Bayrou não quer “tornar o Islão uma obsessão” e afasta proibição do véu em França
O primeiro-ministro francês rejeitou esta terça-feira a proposta avançada pelo seu antecessor Gabriel Attal de proibir o uso de véu a raparigas até aos 15 anos, afirmando não querer transformar o islamismo num foco político ou colocar “os franceses uns contra os outros”.
“Não tenho qualquer desejo de tornar o Islão uma obsessão na sociedade francesa. Sei que está na moda, mas precisamos de viver juntos”, afirmou François Bayrou em entrevista à BFMTV. “Não acredito que esta seja a forma de abordar questões sobre a vida partilhada das diferentes comunidades e sensibilidades religiosas em França”, acrescentou.
O islamismo em França esteve, na semana passada, no centro de uma polémica causada pela divulgação de um relatório do Ministério do Interior que alertava para as alegadas tentativas de grupos ligados à Irmandade Muçulmana de se “infiltrarem” na sociedade francesa e promoverem uma agenda fundamentalista. No documento eram citados casos de jovens a usar lenços na cabeça, ligando a Irmandade Muçulmana a uma campanha antidiscriminação com o slogan “a liberdade está no hijab”.
As conclusões deste relatório levaram Gabriel Attal - atual líder do partido aliado de Macron, o Renaissance, e primeiro-ministro quando o estudo foi encomendado - a propor uma série de medidas polémicas, como a proibição do véu nos espaços públicos para menores de 15 anos, “sobretudo porque atenta gravemente contra a igualdade de género e a proteção da criança”, é referido pelo jornal Le Parisien.
“Não sei o que isso significa. (...) Como é que se faz? Significa que, na rua, a polícia diz a uma jovem: ‘Mostra-me o teu documento de identidade para ver se tens idade suficiente?’”, declarou François Bayrou na mesma entrevista. O primeiro-ministro reconheceu, mesmo assim, que o relatório tem elementos úteis, mas que a “escala” das alegações lá feitas ainda tem de ser avaliada.
Bayrou não foi o primeiro a criticar a proposta de Gabriel Attal, o mesmo já havia sido feito por nomes como Élisabeth Borne, antiga chefe de governo e atual ministra da Educação, ou Bruno Retailleau, titular da pasta do Interior. Também o presidente Emmanuel Macron comentou o tema, dizendo que “todos devem viver numa sociedade onde devem ser exigentes, onde haja direitos e responsabilidades, mas onde também deve haver respeito por cada pessoa”.
“Se há uma questão em que as divisões já não fazem muito sentido, acho que é esta: viver em segurança no próprio país, respeitando a ordem, as nossas fronteiras. Acredito profundamente que isto não é nem direita, nem esquerda, nem centro”, defendeu-se Attal na segunda-feira.
De recordar que o atual líder do Renaissance quando ocupou o cargo de ministro da Educação, entre julho de 2023 e janeiro de 2024, foi responsável pela proibição das abaias nas escolas públicas francesas, sob o “princípio do secularismo”, alargando a inibição do uso de símbolos religiosos que já incluíam cruzes cristãs, quipás judaicas e véus islâmicos.
“O secularismo significa a liberdade de se emancipar através da escola”, referiu Attal na altura, citado pelo diário The Guardian, descrevendo a abaia como “um gesto religioso, que visa testar a resistência da república em relação ao santuário secular que a escola deve ser”.