António Costa, ex-primeiro-ministro, é falado como o possível novo líder do Conselho Europeu.
António Costa, ex-primeiro-ministro, é falado como o possível novo líder do Conselho Europeu.John Thys / AFP

António Costa entre os preferidos na distribuição dos tronos europeus

Socialistas europeus veem António Costa com as qualidades necessárias e elogiam a “capacidade de diálogo” e o compromisso com uma Europa social e inclusiva.
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Os líderes europeus reúnem-se esta noite, em Bruxelas, num jantar informal à porta fechada, para uma “conversa franca” sobre as futuras lideranças das instituições europeias. O ex-primeiro-ministro António Costa é tido como favorito para a presidência do Conselho Europeu, mas a nomeação não está garantida.

António Costa terá, no entanto, apoios de peso dentro da sala, entre os quais o do chanceler alemão, Olaf Scholz, e o do presidente do governo espanhol, Pedro Sánchez, ambos nomeados pela família socialista para negociarem com os outros líderes o conjunto das presidências institucionais.

Os 27 terão de encontrar uma solução que possa ser conjugada entre a presidência da Comissão Europeia e do Conselho Europeu e os restantes cargos de topo na União Europeia, tendo em conta os equilíbrios políticos, regionais ou de género. Entram também na negociação o cargo de alto representante da UE para a Política Externa e de Defesa e a presidência do Parlamento Europeu.

Nos corredores de Bruxelas admite-se que, entre as famílias políticas, a presidência da Comissão Europeia voltará a ser assegurada pelo Partido Popular Europeu (PPE), sendo para o Conselho Europeu nomeado um membro da família socialista. Se esta configuração se verificar, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, já assumiu que se colocará ao lado dos que defendem a nomeação de António Costa. E prometeu “fazer tudo para que essa ‘candidatura’ seja um sucesso”, esperando agora que a família política socialista apresente o nome do português. “Se o Dr. António Costa for candidato, a nossa decisão está tomada”, anunciou Luís Montenegro a poucos dias da cimeira, desfazendo a ambiguidade com que pautou os seus comentários sobre o tema nas semanas que precederam as eleições europeias.

Este domingo, em entrevista ao jornal El Español, o social-democrata e antigo primeiro-ministro português Durão Barroso, que liderou a Comissão Europeia entre 2004 e 2014, considerou natural que os Socialistas & Democratas (S&D) assumam a liderança do Conselho Europeu, ficando o PPE com a presidência da Comissão. “E aqui Costa é o melhor posicionado. Porque tem muita experiência, é o mais conceituado no seu partido e gera consensos. Penso que é normal que seja o próximo presidente do Conselho Europeu”, defendeu.

Já Costa afirmou ainda na noite eleitoral que “nunca aceitaria ser presidente do Conselho Europeu sem o apoio do governo do país”, acrescentando, no entanto, que seria importante “ter um português nas instituições internacionais”.

A decisão cabe agora ao Partido Socialista Europeu, que tem ainda entre os nomes mais bem classificados para um cargo de topo em Bruxelas a primeira-ministra dinamarquesa, Mette Frederiksen. A sua nomeação daria a possibilidade de, pela primeira vez, as quatro presidências serem desempenhadas por mulheres, com Ursula von der Leyen na Comissão Europeia, a atual primeira-ministra da Estónia, Kaja Kallas, como alta representante e Roberta Metsola no Parlamento Europeu.

Porém, dentro da família socialista o nome de António Costa tem vindo a sobressair como um político com “capacidade de diálogo”, destacando-se pelo seu compromisso com uma Europa mais social e inclusiva. E, por essa razão, “reúne todas as qualidades”, como admitiu em abril Pedro Sánchez.

Mencionando o nome do português, o secretário-geral do Partido dos Socialistas Europeus defendeu, na semana passada, à margem de um evento público, que lhe parece “evidente” que, “sendo a segunda força” mais votada, espera “que a posição de presidente do Conselho Europeu possa definitivamente ser ocupada por um dos nossos”.

Fora da sua família política, o atual presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, chegou a tecer elogios a António Costa, considerando-o “respeitadíssimo e muito conceituado no plano europeu” e um “fazedor de pontes”, com “iniciativa” e “soluções”. Mas na semana passada circularam notícias de que o liberal belga estaria a fazer campanha para afastar Costa e Von der Leyen dos cargos máximos institucionais.

Se o plano funcionasse, a presidência da Comissão seria atribuída ao primeiro-ministro grego, Kyriakos Mitsotakis, e a do Conselho Europeu à primeira-ministra dinamarquesa. O plano seria do agrado do presidente de França, Emmanuel Macron. Contudo, o tombo da família liberal nas eleições para o Parlamento Europeu enfraquece politicamente o peso desta família nas negociações.

Por outro lado, ao longo de mais de meia década António Costa e Emmanuel Macron construíram “uma excelente relação”, segundo o próprio ex-primeiro-ministro. Fontes diplomáticas afirmaram ao site Politico que Emmanuel Macron “aprecia” o português, com o qual “gosta de participar em discussões intelectuais”.

Fragilizado internamente, depois da vitória do partido da sua opositora de extrema-direita, Marine Le Pen, nas eleições europeias, não se espera que Macron apareça com soluções alternativas para um “puzzle que está arrumado”, comentou uma fonte com o DN.

Porém, João Cotrim de Figueiredo, recentemente eleito eurodeputado, espera que a sua família liberal rejeite António Costa, considerando que no caso do apoio do governo português se trata de “privilegiar a nacionalidade” em detrimento “da utilidade”. Uma opção que entende ser “paroquial” e “não serve o projeto europeu”.

Mas nesta fase Costa é o mais bem posicionado, preenchendo as preferências de figuras-chave decisivas dentro do Conselho Europeu. A sua maior fragilidade continua a ser o facto de o seu nome ter sido incluído nas investigações da chamada Operação Influencer. Porém, na imprensa europeia é cada vez mais descartado o impacto da investigação na nomeação do ex-primeiro-ministro, principalmente devido a um conjunto de “erros embaraçosos” que têm “prejudicado a credibilidade” do processo, refere o Politico.

Se a decisão não ficar fechada já esta noite, haverá uma nova tentativa na próxima cimeira, agendada para 27 e 28 de junho. No Parlamento Europeu há um “apetite” para ter um acordo antes da reunião plenária de julho, para que aí possa ser realizada a eleição do presidente da Comissão Europeia, uma vez que a sessão de setembro ocorre apenas na terceira semana, sendo considerado “já um pouco tarde”, comentou uma fonte do Parlamento. A data será marcada em conferência de presidentes dos grupos políticos, mas está dependente das negociações para os outros cargos institucionais. Assim, ao contrário dos habituais impasses que caracterizam as mudanças de ciclo político em Bruxelas, desta vez não se esperam discussões prolongadas. Há até uma certa urgência em “fechar o dossiê” das nomeações dos cargos de topo antes da pausa institucional em agosto, apurou o DN.

Von der Leyen negoceia apoios enquanto espera por decisão dos 27

Ursula von der Leyen é a spitzenkandidat (cabeça de lista) do Partido Popular Europeu, que foi a família política mais votada nas eleições europeias de 2024, com 190 lugares no Parlamento Europeu. Porém, é um número insuficiente para fazer uma maioria. A família que reune os partidos de centro direita na União Europeia precisa, por isso, de reunir outros apoios. Só assim conseguirá a eleição de Von der Leyen no Parlamento Europeu para novo mandato à frente da Comissão Europeia. Ainda na noite eleitoral, a fazer contas ao número de lugares, perante a ascensão da extrema direita, Ursula von der Leyen apelou ao apoio de “uma maioria do centro a favor de uma Europa forte”, pois “isso é crucial para a estabilidade”.

A candidata ao segundo mandato à frente do executivo comunitário procurava somar o apoio dos 136 eurodepudatos eleitos para o grupo dos Socialistas & Democratas (S&D) e dos 80 parlamentares dos liberais (Renew) que, tendo caído em número de lugares, podem, ainda assim, ser decisivos para “segurar o centro”. Ao todo contabilizam quase 400 lugares e Von der Leyen conta com todos, apesar das diferenças. “Podemos divergir em pontos individuais, mas todos temos interesse na estabilidade e todos queremos uma Europa forte e eficaz”, disse, prometendo encetar de imediato uma ronda de conversas com “a plataforma, ou seja, com o S&D e Renew”, com os quais trabalhou “nos últimos cinco anos”, podendo agora continuar “uma relação construtiva e comprovada”.

Mas Ursula von der Leyen admitiu que não fecha portas a outros apoios, num Parlamento em que “os extremos à esquerda e à direita ganharam” força. Como contrapartida, impõe que respeitem determinados aspectos, nomeadamente, terem uma visão pró-europeia, estarem comprometidos com a defesa do Estado de Direito e serem a favor do apoio à Ucrânia.

Na ala da direita eurocéptica, no grupo ECR, a eurodeputada da direita nacionalista belga Assita Kanko admite continuar a trabalhar “muito bem, também com Von der Leyen”, segundo o exemplo do ciclo dos “cinco anos” anteriores, “dependendo do programa”.

É no ECR que deverão sentar-se, na próxima legislatura, os 11 deputados do Fidesz, o partido do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, que em fevereiro manifestou interesse em se aproximar desta família política (da qual faz parte o Fratelli d’Italia, partido da primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni), depois da expulsão do PPE por violações ao Estado de Direito na Hungria.

No entanto, “a responsabilidade” recai “sobre os partidos do centro”, considerou Von der Leyen, ciente que juntos ultrapassam largamente a maioria parlamentar. No entanto, os 27 terão primeiro de entender-se quanto ao nome a propor. Pelo menos 15 países, representativos de mais de 65% da população, terão de estar a favor. E apenas 13 dos 27 líderes integram a mesma família política de Von der Leyen. Por essa razão, no Conselho Europeu também terá de haver negociação. 

Outros nomes na ‘guerra dos tronos’ de Bruxelas

Viktor Orbán: É nome controverso no Conselho Europeu,pois frequentemente diverge do grupo. Mas um impasse prolongado coloca o primeiro-ministro da Hungria em destaque nas discussões de cargos de topo quando assumir a presidência semestral da UE. Se o atual presidente do Conselho Europeu tivesse concorrido ao Parlamento Europeu, a partir de julho Orbán lideraria interinamente a instituição.

Alexander De Croo: O primeiro-ministro belga ainda não foi considerado para a liderança do Conselho Europeu, mas algumas coincidências colocam-no numa posição vantajosa. Demitiu-se após a derrota eleitoral interna, mas ainda está presente na sala. Também é uma vantagem ser o presidente de turno. Porém, é improvável ter novamente um liberal belga no Conselho Europeu.

Kaja Kallas: A primeira-ministra da Estónia tem defendido uma União Europeia mais assertiva contra a Rússia. É respeitada no cenário político europeu. O equilíbrio regional dos top jobs é um argumento a seu favor. Mas esta liberal tem sido apontada para o cargo de chefe da diplomacia.

Mette Frederiksen: Primeira-ministra da Dinamarca desde junho de 2019, é a líder feminina com mais tempo no cargo na UE. É vista como alguém que compreende a gravidade da agressão russa à Ucrânia. É elogiada por defender políticas de transição energética e crescimento sustentável. Mas a postura rígida sobre imigração afasta-a da sua família socialista e enfraquece o seu currículo.

Mario Draghi: Ex-presidente do Banco Central Europeu e ex-primeiro-ministro de Itália, é um dos mais experientes a nível europeu. Credível e com provas dadas durante a crise da dívida soberana, é considerado por alguns um bom sucessor de Von der Leyen. O seu nome também é mencionado para o Conselho Europeu.

Sanna Marin: A ex-primeira-ministra da Finlândia pertence à ala progressista. E isso é tido como vantagem. Tudo aponta que o próximo presidente será nomeado pelos socialistas. Marin tem experiência de governar em permanente negociação com coligações, aspeto crucial na política europeia. É vista como jovem, dinâmica e decidida, em especial depois de trazer a Finlândia para a NATO.

Pedro Sánchez: O atual primeiro-ministro de Espanha é influente no Partido Socialista Europeu. Foi nomeado, juntamente com Olaf Scholz, para negociar a presidência do Conselho Europeu pelos socialistas. A instabilidade política em Espanha, se saísse do governo, torna a sua nomeação improvável. Mas nos bastidores do Conselho Europeu especula-se que possa destacar atributos que se alinhem com o seu próprio perfil durante a negociação para António Costa.

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