Denis Mukwege falou no Parlamento Europeu sobre como, na República Democrática do Congo (RDC), mas também em muitos outros locais, "o corpo da mulher é transformado num verdadeiro campo de batalha".O médico congolês tratou desde 1999 mais de 40 mil mulheres que foram vítimas de violações.
"Em cada mulher violada vejo a minha mulher, em cada mãe violada vejo a minha mãe. Em cada criança violada vejo os meus próprios filhos. Como posso calar a minha voz", perguntou, numa cerimónia emotiva, o galardoado com o Prémio Sakharov de Liberdade do Pensamento.
"Como é que conseguimos dormir tranquilos quando nos entregam um bebé de seis meses com a vagina destruída pela penetração brutal de um adulto, por objetos ou produtos químicos", voltou a perguntar.
"Gostaria de não ter de falar mais destes crimes horrorosos de que são vítimas as minhas contemporâneas. Mas como posso calar a minha voz quando sabemos que estes crimes contra a humanidade são planeados por razões económicas", questionou.
A RDC é "um dos países mais ricos do planeta. Contudo, a maioria dos seus habitantes vive numa pobreza extrema", referiu o médico. Na RD Congo encontram-se cerca de 80% das reservas mundiais de tântalo, um mineral raro usado no fabrico de componentes de telemóvel. A sua exploração serve para alimentar o conflito.
"As atrocidades surgem como algo de banal" e "o povo congolês tem sede de justiça", defendeu, apelando a revitalizar o acordo de paz de Adis Abeba, assinado em 2013 entre o governo da República Democrática do Congo e o grupo rebelde M23. "Não haverá paz e desenvolvimento social e económico sem respeito pelos direitos humanos", referiu.
"Com este prémio, o Parlamento Europeu resolveu dar maior visibilidade à mulher congolesa. Reconheceu o seu sofrimento, mas também a coragem que encarnam", afirmou Mukwele. "Este prémio não terá contudo qualquer significado para as vítimas de violência sexual se vocês não se juntarem a nós na nossa procura por paz, justiça e democracia", disse aos eurodeputados, apelando ao fim da violação como "arma de guerra".
No final, nas tribunas, os congoleses que assistiram à cerimónia despediram-se do médico com um cântico "Deus escolheu-te. Trabalha por ele com o teu coração, o teu espírito."