O chefe da diplomacia francesa, Jean-Noël Barrot, defendeu esta segunda-feira, 28 de julho, que “não há alternativa” à solução de dois Estados, apelando a “medidas concretas para preservar a perspetiva de um Estado palestiniano”. O apelo foi feito no início de uma conferência sobre o tema, organizada em conjunto pela França e pela Arábia Saudita nas Nações Unidas. “Estamos num ponto de rutura. A solução de dois Estados está mais distante do que nunca”, avisou contudo o secretário-geral da ONU, António Guterres. A conferência, que decorre até esta quarta-feira (30 de julho), visa criar uma dinâmica para o reconhecimento do Estado palestiniano - e França já anunciou que o fará em setembro, durante a Assembleia Geral da ONU - mas também fórmulas para reformar a Autoridade Palestiniana, desarmar o Hamas e excluí-lo da governação e, finalmente, normalizar as relações com Israel por parte dos Estados árabes que ainda não o fizeram.“Sabemos que o conflito israelo-palestiniano perdura há gerações”, disse Guterres. “Mas também sabemos que a sua persistência não é inevitável. Pode ser resolvida. Isto exige vontade política e uma liderança corajosa. E exige verdade”, acrescentou, dizendo que essa verdade é que a solução dos dois Estados está mais distante do que nunca sendo ameaçada pela “anexação progressiva” da Cisjordânia e a situação em Gaza. “As ações unilaterais que minariam para sempre a solução de dois Estados são inaceitáveis e devem cessar”, avisou.O secretário-geral voltou a condenar o ataque do Hamas de 7 de outubro de 2023, que fez cerca de 1200 mortos em Israel e permitiu ao grupo terrorista fazer 240 reféns (50 ainda estão na Faixa de Gaza, menos de metade deles com vida). Mas lembrou também que “nada pode justificar a obliteração de Gaza”, criticando a situação de fome e o número de mortos (a chegar aos 60 mil segundo os dados do Hamas). O secretário-geral da ONU pediu para que a conferência não seja mais um “exercício de retórica”, defendendo que “pode e deve servir como um ponto de viragem decisivo” que “catalise o progresso irreversível no sentido do fim da ocupação e da concretização da nossa aspiração partilhada por uma solução viável de dois Estados”.Em 1947, com o fim do mandato britânico sobre a Palestina, o plano das Nações Unidas previa a divisão do território em dois Estados: um judeu e um árabe. Israel aceitou o plano, mas após a declaração da independência, em 1948, os países árabes declararam guerra contra os israelitas e o plano nunca foi implementado. Após o armistício, no ano seguinte, o Egito passou a controlar a Faixa de Gaza, enquanto a Jordânia assumiu o controlo da Cisjordânia e de Jerusalém Oriental. Israel assumiria o controlo desses territórios na guerra de 1967.O Estado palestiniano foi formalmente declarado pela Organização de Libertação da Palestina em novembro de 1988, reclamando a soberania sobre a Cisjordânia, Jerusalém Oriental e Faixa de Gaza. No final desse ano, 78 países já reconheciam o novo Estado. Em 1993 e 1995, após negociações, israelitas e palestinianos assinaram os Acordos de Oslo, que criaram a Autoridade Palestiniana para assumir a gestão dos territórios. Mas a ideia de avançar para dois Estados, nas fronteiras prévias a 1967, caiu por terra após o assassinato do primeiro-ministro israelita Yitzhak Rabin e a entrada em cena de Benjamin Netanyahu (que sempre se opôs). Israel acabaria por retirar da Faixa de Gaza em 2005, com o Hamas a assumir o controlo em 2007. Na Cisjordânia ocupada, o Governo israelita tem empreendido uma política de criação de colonatos que tornam cada vez mais difícil a solução de dois Estados, tendo ainda na semana passada o Knesset aprovado de forma simbólica a anexação. Alimentos a chegarO presidente norte-americano, Donald Trump, admitiu esta segunda-feira (28 de julho) a existência de fome extrema na Faixa de Gaza, dizendo não concordar com a leitura do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, de que esta não existe. “Acho que Israel podia fazer mais”, indicou , considerando que o país tem “muita responsabilidade” pela situação atual. Trump, que recebeu no seu resort na Escócia o primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, falou depois de um novo plano para criar novos centros de distribuição de alimentos no enclave palestiniano. Sem dar muitos pormenores, disse que estes não teriam vedações - ao contrário dos polémicos da Fundação Humanitária de Gaza (financiada pelos EUA) - e que os norte-americanos vão trabalhar em conjunto com os aliados como a União Europeia ou o Reino Unido. As autoridades de Gaza, controladas pelo Hamas, indicaram esta segunda-feira que pelo menos 14 pessoas tinham morrido de fome e desnutrição em 24 horas. Desde o início da guerra, são já 147 (a maioria nas últimas semanas), incluindo 88 crianças. Israel anunciou no domingo que os militares iriam interromper as operações na cidade de Gaza, em Deir al-Balah e Al-Mawasi durante 10 horas por dia até novo aviso para permitir um melhor fluxo de ajuda e designar rotas seguras. Dezenas de camiões já entraram desde o Egito, com 1500 toneladas de ajuda. Entretanto, dois aviões da Jordânia e dos Emirados Árabes Unidos lançaram 17 toneladas de ajuda humanitária - Alemanha e Espanha também disseram que vão enviar os seus aviões. Apesar de toda a ajuda ser bem-vinda, o alto comissário das Nações Unidas para os Refugiados, Philippe Lazzarini, avisa que este método é “caro, ineficaz e até pode causar a morte de civis esfomeados”. As 17 toneladas de ajuda equivalem a menos de um camião, sendo que se calcula que sejam precisos 600 por dia para suprir as necessidades dos palestinianos. Duas organizações de direitos humanos israelitas - a B’Tselem e a Médicos para os Direitos Humanos - concluíram pela primeira vez que as ações de Israel na Faixa de Gaza são genocídio ao abrigo da lei internacional. O relatório da B’Tselem, por exemplo, diz que a combinação da realidade em Gaza e as declarações de altos funcionários israelitas levam à “conclusão inequívoca de que Israel está a tomar medidas coordenadas para destruir intencionalmente a sociedade palestiniana na Faixa de Gaza” e “a cometer genocídio contra os palestinianos”. .Primeiro-ministro palestiniano diz que Hamas deve render-se em Gaza e entregar armas.França deverá ser o 148.º país a reconhecer o Estado palestiniano. Quem será a seguir?