António Costa: Não está no "horizonte da Rússia" a disponibilidade "para negociar a paz"
O presidente do Conselho Europeu defende que o bloco comunitário deve continuar a pressionar o Kremlin com mais sanções pois “não há no horizonte” disponibilidade da Rússia para negociar um cessar-fogo com vista à paz na Ucrânia.
“A Rússia recusou o cessar-fogo, a Rússia recusou participar em alto nível nos esforços de negociação e a Rússia tem, aliás, intensificado os ataques à Ucrânia e, portanto, isso significa que não parece que esteja no horizonte da Rússia a predisposição para negociar a paz”, diz António Costa, em entrevista à agência Lusa em Bruxelas.
Quando assinala seis meses no cargo de líder da instituição que junta os chefes de Governo e de Estado da UE, o antigo primeiro-ministro português salienta: “O ideal era a guerra não ter começado, o segundo ideal era a guerra acabar no próximo segundo, [mas] a realidade é que, apesar do apoio que todos temos dado aos esforços do presidente [norte-americano, Donald] Trump para procurar um acordo de paz, esses esforços não têm tido a menor correspondência do lado da Rússia.”
18.º pacote de sanções. UE deve “não só continuar a apoiar a Ucrânia", como "aumentar a pressão sobre a Rússia”
Numa altura em que a UE está prestes a aprovar o seu 18.º pacote de sanções à Rússia pela guerra da Ucrânia, António Costa defende que o bloco comunitário deve “não só continuar a apoiar a Ucrânia, como […] aumentar a pressão sobre a Rússia”.
Este novo pacote de medidas restritivas – que vai incluir novas listagens de entidades e indivíduos abrangidos pelas sancoes, reforço do combate à frota fantasma do petróleo russo e alargamento das limitações ao sistema bancário russo – está, de acordo com o presidente do Conselho Europeu, a ser ultimado e será coordenado “com os Estados Unidos, com o Canadá e com os outros parceiros internacionais”.
“Esta tem de ser uma pressão global para poder ter eficácia”, considera.
Apesar de a guerra persistir, António Costa vinca que as sanções europeias estão a funcionar dada a “situação de grande debilidade” da economia russa.
Esta entrevista à Lusa ocorre quando se tentam conversações de paz com mediação norte-americana e nas quais a UE entende que a Ucrânia deve estar na posição mais forte possível antes, durante e depois das negociações para pôr termo à guerra.
A Ucrânia detém também, desde 2022, o estatuto de país candidato à UE e, para António Costa, “é impressionante” como, “no meio de uma guerra, tem medo de conseguir realizar o conjunto de reformas que são essenciais” para tal adesão.
No passado dia 1 de dezembro de 2024, António Costa começou o seu mandato de dois anos e meio à frente do Conselho Europeu, sendo o primeiro socialista e português neste cargo.
Passou esse primeiro dia em funções em Kiev para garantir apoio europeu à Ucrânia.
Desde o início da invasão russa da Ucrânia, em 24 de fevereiro de 2022, a UE concedeu 138,2 mil milhões de euros à Ucrânia e, em termos de ajuda financeira, o bloco europeu contribuirá com 30,6 mil milhões de euros para Kiev em 2025.
A UE também tem avançado com pesadas sanções contra a Rússia, nomeadamente económicas ou diplomáticas visando milhares de pessoas e entidades, com a proibição de viajar para a UE, o congelamento de bens e a indisponibilidade de acesso a fundos que provenham do espaço comunitário.
Avançou também para o congelamento de bens, num total de 24,9 mil milhões de euros de bens privados congelados no espaço comunitário e de 210 mil milhões de euros de bens do Banco Central da Rússia bloqueados.
Ao nível comercial, as medidas restritivas europeias visam 48 mil milhões de euros em exportações proibidas para a Rússia e 91,2 mil milhões de euros em importações proibidas provenientes da Rússia.
A Ucrânia tem também contado com ajuda financeira e em armamento dos aliados ocidentais.
Os aliados de Kiev têm decretado sanções contra setores-chave da economia russa para tentar diminuir a capacidade de Moscovo de financiar o esforço de guerra na Ucrânia.
UE tem "panóplia de decisões" a tomar sobre relação com Israel
O presidente do Conselho Europeu, António Costa, garante que a UE tem “uma panóplia” de decisões com “consequências concretas” que pode tomar sobre a relação com Israel devido à violação dos diretos humanos em Gaza.
“Pela primeira vez temos uma panóplia de decisões a tomar com consequências concretas no nosso relacionamento com Israel e fruto não da vontade de termos um conflito com Israel, mas da constatação daquilo que é a realidade que ninguém pode deixar de ver”, diz António Costa.
Quando assinala seis meses no cargo de líder da instituição que junta os chefes de Governo e de Estado da UE, o antigo primeiro-ministro português destaca que, “pela primeira vez, há um relatório oficial da União Europeia constatando a violação dos direitos humanos em Gaza e o Conselho Europeu mandatou o Conselho [da UE] para tirar as conclusões adequadas desses factos em relação ao acordo de associação com Israel”.
“Agora, se vamos aplicar sanções aos ministros, se vamos aplicar sanções a Israel, se vamos suspender o acordo, se vamos simplesmente convocar o conselho de associação [UE-Israel]… Eu não me vou antecipar àquilo que é o debate próprio que os ministros dos Negócios Estrangeiros vão fazer”, enumera.
António Costa tem sido um dos líderes da UE mais vocais a condenar a situação humanitária em Gaza e, na quinta-feira, levou o tema à reunião do Conselho Europeu, a terceira ordinária por si presidida após ter iniciado funções em 1 de dezembro passado.
Na ocasião, António Costa afirmou que a UE "não deve ficar impávida" sobre a situação humanitária em Gaza, face à ofensiva israelita, defendendo diálogo com "o amigo" Israel para cessar-fogo.
Nas conclusões aprovadas na cimeira europeia, os chefes de Governo e de Estado da UE "deploraram a terrível situação humanitária" na Faixa de Gaza, perpetrada por Israel, considerando "inaceitável o número de vítimas civis e os níveis de fome" com o bloqueio à entrada de camiões no enclave palestiniano, segundo as conclusões escritas aprovadas.
No texto, o Conselho Europeu disse também tomar "nota do relatório sobre o cumprimento do Artigo 2.º do acordo de associação entre Israel e a UE", que dá conta de violações dos direitos humanos por parte de Telavive, e anunciou que em julho vai começar a discutir como proceder.
Na entrevista à Lusa, António Costa admite que “cada um destes 27 Estados-membros tem, relativamente a si próprio e relativamente ao mundo, uma história e uma tradição bastante diversas”, com países como Alemanha, República Checa e Áustria a terem fortes laços com Israel.
“Infelizmente, a trágica realidade humanitária que Israel causou em Gaza […] obviamente levou a que ninguém hoje em dia se possa opor a sinalizar que a situação humanitária em Gaza é verdadeiramente dramática e que é urgente o cessar-fogo de Israel em Gaza, é urgente terminar com os colonatos ilegais na Cisjordânia, é urgente permitir a assistência humanitária e é urgente salvar a população de Gaza”, vinca.
A posição surge numa altura em que se registam mais de 56 mil mortos e mais de 127 mil feridos desde o início da guerra entre Israel e o grupo islamita Hamas em outubro de 2023.
É também estimado que cerca de 470 mil pessoas estejam em risco de fome severa, com dezenas de civis mortos enquanto esperavam ajuda humanitária nas últimas semanas.