“É com grande responsabilidade que confirmo a decisão da maior liderança política e moral do Brasil, Jair Messias Bolsonaro, de me conferir a missão de dar continuidade ao nosso projeto de nação", declarou Flávio Bolsonaro, do Partido Liberal (PL), filho mais velho do ex-presidente, na sexta-feira, dia 5. O anúncio foi mal recebido pela direita mais moderada, pelos mercados e pelos brasileiros ouvidos em sondagens realizadas logo na sequência. Só outros membros da família a aplaudiram. Além da esquerda, em surdina.Antonio Rueda, presidente do União Brasil, um dos maiores partidos de direita, disse que “não será a polarização que construirá o futuro mas a capacidade de unir forças em torno de um projeto sério” porque o caminho “não é o do confronto estéril mas o da construção”. O União Brasil já tem pré-candidato, Ronaldo Caiado, governador de Goiás, mas deu sinais de poder apoiar Tarcísio de Freitas (Republicanos), o governador de São Paulo que parece ser a opção mais competitiva contra o atual presidente Lula da Silva. Ciro Nogueira, presidente de outra força importante da direita moderada, o Progressistas, foi diplomático. “Se eu tivesse que escolher pessoalmente um candidato, seria o senador Flávio, pela minha relação próxima com ele, mas a política não se faz com amizades, faz-se com viabilidade, sondagens, ouvindo aliados, não é só uma decisão do PL, é muito importante para nós incluirmos o campo político de centro e de direita porque se não, não vamos ganhar a eleição". Rueda e Nogueira reuniram-se com Flávio na noite de terça-feira, 10, mas recusaram-se a verbalizar apoio ao primogénito de Bolsonaro. Outro convidado para o encontro, Marcos Pereira, presidente do Republicanos, partido de Tarcísio com ligações à IURD, não compareceu por “questões de agenda”.O próprio Tarcísio disse, só 48 horas depois da decisão, que “Flávio junta-se a outros grandes nomes da oposição a partir de agora” e citou Romeu Zema (governador de Minas Gerais, pelo Novo), de Ratinho Junior (governador do Paraná, pelo PSD) e do citado Ronaldo Caiado. Além da própria área política, o pré-candidato também não convence a bolsa, rendida a Tarcísio que, como governador paulista e ministro da Infraestrutura de Bolsonaro, se revelou simpático aos mercados. O índice Bovespa teve a maior desvalorização diária desde fevereiro de 2021, queda de 4,31%, e o dólar a maior alta desde outubro, de 2,3%, logo após o anúncio da pré-candidatura. “A resposta do mercado reflete que ele atrai votos do pai mas tem a elevada rejeição que o ex-presidente tem”, disse Yihao Lin, da Genial Investimentos, à BBC. Para o economista André Perfeito, “a decisão implode possíveis alianças entre centro e direita no ano que vem”. Já à esquerda, o passo de Flávio é visto como benéfico. “Lula derrotou o pai e vai derrotar o filho”, disse Guilherme Boulos (PSOL), ministro de Lula. E o pastor Silas Malafaia, guru do casal Bolsonaro, afirmou que “o amadorismo da direita faz a esquerda dar gargalhadas”.Nas sondagens, o Instituto Datafolha revelou que Lula bateria Flávio por 15 pontos em eventual segunda volta. Segundo o Ipsos-Ipec, o atual presidente vence em todos os cenários testados, incluindo Flávio, Tarcísio, Eduardo Bolsonaro (PL), terceiro filho de Jair, e Michelle Bolsonaro (PL), que é quem melhor pontua num cenário de primeira volta: 38% para Lula, 23% para a ex-primeira-dama.“Que o senhor te dê sabedoria, força e graça”, reagiu Michelle à indicação de Flávio apenas cinco dias depois dos dois terem protagonizado uma discussão pública sobre o apoio do PL à candidatura de Ciro Gomes ao governo do estado do Ceará. Eduardo e Carlos Bolsonaro também aprovaram a escolha paterna pelo primogénito. Valdemar Costa Neto, presidente do partido de toda a família, acrescentou que “se Bolsonaro falou, está falado”.Entretanto, quem mais pontua em eventual disputa com Lula, é o próprio Jair, segundo a Genial/Quaest. O atual presidente soma 32 pontos, contra 27 do antecessor. Uma candidatura de Bolsonaro, porém, está colocada de lado, não só porque o capitão do exército está inelegível por oito anos mas por ter sido condenado a 27 por tentativa de golpe. .Mas “Bolsonaro livre e nas urnas” é, segundo o próprio Flávio, “o único preço para desistir da candidatura”, disse o pré-candidato à TV Record. Nos dias seguintes, corrigiu, ao Folha de S. Paulo: “a minha candidatura não está à venda, é irreversível”.Entretanto, a Câmara dos Deputados, dominada pelos partidos que pretendem Tarcísio a Flávio, aprovou um projeto de redução de pena de Bolsonaro, num movimento político lido como afago a Flávio para o convencer a desistir. Mas o projeto, que prevê uma redução para dois anos e quatro meses em regime fechado, ainda terá de passar pelo Senado e por Lula para ser aprovado. QUEM SÃO OS BOLSONAROSMichelleEx-primeira-dama, 43 anos, foi secretária na Câmara dos Deputados, onde conheceu Jair, com quem se casou e teve uma filha, Laura. Membro da Igreja Batista Atitude, é vista como carismática, o que a alçou à presidência do PL Mulher, ala do partido dos Bolsonaro. Nas sondagens pontua melhor do que qualquer um dos enteados num eventual duelo com Lula.FlávioSenador, 44 anos, foi deputado estadual do Rio de Janeiro, quando esteve envolvido num esquema de desvio do salário de assessores. Mais tarde foi investigado por comprar uma mansão em Brasília por valores considerados incompatíveis com os rendimentos. Considerado o mais político dos filhos de Bolsonaro, foi escolhido pelo pai para a sucessão.CarlosVereador do Rio de Janeiro, 43 anos, deve ser indicado pelo PL a concorrer a deputado federal por Santa Catarina em 2026. Considerado o mais apegado ao pai, prefere a influência nos bastidores - liderou o “gabinete do ódio”, grupo que, a partir do Planalto, divulgava notícias falsas contra rivais - a aparições públicas.EduardoDeputado federal, 41 anos, está desde março nos EUA, de onde liderou um lóbi na Casa Branca para vincular as taxas a exportações brasileiras à absolvição do pai. Como as tarifas baixaram, o ex-presidente acabou condenado a 27 anos e a Câmara dos Deputados vai votar a suspensão do seu mandato por faltas, o plano fracassou. Amigo de Steve Bannon, é a ponte com a extrema-direita internacional.Jair RenanVereador desde janeiro de Balneário Camboriú, cidade costeira de Santa Catarina, tem 27 anos e é, ao contrário de Flávio, Carlos e Eduardo, fruto do segundo casamento do ex-presidente. Foi notícia, sobretudo, por inquéritos e investigações policiais envolvendo a sua empresa de eventos.