Um culto cristão realizado num dos auditórios da Câmara dos Deputados do Brasil serviu de palco para a celebração da eleição do novo líder da Frente Parlamentar Evangélica, também apelidada de Bancada da Bíblia, ocorrida na terça-feira. Gilberto Nascimento (PSD) foi eleito com 117 dos votos (64%) dos 246 parlamentares registados no grupo. Otoni de Paula (MDB), o concorrente, somou 61 votos (33%). Houve cinco abstenções. Nascimento é visto como mais conservador e próximo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Otoni defendia diálogo com o governo de Lula da Silva. “A nossa missão agora é reorganizar a bancada”, disse o vencedor, horas depois do triunfo, ao canal GloboNews. “A frente tem quase 250 deputados, do PSOL [partido mais à esquerda do Congresso] ao PL [partido de Bolsonaro], vamos ser uma frente de diálogo - não houve divisão, houve uma disputa democrática”, acrescentou.Em causa, o facto de, pela primeira vez na história da frente fundada em 2003, que reúne parlamentares cristãos protestantes de diversas igrejas, denominações e movimentos, o novo líder não ter sido escolhido por consenso, unanimidade e aclamação.Em 2023, ano da última eleição, já tinha havido um sintoma de divisão, reflexo da polarização no país, mas a frente decidiu que o deputado Eli Borges, do PL, seria presidente da frente evangélica naquele ano e Silas Câmara, do Republicanos, lideraria em 2024, sem ser necessário recorrer ao voto.Silas Câmara, líder cessante, estava agora ao lado de Otoni de Paula. Nascimento contava com o apoio explícito de Bolsonaro, do pastor Silas Malafaia, um dos mais famosos e influentes tele-evangelistas do Brasil, e de Sóstenes Cavalcante, líder parlamentar do PL. A deputada Greyce Elias (Avante), que chegou a concorrer, retirou a candidatura à última hora para também apoiar Nascimento.Ao longo da campanha, Otoni foi acusado de ser “um agente de Lula”, depois de ter apoiado o candidato de centro a prefeito do Rio de Janeiro contra o candidato bolsonarista nas Eleições Municipais de 2024. Para ele, entretanto, os evangélicos perderam protagonismo na defesa da agenda conservadora nos costumes para Bolsonaro, a partir do momento em que este se aproximou da bancada.Além da heterogeneidade partidária do grupo, há heterogeneidade religiosa: Nascimento é da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, Otoni é da Assembleia de Deus Ministério Madureira, Greyce, da Sara Nossa Terra, e a maioria dos membros da Igreja Universal do Reino de Deus reúne-se no seu braço político, o partido Republicanos. “Não faremos oposição ao governo, não, não é isso”, disse ainda o vencedor depois da vitória. “Defenderemos a nossa agenda, a defesa da vida e a defesa da família, contra a liberalização das drogas e dos jogos de azar e demonstraremos preocupação com a economia, com o preço dos alimentos e da gasolina, com a diminuição do poder de compra, que tanto incomoda os brasileiros, torcemos para que o governo mude a sua política económica”.A fatia do eleitorado brasileiro que se declara evangélica chegou a 31%, segundo estudo do instituto Datafolha de 2020, razão pela qual os candidatos presidenciais em 2022 criaram estruturas para dialogar com o segmento. Lula, que acabaria por vencer as eleições, escreveu mesmo “uma carta de compromisso ao eleitorado evangélico”. Mas sondagem Atlas Intel estimou que 51% dos evangélicos tenha optado por Bolsonaro e apenas 27% por Lula, o preferido da maioria dos católicos, nesse sufrágio.