ocupada, tendo entrado ilegalmente em Israel. O governo israelita respondeu ao ataque de 7 de outubro levando a guerra para a Faixa de Gaza, que é controlada pelo Hamas e onde já terão morrido mais de 24 mil pessoas segundo as autoridades locais. Mas a tensão também aumentou na Cisjordânia ocupada, com mais de 350 palestinianos mortos pelas forças israelitas em raides contra alegados militantes e também às mãos dos colonos israelitas.
susana.f.salvador@dn.pt