Parecia impossível eu e ele termos química mas não existem impossíveis quando há disposição para conversar” disse Lula da Silva, presidente do Brasil, em cerimónia, na última terça-feira, no Palácio do Planalto. Uma semana exata antes, o presidente norte-americano Donald Trump, a quem Lula se referia, surpreendeu as delegações dos dois países ao anunciar, em pleno palanque na Assembleia Geral da ONU, um encontro entre ambos “para breve”, depois de ter sentido “uma química excelente” ao cruzar-se com o homólogo brasileiro, que definiu como “very nice guy”.Ainda com data - fim de outubro é possibilidade - e plataforma de comunicação - videoconferência é a mais provável - por definir, o encontro entre Trump, presidente da maior economia do mundo e líder ideológico da (extrema) direita mundial, e Lula, presidente da segunda maior economia das Américas, ícone da esquerda global e membro ativo dos BRICS (bloco composto inicialmente por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), já vem gerando profundas reações políticas, jurídicas e comerciais, sobretudo no país do segundo.Em primeiro lugar porque surge numa altura em que investigadores ouvidos pelo DN, como Paulo Ramírez, professor da Fundação Escola de Sociologia e História, e Roberto Georg Uebel, professor de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing, classificam o momento diplomático entre os dois países como “o pior da história”. Em causa, uma guerra tarifária à superfície - Washington decidiu aumentar, mais do que a qualquer outra nação ou bloco, a taxação para produtos brasileiros - com batalhas políticas e jurídicas como pano de fundo - após lobby do deputado de extrema-direita Eduardo Bolsonaro, a residir nos EUA desde março, o governo Trump vinculou as taxas à situação penal de Jair Bolsonaro, decidindo até sancionar Alexandre de Moraes, o juiz do Supremo Tribunal Federal encarregado dos processos contra o ex-presidente.Para Vinícius Vieira, professor de Ciência Política da Fundação Armando Álvares Penteado, “a reunião deve ter foco na redução de tarifas cobradas ao Brasil em troca de acesso dos EUA a mais materiais raros, essenciais para a transição energética mundial, será então não só uma solução para a crise imediata mas também para estabelecer um alinhamento futuro entre os países”. “E Bolsonaro deve ser jogado ao mar porque Trump já terá percebido que não vale a pena insistir na questão jurídica dele, agora que foi condenado, vale muito mais negociar com este governo e ficar a torcer que em 2026 alguém de direita ganhe a eleição”, diz o pesquisador. “Não acredito que o nome de Bolsonaro, especificamente, seja sequer abordado”, acrescenta Uebel, “até porque nem tenho a certeza que Trump se lembre de quem ele é”. “Eu acho que a questão principal é a regulamentação das big techs, essa, mais do que a situação de Bolsonaro, é a razão do aumento tarifário, de qualquer forma o encontro servirá principalmente para criar uma aproximação, uma abertura de canais”. Segundo Lula, “a reunião pode acabar com o mal-estar nessa relação”. “Acho que ele está mal informado em relação ao Brasil e isso tem-no levado a tomar decisões que não são aceitáveis entre países com relações diplomáticas há mais de 200 anos, acho que, quando tivermos o encontro, tudo será resolvido, Brasil e EUA viverão em harmonia e quimicamente estáveis”, disse o presidente, gracejando com a “química” que Trump disse sentir por ele.A reunião, entretanto, é vista com preocupação - e também desdém - pela direita brasileira que acredita ter o monopólio da interlocução com a Casa Branca. “É apenas uma estratégia de Trump mostrando a genialidade dele como negociador”, disse Eduardo Bolsonaro nas redes sociais. “Ele entra na mesa [de negociações] quando quer, da forma que quer e na posição que quer enquanto outros líderes, como Lula, assistem impotentes”. Para a “química” repentina de Trump pode ter contribuído, entretanto, uma reunião do líder americano com o empresário brasileiro Joesley Batista, dono da JBS, a maior processadora de carne do mundo, revelou o site G1. A empresa, que tem mais de 70 mil empregados nos EUA e promete investir cerca de mil milhões de dólares no país, incentivou o governo norte-americano a conversar sobre as tarifas nesse setor. E noutros, como o do café, em que os EUA estão muito dependentes da produção brasileira. No Planalto, por outro lado, a reunião é planeada com a máxima cautela para evitar o “efeito Zelensky”, ou seja, a “emboscada” de que Volodymyr Zelensky, presidente da Ucrânia, foi alvo em Washington em fevereiro - assim como Cyril Ramaphosa, presidente sul-africano, em maio.“Trump faz 80 anos em junho do ano que vem, eu faço 80 anos em outubro deste ano”, disse Lula a esse propósito. “Não há por que ter brincadeira numa relação entre dois homens de 80 anos de idade, eu vou tratá-lo com o respeito que merece o presidente dos Estados Unidos e ele certamente vai me tratar com o respeito que merece o presidente do Brasil”..Romeu Zema: “O Governo Lula usa a estrutura de poder para perseguir inimigos”.Assembleia Geral da ONU. “A nossa democracia e a nossa soberania são inegociáveis”, disse Lula