Costa recebeu de Michel o sino com o qual o presidente do Conselho Europeu impõe a ordem nas cimeiras dos 27.
Costa recebeu de Michel o sino com o qual o presidente do Conselho Europeu impõe a ordem nas cimeiras dos 27.FOTO: Dario Pignatelli/Comissão Europeia

António Costa afirma que a sua missão é ter uma Europa unida na sua diversidade

Português pediu esforço para a UE ser autónoma em termos de segurança e ação coletiva para a prosperidade económica. Sobre a Ucrânia, garantiu que a paz tem de ser justa.
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Daqui a menos de um mês, a 19 de dezembro, António Costa terá o seu primeiro teste como presidente do Conselho Europeu, altura em que se estreará a dirigir uma reunião com os chefes de Estado e de governo do bloco. Um cenário que está longe de ser estranho ao socialista - durante oito anos participou nestes encontros como primeiro-ministro de Portugal e os líderes que não conhece dessa altura teve oportunidade de ficar a conhecer no périplo que fez nos últimos meses por 25 capitais europeias (as únicas exceções foram a Roménia e a Bulgária por se encontrarem em períodos eleitorais). 

Costa chega a Bruxelas com a fama de ser um político carismático, com sentido de humor e que consegue criar consensos, mesmo em ambientes difíceis, mantendo boas relações com todos os que se sentavam ao seu lado na mesa do Conselho Europeu, incluindo o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán. 

Características que irão ajudar o português nos desafios que o esperam numa Europa cada vez mais polarizada - e com as suas duas maiores potências, França e Alemanha, a viverem crises políticas - e que terá de chegar a uma posição comum em temas tão diversos como a defesa europeia e o apoio à Ucrânia, a latente guerra comercial com China e Estados Unidos, a resposta às consequências da presidência de Donald Trump e o orçamento europeu dos próximos cinco anos. “Tendo conversado com líderes europeus quando os visitei nas últimas semanas, sinto-me confiante. Pelo seu sentido de urgência e, sobretudo, pelo seu foco geral na ação coletiva inspirada pela criatividade e guiada pelo pragmatismo”, declarou António Costa.

O seu mandato como presidente do Conselho Europeu começa oficialmente amanhã, mas António Costa aproveitou a cerimónia de passagem de testemunho do seu antecessor, o belga Charles Michel, para dar a saber que Europa pretende durante os seus dois anos e meio de mandato. “A unidade da Europa na diversidade é notável. E enraizados na força da nossa vontade comum e inabalável”, referiu Costa, o primeiro português, o primeiro socialista a assumir este cargo. “Como presidente do Conselho Europeu, assumirei como missão diária construir esta unidade e valorizar a nossa diversidade natural.”

E usou como exemplo dessa diversidade a sua experiência política em Portugal, como presidente da Câmara de Lisboa e primeiro-ministro, tendo chegado agora ao Conselho Europeu. “Lisboa é a minha cidade. Portugal é o meu país. E a Europa é a nossa casa comum. Não há contradição entre estes três níveis”.

“Só juntos poderemos defender a segurança, a estabilidade e a paz no nosso continente. Só juntos poderemos alcançar a prosperidade partilhada, o crescimento económico e a transição climática. Só juntos poderemos fazer ouvir a voz da Europa na cena internacional. Portanto, a unidade é a força vital da União Europeia”, sublinhou o português no seu discurso na cerimónia de passagem de testemunho, mas deixando bem claro que “não devemos ignorar as nossas diferenças de opinião, nem tratá-las como um problema”. “Temos 27 histórias e culturas diferentes e olhamos o mundo a partir de diferentes localizações geográficas. Essa diversidade é perfeitamente natural. Isso enriquece-nos. E podemos, de facto, aproveitá-la. É a força da Europa”. 

Com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, a assistir à cerimónia, Costa defendeu que “preservar e reforçar o legado da União Europeia é um trabalho de equipa”, sendo que, apesar de representarem instituições diferentes, esta é “uma única União Europeia”. Algo que os líderes europeus esperam que se concretize, tendo em conta a boa relação entre Costa e von der Leyen, e que será uma mudança de tom depois de cinco anos em que a alemã e Charles Michel estiveram de costas voltadas.

A guerra na Ucrânia também não foi esquecida pelo português, que considerou que a paz naquele país “não pode ser a dos cemitérios”, apelando a um esforço para autonomizar a União Europeia em matéria de defesa e segurança. “A paz não pode ser a paz dos cemitérios, a paz não pode ser capitulação. A paz não pode recompensar o agressor, a paz na Ucrânia tem de ser justa”, sublinhou Costa, pedindo que é necessário “escrever um novo capítulo da UE enquanto projeto de paz”.  “Tornando-nos mais fortes, mais eficientes, mais resilientes e, sim, mais autónomos em matéria de segurança e defesa. Assumindo um ónus maior no que toca à nossa preparação militar. Reforçando simultaneamente os pilares da nossa parceria transatlântica”, completou. 

Para Costa há também uma “urgência geopolítica” em cumprir o alargamento da União Europeia, lembrando que este “reforçará indubitavelmente” o bloco, mas pedindo que seja concretizado “sem prazos artificiais” e “obstáculos indevidos”. “O alargamento é um poderoso instrumento de paz, de segurança e de prosperidade. Usemos, portanto esse instrumento! Tanto a UE como os países candidatos têm de trabalhar mais e mais depressa. Sem prazos artificiais, mas também sem obstáculos indevidos”, completou o presidente eleito do Conselho Europeu.

No entanto, “a paz, segurança e a resiliência” não são apenas questões do bloco comunitário e a UE tem de olhar para todo o planeta, excluindo conceitos que para o português estão desatualizados. “Vivemos num mundo multipolar, com sete continentes diferentes e 192 países. Temos de os implicar, tecendo em conjunto uma rede mundial. Ao fazê-lo, devemos pôr de lado conceitos como o ‘sul global’ ou o ‘norte global’. A ação externa da UE tem de reconhecer que tanto o sul como o norte são, na realidade, plurais”, defendeu.

Costa aproveitou ainda a ocasião para agradecer a Charles Michel pelos seus “esforços incansáveis e o profundo empenho em prol da Europa” nos seus cinco anos de mandato, lembrando que a presidência do belga foi marcada por “momentos cruciais em que nos reuniste para fazermos frente a desafios que muitos consideravam insuperáveis: uma pandemia, o choque económico que se seguiu, a agressão militar da Rússia”.

Logo no início da cerimónia, Charles Michel elogiou o seu sucessor, dizendo que António Costa, tem “a sensibilidade e a experiência” necessárias para desempenhar um cargo que “obriga a muitos esforços e sacrifícios”.

O Conselho Europeu é o guardião da unidade europeia, explicou ainda Michel, indicando que a prioridade atual é “tornar a UE mais independente e dona do seu destino”. “Sentámo-nos durante muitos anos como colegas e amigos no Conselho Europeu”, recordou o belga, afirmando estar “otimista com o futuro da UE, apesar de todos os desafios e dificuldades”.

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