Os eleitores da Extremadura vão às urnas no domingo (21 de dezembro), mas a grande dúvida não é saber quem vai ganhar - todas as sondagens apontam para a vitória da atual presidente da Junta, María Guardiola, do Partido Popular (PP). A questão é qual será o resultado da extrema-direita. “A chave está no número final de lugares que o Vox conquistar. Essa é a chave para as eleições de 21 de dezembro”, disse ao DN o jornalista da TVE da delegação regional, Antonio Hidalgo. A Extremadura era historicamente socialista, com o PSOE a governar de forma contínua desde 1983 até 2023 - a exceção foi entre 2011 e 2015. Nas últimas eleições, voltaram a ser os mais votados, mas empataram em número de deputados regionais com os populares - 28 cada um. Depois de inicialmente ter rejeitado uma aliança com o Vox - que elegeu cinco representantes, mais um do que a aliança Unidas pela Extremadura (Podemos, Esquerda Unida e Verdes) -, María Guardiola acabou por recuar. E aceitou fazer uma coligação com a extrema-direita. Mas a aliança entrou em rutura por questões nacionais. O bloqueio institucional, que impediu a aprovação do orçamento, e o desejo de conseguir uma maioria absoluta para poder governar sozinha (sem estar dependente do humor do Vox), levou a presidente da Junta a antecipar as eleições na Extremadura. Mas pode ter sido em vão. As sondagens dão a vitória ao PP, mas María Guardiola ficará aquém da maioria absoluta de 33 deputados. Conseguirá melhorar o resultado, elegendo 29 representantes para a Assembleia, mas dependerá na mesma do Vox, que deve melhorar o seu resultado e conseguir eleger nove. O PSOE perderia seis eleitos, caindo para os 22 deputados (o pior resultado de sempre), enquanto a Unidas pela Extremadura deve chegar aos cinco. “A chave do governo estará com o Vox, que dependendo da sua força no Parlamento poderá fazer novas exigências a María Guardiola”, disse Antonio Hidalgo, lembrando contudo que basta uma maioria simples para eleger a presidente da Junta numa segunda volta, e pode dar-se o caso dos socialistas se absterem para o permitir. “É uma possibilidade aritmética, mas tudo dependerá do diálogo feito depois das eleições”, acrescentou.Mas o que é que explica esta viragem à direita e à extrema-direita? O professor catedrático de Literatura da Universidade de Évora, Antonio Sáez Delgado, diz que há duas situações que convergem. “Uma primeira tem a ver com os grandes ciclos políticos à escala global”, explicou ao DN, dizendo que “é evidente que estamos num desses ciclos, que cria uma espécie de onda social ou de clima social contra o qual é difícil agir”. Depois, há uma dimensão mais regional, em que governos prolongados de uma mesma força política dão sinais de “desgaste”. Já o jornalista Antonio Hidalgo admite que “não é fácil responder à pergunta”.Apesar de ser uma das maiores regiões autónomas de Espanha (42 mil quilómetros quadrados, equivalente a 8% do território do país), a Extremadura é uma das menos povoadas, com pouco mais de um milhão de habitantes (890.967 são eleitores). “Temos o mesmo tamanho dos Países Baixos, mas eles têm 17 milhões de habitantes”, explica Hidalgo, falando da chamada “Espanha vazia”. A sociedade é rural - Badajoz é a maior cidade e só tem 156 mil habitantes - e há “um sentimento de orfandade produzido pela sensação de que há uma classe média rural que sente que está a perder o sentimento de classe média”, indicou Antonio Hidalgo. A culpa é, em parte, da União Europeia, com muitos a sentirem-se “abandonados” pela política agrária, queixando-se de que cada vez têm menos ajudas de Bruxelas e de que as exigências feitas à produção nos 27 não são as mesmas feitas aos produtos importados de fora. O Vox consegue chegar a esse eleitorado, com a sua oposição à Agenda 2030. Além disso, os eleitores “acham que a Europa se preocupa mais com a natureza, com a fauna, com a flora, do que com as pessoas”, explicou o jornalista, dando o exemplo de que apanhar uma pinha com pinhões que caiu ao chão em espaço protegido pode dar multa. E depois há a imigração. Tradicionalmente terra de emigrantes, a Extremadura é uma das comunidades que mais população perdeu nos últimos 50 anos (menos 9,9% entre 1971 e 2025), o que contribuiu para o envelhecimento. É também uma região que não atrai migrantes (4,1% dos habitantes são estrangeiros, sendo a média nacional 13,4%).“Mas a perceção geral é que a assistência social é mais dirigida aos imigrantes subsarianos ou de Marrocos do que às classes mais pobres da Extremadura”, disse Hidalgo. Outra queixa que encontra reflexo no Vox, que aposta tudo nestas eleições, com a presença constante do líder nacional, Santiago Abascal, junto ao candidato Óscar Fernández. A Extremadura é uma das regiões mais pobres de Espanha, responsável por apenas 1,7% do PIB nacional, e é uma das que tem mais desempregados (apesar de uma tendência de melhoria). O desemprego era de 13,5% no terceiro trimestre, três pontos acima da média nacional. “A melhoria joga a favor da presidente da Junta, mas o PSOE e o Unidas pela Extremadura também alegam que isso é mérito do governo nacional”, explicou Hidalgo, indicando que o emprego (além da habitação) é uma das preocupações nesta campanha. “O grande cavalo de batalha é industrializar a economia e não estar dependente do trabalho sazonal, do trabalho por temporadas que é o do campo”, disse.Na questão industrial ganha destaque a central nuclear de Almaraz, que emprega diretamente 800 pessoas - mas afeta 2500 famílias. O seu fecho está programado para 2027. Vox e PP defendem a continuidade de Almaraz, tal como o PSOE da Extremadura. Mas, a nível nacional, o governo de Pedro Sánchez quer o fecho, gerando desencanto entre os eleitores socialistas. E isso prejudica o candidato Miguel Ángel Gallardo, já para não falar do facto de que deverá ser julgado para o ano pela alegada contratação ilegal de David Sánchez, o irmão do primeiro-ministro.“Continuo a achar que María Guardiola ainda seria a favorita mesmo se o PSOE tivesse outro candidato”, disse o jornalista da TVE. “Nestes dois anos e meio, consolidou a sua posição política à frente do governo regional. Não houve grandes falhas na gestão dos assuntos públicos e as pessoas compreendem que, embora não tenham existido grandes conquistas, houve um certo grau de normalidade na gestão dos assuntos públicos”, referiu.Relação com PortugalIndependentemente de quem lidera o governo da Extremadura, o professor António Sáez Delgado, que está à frente da cátedra de Estudos Ibéricos e conhece bem a realidade na fronteira de 430 quilómetros entre Portugal e a sua comunidade autónoma, gosta de reforçar que não houve nunca uma mudança radical da relação entre os vizinhos.“Portugal é uma espécie de questão de Estado na Extremadura, no sentido em que, independentemente do governo, continua a ser um elemento prioritário”, referiu, lembrando que Portugal está no próprio Estatuto de Autonomia. “Fico orgulhoso que a Extremadura tenha feito uma opção clara e nítida pela relação com Portugal”, afirmou.Se a fronteira com a Galiza é a económica, e a da Andaluzia é a turística, “a do Alentejo e da Extremadura, regiões tradicionalmente mais esquecidas e mais pobres, tem-se tornado nas últimas duas ou três décadas numa espécie de fronteira para a cultura e para a educação”, disse.A grande falha na relação passa, provavelmente, pelo comboio de alta-velocidade, com Portugal a apostar na ligação Lisboa-Porto-Vigo, quando para a Extremadura a melhor opção seria uma aposta na ligação Lisboa-Madrid. “Eu penso que não poderá haver um desenvolvimento importante quer no Alentejo, quer na Extremadura, sem essa ligação ferroviária. Penso que é fundamental e uma espécie de dívida histórica que os governos democráticos dos dois países têm com estas duas regiões”, resumiu Antonio Sáez Delgado. Candidatos a presidir a JuntaMaría Guardiola (PP).Presidente da Junta da Extremadura desde 2023, é a primeira mulher a ocupar o cargo. Antecipou as eleições numa tentativa de obter uma maioria absoluta que a liberte da dependência do Vox. Nasceu em Cáceres há 47 anos, foi vereadora dessa cidade e secretária-geral da Economia na Junta, assim como da Ciência. Miguel Ángel Gallardo (PSOE).O secretário-geral do PSOE da Extremadura foi autarca de Villanueva de la Serena (onde nasceu há 51 anos) e liderou por uma década o Conselho Provincial de Badajoz. Renunciou em maio para ser deputado regional, para ser julgado por um tribunal superior pelas alegadas irregularidades na contratação de David Sánchez, irmão do primeiro-ministro Pedro Sánchez. Óscar Fernández (Vox).Líder do Vox em Cárceres, onde nasceu há 50 anos, e até agora porta-voz do partido na Assembleia da Extremadura foi escolhido para liderar a candidatura, em vez de Ángel Pelayo Gordillo que concorreu em 2023 e foi eleito senador. Trabalhou no setor farmacêutico e hoteleiro.Irene de Miguel (Unidas pela Extremadura).A coordenadora regional do Podemos concorre pela terceira vez, à frente de uma coligação que inclui ainda a Esquerda Unida e a Aliança Verde. Engenheira agrónoma de 44 anos, quer melhorar os quatro deputados regionais conseguidos em 2023..Aragão vai a votos a 8 de fevereiroA Extremadura não é a única a comunidade a antecipar as eleições. O presidente do governo de Aragão resolveu fazer o mesmo, depois de também ter falhado o pacto entre o Partido Popular (PP) e o Vox na região, que não tem um novo orçamento há dois anos. Jorge Azcón anunciou que as eleições serão a 8 de fevereiro, depois de falhar na semana passada uma última tentativa de chegar a um acordo com o líder regional do Vox, Alejandro Nolasco, que o PP acusa de ter uma postura “absolutamente inamovível” em questões ideológicas que nada têm a ver com Aragão. A líder do PSOE regional, Pilar Alegria, ofereceu-se para negociar o orçamento, mas Azcón preferiu ir a votos. Alegria, que era a ministra da Educação, Formação Profissional e Desporto, além de porta-voz do governo de Pedro Sánchez, já se demitiu para se focar nas eleições regionais.