Embargo ao petróleo preso por "questões técnicas"
"Há muita vontade de todos" para "banir o petróleo russo da UE", mas a questão é "como o fazer?", diz fonte europeia.
A União Europeia convocou para a manhã desta segunda-feira uma reunião de ultima hora, para tentar quebrar o impasse em torno do sexto pacote de sanções à Rússia, a tempo da cimeira que arranca esta tarde, em Bruxelas.
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Os 27 reúnem-se a partir desta tarde numa cimeira extraordinária de dois dias, "para avançar nas discussões" sobre a Ucrânia, energia, segurança alimentar e defesa. O sexto pacote de sanções e o embargo ao petróleo russo não consta da agenda oficial, mas será um tema incontornável.
Há uma "nova proposta em cima da mesa", que daria "por enquanto" a possibilidade aos países mais dependentes para continuarem a receber petróleo proveniente da Rússia.
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Ao que o DN pode apurar, "a proposta envolve uma distinção entre a proibição total até ao final do ano das importações marítimas russas e uma isenção, por enquanto, para o petróleo proveniente do oleoduto Druzhba".
Este oleoduto abastece a Polónia, Áustria e Alemanha, mas também a Eslováquia, República Checa e principalmente a Hungria. Como é sabido, Budapeste têm-se destacado a nomear a dificuldade em encontrar alternativas ao petróleo russo, e por isso tem sido relutante em aprovar os termos da proposta inicial de Ursula von der Leyen.
Apesar de um regime de exceção que beneficia alguns não ser bem acolhido por outros, espera-se que a alternativa que está agora a ser trabalhada possa facilitar o acordo, permitindo numa base temporária, que os países sem acesso a fontes alternativas, possam resolver a sua dependência do petróleo russo.
De acordo com uma fonte conhecedora das negociações "espera-se um acordo" ao nível dos embaixadores representantes permanentes dos Estados-Membros, "nesta semana".
Cimeira
Na carta convite que ontem endereçou aos chefes de Estado ou de Governo, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel garantiu que o bloco europeu "continuará a pressionar a Rússia". No entanto, não faz qualquer referência à mais recente proposta de sanções apresentada pela Comissão Europeia, que inclui o embargo às importações de petróleo proveniente da Rússia.
"Há muita vontade de todos os Estados-Membros para trabalharem sobre o petróleo e para banir o petróleo dos mercados europeus", garantiu um alto funcionário da União Europeia ouvido pelo DN, na véspera da cimeira.
"A questão é como o fazer e como atender às especificidades nacionais, uma vez que alguns Estados-Membros estão mais dependentes do que outros, já que a sua situação geográfica torna as circunstâncias mais difíceis em termos de abastecimento", frisou a fonte já citada, sem se referir a qualquer Estado em concreto, mas sublinhando que está em causa "uma questão muito técnica".
O presidente do Conselho Europeu deverá receber esta manhã uma atualização das negociações que decorreram nas "últimas 48 horas" com os Estados-Membros, sob a "liderança da Comissão [Europeia] e a Presidência Francesa", comentou outra fonte.
Expectativas
Da parte da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, a expectativa é a de que não haja acordo. Numa entrevista em Davos ao site Politico, Von der Leyen destacou as dificuldades que a Hungria enfrenta para converter todo o seu sistema de refinação de petróleo proveniente de outra origem que não seja a Rússia. Além da necessidade de assegurar a construção de um oleoduto a partir da Croácia.
A verba necessária ascende aos "18 mil milhões" de euros, de acordo com os cálculos de Budapeste. Na entrevista, Ursula von der Leyen sugeriu que esta é a parte que cabe aos restantes 26 governos, saber se estão dispostos a patrocinar a independência da Hungria ao gás russo. Mas, no Conselho Europeu a ideia dominante é que "terão de ser encontradas alternativas".
Por outro lado, o presidente do Conselho Europeu, que esta semana se manifestou "muito confiante" num acordo, salientou na carta convite que "a unidade [da UE] sempre foi o seu ativo mais forte", esperando que ela "continue a ser o princípio orientador". Mas, o sexto pacote de sanções chega ao dia da cimeira ainda sem um consenso necessário para a sua aprovação.
Solidariedade
Os 27 vão debater já esta segunda-feira com o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, que se juntará por video-conferência, o apoio imediato para resolver os problemas de liquidez, e a ajuda a médio prazo, para a reconstrução.
A discussão deverá ajudar a clarificar as modalidades em que os montantes, que rondarão os 9 mil milhões de euros, poderão ser entregues ao país. As verbas poderão ser concedidas como empréstimos reembolsáveis ou subvenções a fundo perdido. O modelo das subvenções é o que tem mais apoios dentro do Conselho, comentou uma fonte com o DN.
"Uma das nossas preocupações mais prementes é ajudar o Estado ucraniano, juntamente com os nossos parceiros internacionais, sobre as suas necessidades de liquidez. Também discutiremos a melhor forma de organizar o nosso apoio à reconstrução da Ucrânia, pois será necessário um grande esforço global para reconstruir o país", afirma Charles Michel na carta convite.
Energia
No segundo dia da cimeira, os 27 vão realizar um debate sobre a energia, centrado nos preços elevados, que penalizam as famílias e as empresas europeias.
"Devemos acelerar a nossa transição energética se quisermos eliminar gradualmente a dependência dos combustíveis fósseis russos o mais rápido possível", salientou Charles Michel.
Neste capítulo da cimeira haverá um destaque para a "importância das interligações" da rede ibérica de energia e das condutas de gás à rede europeia, como forma de reduzir a dependência da energia russa.
Segurança alimentar
Os chefes de Estado ou de governo vão também discutir "formas concretas" de ajudar a Ucrânia a exportar os produtos agrícolas, que se encontram bloqueados dentro do território, devido à invasão do país. Para operacionalizar a ajuda, Charles Michel admite o recurso às "infraestruturas da União Europeia".
"A agressão militar da Rússia corre o risco de ter um efeito dramático na segurança alimentar global. Os preços dos alimentos dispararam e estamos a enfrentar sérios riscos de fome e desestabilização em muitas partes do mundo", destacou o belga.
"Veremos também como coordenar melhor as iniciativas multilaterais nesse sentido. Dada a vulnerabilidade aguda dos países africanos à insegurança alimentar, o Presidente da União Africana, Macky Sall, juntar-se-á a nós através de videoconferência para discutir o tema", salientou.
Defesa
O Conselho Europeu realizará ainda um debate sobre o tema da defesa, em que será discutida a necessidade da reposição de stock de armamento que tem sido doado à Ucrânia.
Essa reposição "deverá ser feita com a preocupação de assegurar a interoperabilidade entre o equipamento militar e dos procedimentos dos Estados-Membros", comentou uma fonte com o DN.
A Comissão Europeia e a Agência Europeia de Defesa deverão apresentar "uma análise das lacunas de investimento em defesa e propor outras iniciativas para fortalecer a base industrial e tecnológica de defesa europeia", referiu Charles Michel.
"A guerra da Rússia contra a Ucrânia reforçou ainda mais a nossa ambição de uma defesa europeia forte e coordenada (...). A nossa prioridade mais urgente é coordenar os esforços dos Estados-Membros para reabastecer os stocks e construir uma base industrial europeia", afirmou na carta-convite, prometendo "discutir formas de abordar as duas questões".