Jair Bolsonaro, ex-presidente brasileiro.
Jair Bolsonaro, ex-presidente brasileiro.FOTO: ANDRE BORGES/EPA

Bolsonaro justifica tentativa de tirar pulseira eletrónica com “surto, alucinação e paranoia”

Ex-presidente disse na audiência de custódia que novos medicamentos que está a tomar fizeram-no pensar que havia uma escuta no aparelho. Autoridades decidiram mantê-lo preso.
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Jair Bolsonaro atribuiu neste domingo, 23 de novembro, a tentativa de derreter a pulseira eletrónica com um ferro de soldar a “uma alucinação” de que o dispositivo eletrónico tinha uma escuta, segundo consta do relatório da audiência de custódia ao ex-presidente que se decidiu pela manutenção da prisão preventiva. Segundo Bolsonaro, os novos remédios que tem estado a tomar causaram-lhe um surto paranóico.  


Eis um trecho da ata da audiência: “questionado sobre a tentativa de violar a pulseira, Bolsonaro respondeu que teve uma 'certa paranóia' em razão de medicamentos que tem tomado, receitados por médicos diferentes e que, segundo ele, reagiram de forma inadequada (...) Ele também disse que tem o sono ‘picado’ e que não dorme direito. Por isso, resolveu, com um ferro de soldar, mexer na pulseira, porque tem curso de operação desse tipo de equipamento”.


Ainda segundo o texto, “Bolsonaro relatou que mexeu na pulseira por volta da meia-noite mas depois ‘caiu na razão’ e parou de usar a solda, momento em que teria se comunicado com os agentes de custódia”. Também disse que não se lembra “de ter um surto dessa natureza noutra ocasião” e que começou “a tomar um dos remédios cerca de quatro dias antes dos factos que levaram à sua prisão". 

“Ele justificou que todo o ato foi causado por uma ‘alucinação’ de que tinha alguma escuta na pulseira, tentando então abrir a tampa do dispositivo com o ferro”, continua o relatório da audiência.

Bolsonaro desmentiu ainda perante o juiz que planeasse fugir aproveitando uma vigília marcada pelo filho, diz a ata: “Quando foi perguntado especificamente sobre uma possibilidade de fuga causada pela vigília convocada pelo filho, o senador Flávio Bolsonaro, na região da casa dele, onde estava detido preventivamente, Bolsonaro negou qualquer tentativa de escapar”.


Na véspera, foi tornado público um trecho do interrogatório a Bolsonaro em que o político admite às autoridades ter utilizado um ferro de soldar para tentar queimar a pulseira eletrónica. “Eu meti o ferro quente aí. Curiosidade”, disse o ex-presidente brasileiro, de acordo com um vídeo gravado por uma agente e divulgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). No vídeo em causa é possível verificar a danificação da pulseira eletrónica causada pela tentativa de Bolsonaro.


Jair Bolsonaro, ex-presidente do Brasil, foi detido pela Polícia Federal (PF) a pedido do STF na manhã de sábado, 22 de novembro. A medida não se refere ainda ao cumprimento de pena e sim a uma medida cautelar.


Bolsonaro foi levado para a Superintendência da PF, sem oferecer resistência, segundo fontes policiais citadas pela Globo News. A prisão foi motivada pela necessidade de garantir a ordem pública, depois de, na sexta-feira, Flávio Bolsonaro, ter convocado uma vigília de apoio ao ex-presidente à porta do condomínio deste num vídeo em que pergunta aos apoiantes do pai se vão acompanhar a situação no conforto de casa pelo telemóvel ou se vão tomar uma atitude. A manifestação, diz Flávio, tinha como objetivo “lutar pela volta da democracia ao Brasil”. 

Mas, segundo o juiz do STF que relata o processo, Alexandre de Moraes, a vigília visava perturbar a ordem pública e prejudicar a atuação da polícia no caso de uma ação no local, representando “risco de fuga”. Moraes citava ainda que “o Centro de Integração de Monitoração Integrada do Distrito Federal” comunicara a citada “violação do equipamento de monitoramento eletrónico do réu Jair Messias Bolsonaro”. 

“A informação”, continua Moraes, “constata a intenção do condenado de romper a tornozeleira eletrónica para garantir êxito na sua fuga, facilitada pela confusão causada pela manifestação convocada pelo filho”.

O juiz cita ainda os casos de Alexandre Ramagem, outro dos já condenados por golpe de estado, gravado nesta semana na Florida, nos EUA, sem aviso ao tribunal e o de Carla Zambelli, deputada bolsonarista condenada noutro caso, que escapou para Itália, também via Florida.


Além disso, há registo de uma tentativa de fuga do próprio Bolsonaro, que chegou a dormir duas noites em fevereiro de 2024 na embaixada da Hungria, a apenas 13 km de distância do condomínio do ex-presidente, com o objetivo de pedir asilo ao governo do aliado Viktor Orban. A defesa de Bolsonaro negou, na altura, intenção de fuga.

Bolsonaro deve ficar preso numa sala da Superintendência da PF em Brasília, com direito a cama, casa de banho, mesa de trabalho e um pequeno frigorífico. O ex-presidente, que vem apresentando problemas de saúde, terá direito a atendimento médico em tempo integral, decidiu ainda Moraes.

A visita de Michelle e a reação de Lula

Horas depois da audiência de custódia, Bolsonaro recebeu a visita de Michelle, ex-primeira dama, que não estava presente no momento da detenção.

Entre as muitas reações à prisão, destaque para a de Lula da Silva, atual presidente, para quem “todo o mundo sabe o que ele fez”. “Não comento decisões do STF, foi ano e meio de investigação, de delação e de julgamento, ele teve todo o direito à presunção da inocência, então se a justiça decidiu, está decidido”.

O próximo passo do processo é a votação no STF sobre a detenção, nesta segunda-feira, 24. Caso a maioria dos juízes confirme a decisão de Moraes, o ex-presidente fica detido por tempo indeterminado, mas com reavaliação a cada 90 dias.

Esta detenção, preventiva, acontece nas vésperas de Jair Bolsonaro começar a cumprir pena, uma vez que os recursos apresentados pela defesa já estão esgotados. O ex-presidente do Brasil foi condenado em setembro a 27 anos e três meses pela tentativa de golpe de Estado após a derrota nas eleições de 2022. Está em prisão domiciliária desde 4 de agosto e proibido de fazer declarações públicas e comentários nas redes sociais.

Jair Bolsonaro, ex-presidente brasileiro.
Jair Bolsonaro confessa ter tentado derreter a pulseira eletrónica: "Meti o ferro quente aí. Por curiosidade"

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