Dois meses depois de ter liderado um motim que ficou a 200 quilómetros de Moscovo, o líder do Grupo Wagner, Yevgeny Prigozhin, morreu ontem na queda de um avião privado nos arredores da capital russa. A bordo seguiam também mais seis passageiros, entre eles o comandante dos mercenários Dmitry Utkin, e três tripulantes. Não houve sobreviventes. A Rússia está a investigar o incidente a envolver aquele que foi o maior aliado do presidente Vladimir Putin e se tornou num dos seus maiores inimigos..Um canal de Telegram ligado aos mercenários, o Grey Zone, confirmava a morte de Prigozhin, de 62 anos, que apelidava de "herói" e "verdadeiro patriota". Dizia que o líder do Grupo Wagner tinha morrido "em consequências das ações de traidores da Rússia", sem dar mais explicações, acrescentando apenas: "Mas mesmo no inferno, ele será o melhor!" Ontem à noite ainda não se sabia a causa do acidente, mas um vídeo partilhado nas redes sociais mostrava um avião em queda a pique, deixando para trás um rasto de fumo. Só oito dos dez corpos tinham sido resgatados (mas não identificados)..Putin estava num evento na região de Kursk, para assinalar os 80 anos de uma das mais importantes batalhas da II Guerra Mundial entre os soviéticos e os nazis, quando o avião caiu. A presença de Prigozhin a bordo foi confirmada pela agência de aviação russa, que inicialmente tinha informado que ele estava na lista de passageiros..Os ucranianos, tal como o Grupo Wagner, não hesitaram em apontar o dedo a Moscovo. "A eliminação demonstrativa de Prigozhin e do comando Wagner, dois meses após a tentativa de golpe, é um sinal de Putin às elites russas antes das eleições de 2024. "Cuidado! Deslealdade é igual a morte"", escreveu no Twitter (rebatizado X) Mykhailo Podolyak, conselheiro do presidente ucraniano Volodymyr Zelensky. Falando antes da confirmação oficial da morte, uma porta-voz do Conselho de Segurança Nacional dos EUA, Adrienne Watson, disse que "ninguém deve ficar surpreendido", caso esta se confirmasse. "Não sei o que aconteceu, mas não me surpreende", disse o próprio presidente norte-americano, Joe Biden..O avião privado (um Embraer 135) fazia a ligação entre Moscovo e São Petersburgo, a base de Prigozhin, quando caiu a oeste de Moscovo, na região de Tver. O líder do Grupo Wagner, que no início da semana tinha revelado um vídeo a dizer que estava em África, teria regressado à Rússia ontem..Depois da rebelião falhada, Prigozhin teria chegado a acordo com Putin - que o chegou a apelidar de traidor - para um exílio na Bielorrússia junto com os seus homens que não queriam passar para os quadros do Exército russo. Mas Prigozhin não ficou muito tempo no país de Alexander Lukashenko, havendo notícia de constantes viagens entre Moscovo e São Petersburgo. Após sair da Ucrânia, onde os seus homens desempenharam um papel essencial na conquista de Bakhmut (uma das batalhas mais longas da guerra) e antes disso Soledar, queria concentrar esforços em África..A morte de Prigozhin surge na véspera da Ucrânia celebrar o Dia da Independência, uma data que coincide com os 18 meses da invasão russa. Para assinalar a data, os destroços de veículos blindados russos estão expostos na avenida central de Kiev, para mostrar as perdas de Moscovo, mas na frente a contraofensiva ucraniana avança a passo lento. O chefe da diplomacia ucraniano, Dmitro Kuleba, disse à AFP que a determinação da Ucrânia permanece intacta "não importa quanto tempo leve" para vencer..À espera dos caças F-16 fornecidos pelos aliados, que só devem chegar no próximo ano, a Ucrânia angariou tanques, armas, munições e apoios tendo em vista uma contraofensiva da primavera que arrancou finalmente em junho e até agora ficou aquém do desejado. Entretanto, as forças de Moscovo foram reforçando as suas defesas, incluindo com campos de minas, tornando os avanços ucranianos mais difíceis. O que tem parecido fácil é o uso de drones, quer aéreos quer marinhos, para atingir alvos russos, incluindo na capital..Não existe um balanço oficial de baixas militares, com Kiev e Moscovo a optarem pelo silêncio. Contudo, segundo as autoridades norte-americanas, este número estará próximo do meio milhão - entre mortos e feridos de ambos os lados. Segundo o New York Times, estima-se que já tenham morrido 70 mil militares ucranianos e 120 mil militares russos, sendo que há mais forças de Moscovo no terreno. Em entrevista à RTP, o ministro da Defesa ucraniano, Oleksii Reznikov, rejeitou contudo o número de baixas do seu país, dizendo ser muito menor do que o referido..susana.f.salvador@dn.pt