No centenário da Mecânica Quântica, a Real Academia Sueca de Ciências não ficou fora das celebrações e decidiu atribuir o Prémio Nobel da Física a três cientistas (John Clarke, Michel H. Devoret e John M. Martinis) pelo seu trabalho nesta área. Em causa estão as suas experiências, feitas na década de 1980, sobre o chamado “efeito túnel” no mundo quântico e a forma como conseguiram demonstrar as propriedades da mecânica a uma escala macroscópica (ou seja, maior que a escala subatómica ou de partículas, mas ainda assim bastante reduzida para ser visível).No fundo, explica Carlos Fiolhais ao DN, o que fizeram foi “demonstrar num circuito elétrico os efeitos quânticos, estranhos e bizarros, típicos das partículas do interior do átomo”. “Conseguiram reproduzir efeitos que são apenas realizáveis à escala de um muito pequeno microscópio. Esse é o mérito. Demonstraram que os efeitos quânticos podiam ser apreciados de modo visível”, simplifica o físico..Juntos, os três laureados com o Nobel da Física em 2025 deram há 40 anos um contributo importante para a computação quântica. “A tecnologia baseia-se em supercondutores, que são sistemas onde a eletricidade flui sem resistência elétrica. Estes cientistas têm dois supercondutores separados por uma barreira, que não devia ser ultrapassada por um objeto normal, mas aquele objeto quântico ultrapassa-a”, explica Carlos Fiolhais. Ou seja: quando se atira uma bola à parede, a bola voltará, mas no caso de partículas, algumas conseguem ultrapassar uma barreira equivalente à escala microscópica, surgindo do outro lado. É este o chamado “efeito túnel” que, à escala mais próxima dos nossos olhos, valeu o Nobel.Laurear o trabalho destes três cientistas “não era uma escolha óbvia”, diz Carlos Fiolhais, mas “isso não significa que não seja merecido”. “O Comité do Nobel premiou a possibilidade de realização de computadores quânticos. O que estes cientistas fizeram envolve muitos eletrões [partículas subatómicas do núcleo de um átomo, com carga elétrica negativa], mas conseguiram fazer isto a um nível macroscópico, à escala de um chip que cabe na palma de uma mão, o que significa que conseguem excitar os átomos com microondas. Têm isto de maneira controlável, podendo ligar os circuitos sem fazer passar corrente”, explica o professor catedrático em Física.Isto fará com que, no futuro, a computação se torne muito mais rápida. “São princípios de tecnologia que em 1985 não estavam tão maduros. Os computadores atuais funcionam com bits [com estados de 0 e 1] e os computadores quânticos utilizam combinações destes estados. É isso que permite acelerar a computação e ter um poder de cálculo maior. A Teoria Quântica tem 100 anos. Pensávamos que já tinha dado tudo, mas as aplicações e as possibilidades são novas. O futuro ainda está em aberto”, refere o cientista.Por esta descoberta, John Clarke Michel H. Devoret e John M. Martinis ganharam 11 milhões de coroas suecas (cerca de um milhão de euros), que deverão ser repartidas pelos três de forma equitativa. Aquando do anúncio, o Comité do Nobel conseguiu apenas falar com John Clarke, que disse ser, “sem exagero, a surpresa” da sua vida. “Nunca pensei que as nossas descobertas fossem a base de um Nobel”, afirmou o cientista da Universidade de Cambridge e investigador na Universidade de Berkeley, na Califórnia.Com trabalho feito há muito nesta área, John Martinis trabalhou entre 2004 e 2020 na Google, onde liderou esforços para atingir a “supremacia quântica”. Entretanto, saiu e fundou a Qolab, uma start-up de computação quântica. Já Michel Devoret continua na Google, onde é o cientista-chefe da divisão de quântica e inteligência artificial..Nobel da Física atribuído a John Clarke, Michel H. Devoret e John M. Martinis.“Guarda-costas do sistema imunitário” valem Nobel da Medicina