Foi ao som de I Did it My Way, de Frank Sinatra, que o presidente da câmara de Nova Iorque, o democrata Eric Adams, anunciou que desistia de tentar a reeleição. O impopular mayor era apenas quarto nas sondagens, mas alegou falta de verbas (os escândalos de corrupção deixaram-no sem acesso a fundos públicos) e “constante especulação mediática” sobre o seu futuro para tomar a sua decisão. A desistência relança a corrida, podendo beneficiar a candidatura independente do ex-governador Andrew Cuomo, que perdeu as primárias democratas para o favorito Zohran Mamdani e tem esperança que o republicano Curtis Sliwa também desista. Eleito em 2021, o antigo polícia tornou-se no segundo afro-americano a liderar a câmara de Nova Iorque. Mas, tal como o primeiro, David Dinkins (1990-1993), não irá além de um mandato. Adams liderou a cidade no pós-pandemia de covid-19 e orgulha-se de melhorias na educação e na queda do crime (nomeadamente tiroteios e homicídios), mas viu-se ele próprio (e vários dos seus mais próximos) envolvido com a justiça. Acusado no ano passado de subornos, fraude e financiamento ilegal de campanha, viu as acusações serem retiradas pela atual Administração de Donald Trump - o que lhe custou ainda mais votos entre os democratas. . Com uma popularidade inferior a 20% entre os nova-iorquinos, Adams optou por tentar a reeleição como independente após desistir de concorrer às primárias democratas. Mas a candidatura não estava a correr bem e havia rumores de que o próprio Trump lhe teria oferecido um cargo (embaixador na Arábia Saudita) para que desistisse, na esperança de beneficiar Cuomo - dado o seu ódio por Mamdani. Nas primárias democratas a surpresa foi mesmo o socialista Zohran Mamdani - muçulmano nascido no Uganda há 33 anos que, entre outras coisas, defende autocarros grátis na cidade, o congelar das rendas e o aumento dos impostos para os mais ricos. Apesar de ter ganho as primárias, representa a ala mais radical do partido e não conta com o apoio da liderança. A seu favor pode jogar o facto de ser alvo dos ataques de Trump - ainda esta segunda-feira (29 de setembro) voltou a chamá-lo de “comunista” e ameaçou não dar dinheiro para Nova Iorque caso ele vença, dizendo que ele pode ser o melhor que aconteceu aos republicanos.Mamdani derrotou Andrew Cuomo, que era o favorito nas primárias. O ex-governador de 67 anos demitiu-se em desgraça em 2021, após várias denúncias de assédio sexual, mas as acusações acabaram por cair e ele relançou a carreira política com uma corrida à câmara. A candidatura mais centrista de Cuomo alega que Mamdani não tem experiência, enquanto este último diz que também não tem a “bagagem” do ex-governador.Num estado dominado pelos democratas, há ainda um republicano na corrida. O ativista Curtis Sliwa, de 71 anos, é conhecido por ter fundado os Anjos da Guarda, uma organização de vigilantes que começou por patrulhar as ruas e os transportes de Nova Iorque e se alargou a outras cidades e estados. Sliwa também está a ser pressionado a desistir - na semana passada disse já ter recebido várias propostas de pessoas que lhe oferecem rios de dinheiro para isso. Mas prometeu não o fazer. Apesar de ser o candidato republicano, não conta com o apoio de Trump - que no passado também criticou. Ao desistir, Adams não apelou ao voto em nenhum dos antigos adversários - a sua desistência deverá contudo favorecer Cuomo, que nas sondagens está quase 20 pontos atrás de Mamdani. Adams alertou contra as “forças insidiosas” que usam o governo local para “promover agendas divisivas” (numa aparente referência a Mamdani) e deixou o aviso: “Isto não é mudança, é caos. Em vez disso, peço aos nova-iorquinos que escolham os líderes não pelo que prometem, mas pelo que cumprem.”O democrata que lidera as sondagens reagiu à desistência de Adams com um ataque a Cuomo: “Nova Iorque merece mais do que trocar um político corrupto e desonrado por outro. No dia 4 de novembro, vamos virar a página da política do dinheiro e das pequenas ideias e entregar um governo de que cada nova-iorquino se possa orgulhar”, disse. Já Cuomo elogiou Adams por “colocar o bem-estar da cidade de Nova Iorque à frente da ambição pessoal”, dizendo que enfrenta “forças extremistas destrutivas que devastariam a nossa cidade por incompetência ou ignorância, mas não é tarde demais para as travar”. .Jovem, socialista e muçulmano. Quem é o vencedor das primárias dos democratas em Nova Iorque.Ex-governador de Nova Iorque Andrew Cuomo não será acusado de assédio sexual