A primeira sondagem divulgada após os comícios de Jair Bolsonaro (PL) nos festejos dos 200 anos da independência do Brasil aponta para uma subida de dois pontos, de 32 para 34%, do candidato à reeleição, dentro, por isso, da margem de erro. Lula da Silva (PT), de acordo com o instituto Datafolha, manteve os mesmos 45% da última avaliação. Os dados confirmam duas ideias consolidadas dos analistas: apesar de anormalmente tensa, a eleição de 2 de outubro é a mais previsível dos últimos anos; e Bolsonaro cresce demasiado devagar para atrapalhar a liderança de Lula mas o suficiente para, à partida, obrigar a segunda volta, dia 30..Segundo o Datafolha, que ouviu 2676 pessoas em 191 cidades brasileiras nos dias 8 e 9 com margem de erro de dois pontos para cima ou para baixo, Lula, de centro-esquerda, continua a liderar: tem 45%, que se transformam em 48%, se nos ativermos aos votos válidos, isto é, excluindo brancos e nulos. A tendência, pois, é que fique perto de decidir a eleição na primeira volta - mas falhe esse objetivo.."Só falta um tiquinho...", comentou Lula..Já Bolsonaro, de extrema-direita, que aproveitou o 7 de setembro para realizar comícios paralelos, muito concorridos, aos eventos oficiais em Brasília e no Rio de Janeiro, subiu para 34% (36% contando os votos válidos) - mas dentro da margem de erro de dois pontos.."Alguém acredita que Lula ganha se as eleições forem limpas?", perguntou Bolsonaro aos apoiantes..Em caso de segunda volta, Lula soma 53% e Bolsonaro 39%. A taxa de rejeição do antigo presidente é de 39%, a do atual de 51%.."Esta pouca variação na intenção de voto ocorre porque os dois principais adversários são muito conhecidos, um é o atual presidente e o outro é um ex-presidente, então as pessoas já sabem quem eles são", assinala o politólogo Alberto Carlos Almeida, para quem "esta eleição é entediante". "Desde que Lula assumiu a liderança, em junho do ano passado, a distância entre ele e Bolsonaro pouco tem oscilado e a tendência é que assim permaneça, com os votos se concentrando ainda mais nos dois primeiros candidatos na reta final da campanha", conclui o autor de A Mão e a Luva - O que Elege um Presidente, publicado em maio deste ano..Para Bruno Carazza, cientista político ouvido pela CNN Brasil, "o quadro de estabilidade é observado há muito tempo nas pesquisas eleitorais, o cenário é de cristalização da intenção de voto tanto em Bolsonaro quanto em Lula". Segundo Carazza, o fenómeno pode ser explicado pelo facto de os eleitores terem decidido de maneira antecipada os seus votos para presidente. "Lula e Bolsonaro são figuras muito fortes para a esquerda e para a direita brasileiras"..Kennedy Alencar, comentador político do UOL, acha que "Bolsonaro não ganhou um voto sequer no 7 de setembro". "O público que estava em Brasília neste ano é similar ao do ano passado. Ele não tem maioria na sociedade. Do ponto de vista eleitoral, ele vai ficar no mesmo lugar, acho que ele ainda assusta setores moderados apenas porque vemos uma ameaça de golpe explícita. Ele falou para uma plateia de convertidos - a bolha - e produziu imagens para a campanha dele. Com essas imagens, ele tenta dizer que tem uma intenção de votos maior do que as pesquisas apontam. Isso é mentira". Bolsonaro chegou a chamar os comícios do bicentenário de "datapovo" como contraponto à sempre aguardada sondagem Datafolha..Segundo Thais Oyama, jornalista autora de Tormenta: O Governo Bolsonaro, Crises, Intrigas e Segredos, o quartel-general bolsonarista "acredita que as imagens produzidas [nos comícios de 7 de setembro] vão, a despeito de tudo que diz a lógica, provar que as pesquisas estão erradas". "Não faz grande sentido quando sabemos que Bolsonaro já tem em torno de 53 milhões de votos (cerca de 34%), segundo as pesquisas, ou seja, reunir dois milhões de pessoas não prova nada. Mas eles acreditam que essas fotos vão fazer com que os bolsonaristas arrependidos e os eleitores indecisos se animem e vejam que Bolsonaro não é cachorro morto", explica..Thomas Traumann, colunista de O Globo e Veja, concorda: "A intenção de Bolsonaro com os atos de 7 de setembro não era ganhar votos novos mas mostrar força para os seus próprios apoiantes desanimados com as últimas pesquisas. Agora ele tem as imagens do "datapovo" para impulsionar as últimas semanas de campanha"..Para Reinaldo Azevedo, articulista do jornal Folha de S. Paulo e da Band News, o presidente levou muita gente às ruas. "E ainda assim são uma vastíssima minoria..." "Mas composta de aguerridos e de fanáticos de várias naturezas, o que inclui os religiosos - que é a ponta por meio da qual o bolsonarismo se encontra com a pobreza, sim, há também bolsonaristas pobres". "Mas uma coisa é essa massa mobilizada que vai a um evento. Outra é o povo indistinto. Bolsonaro foi testar a sua popularidade no Maracanã [no jogo Flamengo-Vélez Sarsfield, horas após os comícios] e até se ouviram alguns gritos "mito, mito", mas na geral, aquele som que vira voz única, que varre e faz tremer arquibancadas, era outra coisa que se ouvia: "ei, Bolsonaro, vai tomar no c...". E olhem que, no Rio de Janeiro, ele está empatado tecnicamente com Lula"..Lula continua à frente entre os mais pobres, as mulheres e os católicos e Bolsonaro manteve ascendente entre os evangélicos..A campanha de Bolsonaro ainda acredita numa inversão da campanha graças ao adiamento da segunda parcela do programa de assistência Auxílio Brasil para perto da eleição e de um novo debate, desta vez na TV Globo..Além dos dois principais candidatos, Ciro Gomes (PDT) oscilou dentro da margem mas negativamente - de 9% para 7% -, o que pode indicar que foi no eleitorado do candidato de centro-esquerda que Bolsonaro foi buscar os dois pontos. Simone Tebet (MDB), de centro-direita, manteve os 5% da sondagem anterior do Datafolha, pelo que está agora em empate técnico com Ciro. Dos demais, só Soraya Thronicke (União Brasil) atingiu 1%..dnot@dn.pt